21/02/2014
às 16:59“Eu sou ‘o do poste’! Sabe com quem está falando?”
Essa é a fala do “Dimenor”-celebridade ao ser detido, roubando de novo! Ou: Ensaios sobre a cegueira
A
jornalista Rachel Sheherazade foi mandada para um poste moral por conta
de um comentário que fez quando um menor que costuma praticar roubos
foi atado por moradores a um poste com uma tranca de bicicleta.
Já
escrevi a respeito e deixei claro que não concordo com boa parte da
abordagem que ela fez.
Mas parte da sua observação era e é procedente.
Quando afirmou ser “compreensível” que moradores tomem suas próprias
medidas, não quis dizer que é desejável, que o caminho é esse.
Fizeram, evidentemente, uma superinterpretação de sua fala porque a consideram ideologicamente incômoda.
Fizeram, evidentemente, uma superinterpretação de sua fala porque a consideram ideologicamente incômoda.
Muito bem!
O mesmo menor voltou a delinquir e voltou a apanhar. Vocês sabem a
mania que tem esse povo cruel de não gostar de ser assaltado, né?
Pô! As
vítimas desses “dimenores” têm de entender que estão apenas dando a sua
cota a uma política informal de distribuição de renda, poxa!
Mais:
existe luta de classes, como todos sabemos, e os assaltados integram o
grupo dos bandidos; os assaltantes é que são os verdadeiros mocinhos.
Como é que ninguém percebe isso?
Como é que ninguém percebe isso?
Reproduzo, em vermelho, trecho da reportagem de Leslie Leitão, na VEJA.com. Volto em seguida:
O jovem assaltou, com outros quatro
rapazes, uma turista canadense na Avenida Atlântica. Em seguida, o
bando tentou roubar os pertences de um turista inglês. Esta vítima, no
entanto, reagiu, e correu atrás dos garotos. Um grupo de pessoas que
presenciava a cena decidiu cercar os fugitivos, mas só conseguiu deter
dois deles.
Começou,
então, uma sequência de tapas. Sentindo-se acuado, o menor que ficou
preso pela tranca no início do mês lançou mão da fama que angariou
naquele episódio: “Eu sou o do poste! Parem de bater”, gritou.
E, de
fato, as agressões cessaram. Os dois jovens foram mantidos no local até a
chegada da Polícia Militar. E, novamente, na delegacia, o jovem do
episódio do poste voltou a se identificar como tal, para se proteger de
agressões: “Você sabe com quem está falando? Eu sou o menor da tranca”,
disse, aos policiais.
Voltei
Se há dote que bandido de qualquer idade ou classe social tem é o de aprender com a experiência. É evidente que o “Dimenor” percebeu que virou uma celebridade.
Tive informações de que,
talvez, ele seja portador de um déficit intelectual importante —
hipótese que tem de ser investigada e que deve, então, merecer a devida
resposta do estado —, mas a agilidade com que ele apelou ao “sabe com
quem está falando?” sugere o contrário.
Não estou afirmando, mas fazendo
uma conjectura.
A fala do
rapaz ao ser preso, mais uma vez, evidencia como aquele episódio
distorceu a verdade dos fatos. Apegaram-se mais ao simbolismo piegas do
que à realidade. Sintetizo o espírito de certas intervenções:
“É a imagem de um país que cultivou a escravidão por mais de 300 anos!”
“Não fosse um negro, não fariam isso”.
“Eis mais uma prova de racismo”.
“É o povo brasileiro que está no tronco”.
Quanta bobagem!
Quanta vigarice!
Quanta conversa mole!
Até parece
que brancos não são linchados todos os dias Brasil afora. O YouTube
traz uma penca de horrores.
Até parece que fazer justiça com as próprias
mãos é algo assim tão raro num país em que há mais de 50 mil homicídios
por ano — sem que se saiba, na esmagadora maioria das vezes, a autoria.
Amarrar
bandidos em poste resolve alguma coisa?
Não! Torna ainda pior o que é
ruim, mas é evidente que não é possível criminalizar, por princípio, a
sociedade que reage. É preciso coibir, sim, a justiça feita pelas
próprias mãos, mas é preciso compreender, então, a natureza do fato.
O rapaz
atado ao poste não era expressão de racismo, da crueldade com que são
tratados os pobres, da perversidade das elites, nada disso!
Até porque,
atenção!, ESSES JUSTIÇAMENTOS SÃO FEITOS POR POBRES — a esmagadora
maioria de pobres que decide trabalhar, que decide estudar, que decide
ganhar a vida honestamente.
Um país em que o rendimento médio do
trabalhador é pouco superior a R$ 1.900 — você que me lê: tente morar
com isso, pagar escola com isso, ir ao cinema com isso, comer com isso —
é um país… pobre!
A reação
àquele episódio lamentável foi para o lado errado! Os pruridos
politicamente corretos vieram à flor da pele como urticária ditada pela
boa consciência. E só.
Mesmo
discordando de boa parte da fala de Sheherazade — que foi mandada para o
poste —, a verdade insofismável é que ela estava mais no assunto do que
boa parte dos textos lacrimejantes e hipócritas que se escreveram a
respeito.
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