Justiça
Favorecimento de apadrinhados políticos, uso eleitoral e falta de transparência nos sorteios são algumas das queixas; corrupção aparece em 2º lugar
Prédios erguidos pelo programa "Minha Casa Minha Vida" no
bairro do Fonseca, em Niterói, para vítimas da tragédia do Morro do
Bumba ameaçam cair. Pelo menos um deles terá que ser inteiramente
demolido e reerguido. Cada edifício custou 2 milhões de reais
(Marcelo Carnaval/Agência O Globo)
A fraude na lista de beneficiados é o problema mais comum
encontrado pelo Ministério Público Federal (MPF) no programa
habitacional Minha Casa Minha Vida - bandeira eleitoral da presidente
Dilma Rousseff. Este é o resultado de um levantamento feito com as
investigações abertas pelo MPF.
Desde o lançamento do programa, em 2009, durante o governo Luiz
Inácio Lula da Silva, os procuradores abriram 224 procedimentos, dos
quais 82 são sobre as fraudes de cadastro.
O segundo problema mais comum é a corrupção, como o pagamento
indevido de vantagens a servidores públicos. Há 26 procedimentos abertos
sobre o tema.
A lista ainda inclui financiamentos irregulares,
imóveis entregues em mau estado, questões ambientais, entre outros.
Parte dos procedimentos virou ação civil pública. Ainda não há conclusão
dos casos na Justiça.
O propósito do Minha Casa Minha Vida é destinar habitação popular a
famílias com renda entre 1.600 reais a 5 mil reais. O Ministério das
Cidades é responsável pela gerência do programa. Com ajuda do Tesouro
Nacional, a Caixa Econômica Federal financia a construção e a compra dos
imóveis por parte das famílias. As prefeituras são encarregadas do
cadastro de possíveis beneficiados.
Leia mais:
Transparência - Em Sergipe, a presidente do
Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência, Jane Rocha,
afirma que no Estado não está sendo cumprida a determinação legal de se
reservar ao menos 6% das moradias para pessoas com deficiência e idosos.
"Aqui as reclamações são gerais. Não há transparência. Os sorteios
funcionam assim, você vai ao município, ao conselho de habitação, e lá
nós só ficamos sabendo do resultado."
Após constatar possíveis desvios no processo de seleção dos
beneficiados, o procurador regional dos direitos do cidadão, Ramiro
Rockenbach, ingressou com uma ação civil na qual pede que a União
interrompa o repasse de recursos para Aracaju, São Cristóvão, Lagarto e
Itabaiana. "Temos denúncia de que está havendo todo tipo de
direcionamento, de favores políticos. Com nossas ações na Justiça
estamos insistindo que é preciso reorganizar todo o processo", diz
Rockenbach.
Em denúncia apresentada em Roraima, uma associação de moradores do
Bairro Planalto, em Porto Velho, estaria cobrando de forma ilegal uma
taxa de inscrição aos postulantes.
Servidores da Caixa também são alvo de investigações por suspeita de
receberem propina em Brasília para a concessão de financiamentos
habitacionais vinculados ao programa.
Eleições - As irregularidades também incluem o uso
eleitoral do programa por políticos. Em 15 de novembro de 2013, por
exemplo, o Ministério Público passou a investigar um provável candidato a
deputado estadual do Amazonas que estaria cadastrando irregularmente
motoristas de caminhão e ônibus com a promessa de contemplação de casas
por meio do programa. Há também suspeitas de desvios no Ceará, com
favorecimento de pessoas ligadas a prefeituras e a partidos políticos.
Diante da possibilidade de o programa também ser utilizado como
barganha por candidatos nas próximas eleições gerais de 5 de outubro, o
procurador regional eleitoral do Estado de Goiás, Ailton Benedito de
Souza, se antecipou e encaminhou no final de dezembro de 2013 um ofício a
todos os promotores eleitorais do Estado recomendando um acompanhamento
da execução dos programas, ações e políticas públicas federais nos
municípios goianos, com especial atenção ao Minha Casa Minha Vida.
"O uso promocional do programa, vendendo à população mais carente uma
ilusão de que se trata de uma distribuição gratuita e farta de unidades
habitacionais, revela-se assistencialismo nefasto, característico do
patrimonialismo eleitoreiro, mesmo que antecipadamente ao período
eleitoral legalmente previsto", afirma o procurador em trecho do
documento.
Parceria em investigações - O Ministério das
Cidades, responsável pela operacionalização do programa Minha Cada Minha
Vida, afirmou por meio da assessoria que as denúncias de
irregularidades que chegam ao conhecimento da pasta passam por uma
primeira apuração interna e, posteriormente, são encaminhadas aos órgãos
de controle - um dos quais é o próprio Ministério Público Federal -
para as devidas providências.
"O Ministério das Cidades responde a todos os procedimentos do
Ministério Público, um dos órgãos que recebem as denúncias de
irregularidades. Em alguns casos, o Ministério das Cidades encaminha ao
Ministério Público Federal e à Polícia Federal irregularidades para as
devidas providências", diz um trecho da nota oficial do ministério.
Entretanto, a Caixa Econômica Federal afirma que o cadastramento e a seleção de beneficiários cabem aos poderes locais.
Quanto ao inquérito em que se pede a investigação de fraudes no
âmbito de uma das agências de Brasília, a Caixa informa que foi ela
mesma que pediu a abertura do inquérito. "A Caixa reforça sua parceria
com o Ministério Público Federal na prevenção e combate às práticas
irregulares que atinjam a finalidade maior do Programa Minha Casa Minha
Vida: permitir o acesso à moradia à população de baixa renda", afirma o
banco em nota.
(Com Estadão Conteúdo)
Nenhum comentário:
Postar um comentário