Há três semanas, ao raiar do Juízo Final – a sétima fase da Operação
Lava Jato, que levou à cadeia executivos das principais empreiteiras do
país –, uma equipe da Polícia Federal dirigiu-se a Santana de Parnaíba,
município de São Paulo. Estavam atrás do engenheiro mecânico Cristiano
Kok, de 49 anos, diretor da Engevix. A missão dos agentes era levá-lo à
superintendência da Polícia Federal (PF), onde ele deveria ser
interrogado sobre as suspeitas de corrupção que pesam contra a empresa.
Havia um mandado para que, no jargão jurídico, os policiais o
submetessem a "condução coercitiva". Acompanhado de uma advogada, Kok
reivindicou seu direito de permanecer calado.
Enquanto Kok se negava a detalhar o que sabia, outra equipe da PF
vasculhava a sala dele e de outros diretores da Engevix, na sede da
empresa, em Barueri, na região metropolitana de São Paulo. Começava ali o
Juízo Final na corrupção brasileira, de acordo com os investigadores.
Na sala de Kok, dizem eles, houve a mais proveitosa de todas as buscas
feitas pela PF naquele dia. Ali foram encontradas planilhas e anotações
que, segundo os investigadores, corroboram fortemente a acusação de que
um cartel domina há anos os contratos na Petrobras.
A papelada confirma, em parte, o que o ex-diretor de Abastecimento
Paulo Roberto Costa, o doleiro Alberto Youssef e dois dirigentes da
empreiteira Toyo Setal revelaram em suas delações premiadas. Essas
provas serão decisivas para embasar as denúncias que deverão ser
apresentadas nesta semana pelo Ministério Público Federal (MPF) contra
os empreiteiros presos.
ÉPOCA teve acesso ao conjunto de documentos recolhidos nas dependências
da Engevix. Além de ratificar o que os delatores já disseram, os papéis
revelam detalhes inéditos sobre os bastidores do que, em algumas das
anotações, era chamado de “bingo” – e os investigadores chamam de
"cartel". Os nomes de 16 empreiteiras – os "jogadores" do tal bingo –
aparecem nas planilhas.Todas elas contêm colunas com os nomes de
participantes. Estão listadas algumas das principais obras da Petrobras,
como as refinarias de Abreu e Lima (Pernambuco), Presidente Getúlio
Vargas (Paraná), Duque de Caxias (Rio de Janeiro) ou Paulínia (São
Paulo).
Há indícios, de acordo com os investigadores, de jogo combinado
entre as empresas na distribuição dos contratos. O autor dos documentos –
não se sabe ainda se Kok ou outro diretor da Engevix – anotava as
prioridades de cada uma das empresas. Também registrava o apoio mútuo
entre elas, para que saíssem vitoriosas nas licitações de sua
preferência. A Engevix é alvo de dois inquéritos para apurar seu
envolvimento nas irregularidades. Um deles trata especificamente do
consórcio Rnest, liderado pela Engevix para prestar serviços à Petrobras
na obra da refinaria de Abreu e Lima.
A cronologia dos papéis apreendidos na Engevix oferece um roteiro para
entender como os jogadores do bingo combinavam aquilo que chavam de
"prêmios" – e os investigadores afirmam ser os contratos da Petrobras. O
primeiro documento é uma planilha de 24 de setembro de 2007.
Leva o título “Lista de Novos Negócios (Mapão)”. Trata-se de um documento que descreve as obras das Petrobras e os serviços previstos em cada uma delas. A maior parte das contratações é para serviços em refinarias, área comandada entre 2004 e 2012 por Paulo Roberto Costa. No rodapé da planilha, uma observação chamou a atenção dos investigadores: “QG, CC e CN se posicionaram na Renest em prol do restante”.
Leva o título “Lista de Novos Negócios (Mapão)”. Trata-se de um documento que descreve as obras das Petrobras e os serviços previstos em cada uma delas. A maior parte das contratações é para serviços em refinarias, área comandada entre 2004 e 2012 por Paulo Roberto Costa. No rodapé da planilha, uma observação chamou a atenção dos investigadores: “QG, CC e CN se posicionaram na Renest em prol do restante”.
Na avaliação dos
investigadores, a frase demonstra acertos futuros. As iniciais
representam, segundo os investigadores e dois lobistas do setor ouvidos
por ÉPOCA, as empresas Queiroz Galvão (cujas iniciais são QG), Camargo
Corrêa (de iniciais CC) e Odebrecht (ou Construtora Norberto Odebrecht,
de iniciais CNO, ou apenas CN, segundo os investigadores). Quatro dias
após montar o tal "mapão", o autor atualizou o documento. Chamou-o de
“Lista de Compromissos”. Ela foi novamente atualizada ao menos duas
vezes, em 14 de março e 29 de abril de 2008. As combinações que aparecem
no mapão espelham-se, na maiora das vezes, nos contratos fechados pela
Petrobras.
Ao
lado do "mapão" com as relações dos "prêmios", a PF apreendeu na
Engevix anotações específicas sobre as obras de Abreu e Lima e do
Comperj, as duas mais caras da Petrobras, e as duas contra as quais mais
pesam as evidências de propina. Também apreendeu atas das reuniões. O
autor das anotações chamou uma delas, datada de agosto de 2008, de
“Tentativa para a ‘Fluminense’”. Uma outra leva o nome “Proposta de
Fechamento do Bingo Fluminense”. "Bingo Fluminense" é, no entender da PF
e do MPF, um codinome para as obras do Comperj.
Segundo os documentos,
os "jogadores" do "bingo" se reuniram em São Paulo, em 14 de agosto de
2009. A ata registra: "Reunião do bingo". Nela, descrevem-se as
combinações dos contratos e as empreiteiras responsáveis por fazer a
"coordenação". Anotações dão detalhes das negociações. Numa delas,
registra-se, segundo os investigadores, que a sueca Skanska deveria
desistir de um dos acertos: "SK não ficou com nada, quer posição
futura".
CLIQUE AQUI e leia na Época mais esta reportagem de Diego Escosteguy e Marcelo Rocha.
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