sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Governo sem trégua - MÍRIAM LEITÃO


O GLOBO - 22/01


Não haverá trégua para a presidente Dilma Rousseff em 2016, no que depender da economia. A situação, que estava ruim, ficou ainda mais difícil com o vacilo do Banco Central, porque isso elevou o risco inflacionário. Ontem, o dólar bateu no maior nível do real, o que provoca aumento de vários custos. Esse e outros problemas da economia manterão a pressão contra o governo.

Se o ambiente fosse de retomada do crescimento, seria possível uma mitigação da crise política. Mas com a deterioração concreta das condições de vida da população, a possibilidade de melhora política fica mais remota. Economistas acham que dificilmente haverá recuperação durante o mandato da presidente Dilma porque ela está fazendo o que acredita, e isso não tem dado certo.

O economista José Márcio Camargo, da PUC-Rio e da Opus Gestão de Recursos, prevê uma inflação de mais de 1% em janeiro.

- Na Opus, nós estávamos prevendo 8% no ano, mas a partir da decisão do BC vamos rever – disse, numa entrevista que me concedeu na Globonews.

A maioria dos economistas não está com previsão de inflação em dois dígitos, mas vários consideram que a atuação vacilante do Banco Central ajuda a passar o sinal de que não haverá combate à inflação eficiente. Não porque os juros foram mantidos, mas pela forma desencontrada como se comunicou.

O economista Márcio Garcia explica que é delicada essa relação entre o BC e os sinais que ele emite.

- Eu achava que os juros deveriam subir, mas Affonso Celso Pastore, por exemplo, achava que não deveria. Não é a decisão em si o problema. O BC se amarrou ao dar tantos sinais de que elevaria fortemente os juros e, depois, durante a reunião indicou o contrário. A política de metas precisa desses sinais e quanto mais eles são entendidos, e o BC vai acertando, mais consegue agregar credibilidade. E quanto mais ele perde credibilidade maior terá que ser a dose do remédio amargo que é o juro alto.

José Márcio havia dito em meados do ano passado que o crescimento só ocorreria em 2018. Márcio Garcia concorda com essa previsão porque não acredita que o governo Dilma consiga reverter o quadro.

- Como ninguém sofre impeachment por patente incompetência, o meu cenário é que a presidente Dilma ficará até o fim do mandato. A política econômica será mais do mesmo. Vai oferecer crédito, mas não vai adiantar; vai tentar gastar mais, mas não terá como. Ninguém muda. A presidente é a mesma e vai continuar fazendo aquilo no qual ela acredita – diz Márcio Garcia.

José Márcio acha que o BC errou duplamente, ao se comunicar e ao manter os juros:

- A economia está ofertando menos e as pessoas estão consumindo menos, não adianta tentar crescer a demanda se as empresas estão diminuindo a oferta. Só se consegue com isso gerar inflação. É preciso que a queda da demanda seja maior do que a queda da oferta. Dificilmente a inflação ficará abaixo de 10% este ano.

Além disso, o problema fiscal permanece. Márcio Garcia acha que o pagamento das pedaladas também foi feito de forma equivocada, e que o descontrole fiscal continuará alimentando a crise:

- O problema fiscal é sempre o pano de fundo da crise brasileira e piorou muito no governo Dilma, que gastou demais e gastou por fora do Orçamento. Quando pagou aos bancos com recursos da Conta Única do Tesouro Nacional, é como se ele tivesse sacado dos recursos que poupou no passado para fazer superávit primário. Ou seja, é como se estivesse descumprindo as metas anteriores. E isso gera mais incerteza.

José Márcio também não acredita em melhora da economia durante o atual governo:

- É impossível. Ela perdeu qualquer capacidade de recuperar a credibilidade por tudo o que fez, pelos erros que cometeu no passado. E não é apenas a presidente. É uma forma de pensar que está levando o país ao desastre. O Brasil fez uma revolução pacífica entre 1994 e 2005. Espetacular. Fez várias reformas, reduziu a pobreza, privatizou. De 2005 para cá, fizemos uma contrarrevolução.

Com cenários econômicos negativos, a presidente continuará tendo dificuldade no Congresso. É difícil para um político apoiar um chefe de governo que provocou inflação, recessão, crise fiscal e desemprego.

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