A crise no Brasil é profunda, corroendo a sociedade desde baixo. O
lulopetismo acentuou essa degradação: nosso modelo social entrou em
parafuso, escreve o professor Ricardo Vélez Rodríguez em artigo
publicado hoje no Estadão:
O modelo de sociedade pautada por um Estado patrimonialista está em
crise. Mas não apenas pela ação dos políticos larápios e dos empresários
cooptados por eles. O nosso modelo social entrou em parafuso por falta
de sustentação axiológica. A crise vem de baixo, da grande massa das
famílias. Isso ficou evidente em pesquisa recente efetuada pela
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE),
segundo a qual o Brasil é campeão mundial em mau comportamento em sala
de aula, o que leva os professores a gastar 15% do seu tempo tentando
manter a disciplina.
Essa lamentável realidade levou a presidente da Federação Nacional
das Escolas Particulares (Fenep), Amábile Pacios, a contestar o lema do
governo federal, que, no voluntarismo que o caracteriza, tentou erguer o
bordão "Brasil, pátria educadora", ao mesmo tempo que a presidente
Dilma Rousseff tenta acobertar os corruptores do PT no caso do petrolão.
E ao mesmo tempo que o PT, na sua reunião para "comemorar" os 35 anos
de fundação, se solidarizou com os larápios petralhas, ignorando o
mal-estar que a sociedade brasileira vive ao ensejo da pior onda
corruptora do País, que conseguiu fazer naufragar a nossa maior empresa
estatal, a Petrobrás.
Para Amábile Pacios, o slogan "Brasil, pátria educadora" constitui
apenas mais um jingle político bolado por marqueteiros. "Eu percebo",
frisou a presidente da Fenep, "que esse desrespeito vem muito do modelo
de sociedade que a gente está tendo e pelo modelo de família, e diz
respeito à falta de valores que a gente está impondo à sociedade". A
mesma opinião foi externada pelo presidente do Sindicato dos
Profissionais em Educação no Ensino Municipal de São Paulo, que
representa 1.400 escolas.
Ora, a crise vivida pelo ensino nos seus níveis primário e secundário
se estende também às universidades e faculdades. Antigas ilhas de
excelência, como a Universidade de São Paulo (USP), têm assistido a
cenas de vandalismo e de longa perturbação da ordem, em intermináveis
greves de caráter político que têm como prato forte a destruição do
patrimônio, o consumo de tóxicos e o desrespeito à sociedade. O modelo
anarquista de greves generalizadas no ensino superior estendeu-se pelo
Brasil afora e reforça a convicção de que o nosso país perdeu o rumo.
Duas vias se apresentam, nesse conturbado cenário. Do ponto de vista
da sociedade, uma tomada de consciência da gravidade do problema,
acompanhada da mudança de comportamento, de forma a dar ensejo a nova
atitude que leve a gerar responsabilidade nos educandos e educadores. Do
ponto de vista político, a urgência de colocar sobre o tapete soluções
na reformulação da nossa política, que enveredou por esse caminho de
privatização do Estado por clãs, como se o único norte fosse beneficiar
amigos e apaniguados.
Difícil tarefa, quando o caminho para solucionar os conflitos passa
por algo que as pessoas se recusam a observar: os valores que as movem.
Sem isso a revisão deles e a mudança de atitudes se tornam tarefas
impossíveis.
Mas as coisas não param por aí. É necessário, também, reformular as
nossas instituições, a fim de que o Estado passe a servir à sociedade e
não continue a ser o balcão de negócios gerido por espertalhões que
privatizaram o governo em benefício próprio. Aqui a via necessária é a
da reforma política, que deve partir para reestruturar o nexo de
responsabilidade entre eleito e eleitor, impedindo a proliferação de
partidos nanicos e adotando um modelo de voto, como o distrital, que
atrele o eleito às responsabilidades decorrentes da representação de
interesses dos cidadãos.
De outro lado, faz-se necessário, na reforma apontada, colocar freio
ao excessivo poder acumulado pelo Poder Executivo, capaz de corromper o
Poder Legislativo mediante o oferecimento de vantagens pecuniárias. O
caminho da reforma, neste ponto específico, seria, em primeiro lugar, o
da responsabilização da atual presidente pelas decisões erradas em face
da Petrobrás, que de forma criminosa tiraram desta a sustentação de
credibilidade no cenário.
Em segundo lugar, a reforma política deveria contemplar a punição
exemplar daqueles que puseram as instituições do Estado a serviço de
políticas populistas que terminaram esvaziando os cofres públicos. É
necessário deixar às claras as obscuras decisões tomadas pelos governos
de Lula e Dilma no caso do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social (BNDES) para beneficiar amigos no cenário internacional, sem que
aparecessem as vantagens que daí adviriam para o Brasil. Refiro-me,
sobretudo, ao milionário financiamento para a construção do porto de
Mariel, em Cuba. Isso para não falar da falida aventura da construção da
refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco, da qual participaria com
recursos o governo venezuelano, sem que até a data o Brasil tenha
recebido um só tostão.
Uma providência necessária seria também acabar com a prática das
"emendas parlamentares", que só corrompem a representação e colocam o
Legislativo em mãos das negociatas inescrupulosas do Executivo.
O cenário, como se vê, é complicado e não sairemos dele sem um grande
esforço pessoal e coletivo. Escrevia recentemente o Prêmio Nobel Mário
Vargas Llosa (Suicídio político em voga, 8/2, A14) que as nações optam,
às vezes, pelo haraquiri político, tomando decisões erradas que
comprometem o bem-estar de futuras gerações. O Brasil, infelizmente,
está nesse caminho. Não será fácil sair dele. Mas não temos outra
escolha, se quisermos legar aos nossos filhos um País habitável, e não
um cenário de conflito e destruição.
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