segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Nova direita: uma ameaça invisível mas real


Guy Franco


Foto de aqruivo do Estadão Contreúdo mostra protesto em SPFoto de aqruivo do Estadão Contreúdo mostra protesto em SP
 
 
Dia desses me aconteceu uma coisa muito curiosa. Estava numa festa com amigos, quando um rapaz me abordou com aquela lentidão maravilhosa só conseguida por sujeitos que beberam demais. Ele era jovem, ruivo, bonito, um pouco acima do peso e com pequenas gotas de suor no nariz. Durante alguns minutos, conversamos sobre tudo o que nos vinha à cabeça, de temas que iam de futebol à Operação Lava-Jato; de cinema coreano à ata do Copom. 


Numa atmosfera homossexual, me vi obrigado a ouvir Grimes, a dançar Miley Cirus, a cantar Spice Girls, e a me meter nas conversas mais enfadonhas que se possam imaginar envolvendo séries de vampiros das quais nunca tinha ouvido falar.

Mais tarde, ele me convidou para ir à casa dele. Interpretei o convite como interesse do rapaz em mim. Topei na hora.


No apartamento dele, vi retratos de seus pais na mesinha de centro - era um rapaz de família, afinal. E a julgar pelas lombadas dos livros na estante, seus interesses eram um tanto polêmicos, pois iam de economia e Hayek a Roger Scruton e Michael Oakeshott. Havia muitos livros com cara de antigos como esses, em sobrecapas empoeiradas, espalhados pelo apartamento.


Não havia dúvidas: eu estava saindo com um membro da nova direita.


De todos os meus medos, o maior deles é sem dúvida o da nova direita. Desde pequeno que ouço falar da nova direita e tenho pesadelos horríveis em que sou vítima das maldades da nova direita, acordando no meio da madrugada encharcado em suor.


Evito andar em bairros perigosos, principalmente à noite, com receio de ser abordado por potenciais membros da nova direita. Enfim, é um medo que me acompanha há muitos anos e com o qual tenho de aprender a conviver.


Não tenho orgulho de me sentir assim.


Quando entro num ambiente qualquer eu sei que alguém ali é um potencial membro da nova direita. Qualquer fila de banco que eu vá, qualquer laboratório de diagnóstico em que eu enteja, sei que alguém ali é um potencial membro da nova direita e que poderia me citar frases de Nelson Rodrigues ou que não votou no PT na última eleição.


São pessoas que estão entre a gente. São ameaças reais, mas na maioria das vezes invisíveis. Gente em pé, no ponto de ônibus, ouvindo podcast de economia. Gente que senta do seu lado no metrô e que você mal percebe que - imagine só - é a favor da imprensa livre. Gente indignada com o roubo de 10 bilhões da Petrobras, etc.



Não é fácil viver quando você sabe que a qualquer momento pode trombar com um membro da nova direita, e que você vai ter de encontrar um jeito de conviver com ele. Pior é que às vezes não dá para ver pelas caras quem são; às vezes é preciso ir até o apartamento da pessoa, olhar para a estante dela e, se souber quem são os autores que estão ali, descobrir que está saindo com um membro da nova direita. Do contrário, às vezes nem se percebe.

Nenhum comentário: