quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Sonho de todo brasiliense: Um espaço publico sem invasoes!



Por Eduardo Araia

Quem conhece o Minhocão, em São Paulo, ou o finado Elevado Perimetral, no Rio de Janeiro, sabe a que ponto a paisagem urbana de uma cidade pode ser corrompida por vias elevadas em nome do tráfego de veículos. 

O debate sobre manter ou demolir essas aberrações arquitetônicas ganhou há alguns anos uma nova e criativa opção: sua conversão em parques.

O símbolo dessa nova reciclagem é o High Line, o parque linear elevado criado no sudoeste da ilha de Manhattan, em Nova York. A linha que deu nome ao parque foi construída no início dos anos 1930 para levar trens de carga ao distrito industrial da ilha. 

Pairando a 9 metros do solo, a via férrea de 21 km de extensão substituiu um trecho da ferrovia que corria sobre o solo e cruzava 105 ruas e avenidas – um risco tão grande à segurança que a Décima Avenida, uma das artérias cortadas pelos trilhos, virou a "Avenida da Morte".

As plantas decidiram viver lá

Com a desindustrialização da ilha, nos anos 1960, a extremidade sul da via foi demolida, e em 1980 o último trem passou pela High Line. A pista ficou desativada desde então e, em 1984, proprietários de imóveis situados sob ela começaram a se mobilizar para derrubá-la. 

O impasse se arrastou por 15 anos, durante os quais a High Line ganhou a inesperada presença de vegetais resistentes típicos de clima seco, gramíneas, arbustos e pequenas árvores.
Em 1999, a demolição da via já estava nos planos da prefeitura de Nova York quando o Friends of the High Line, um grupo criado por moradores da região, liderados por Joshua David e Robert Hammond, propôs que ela fosse transformada num parque público elevado, inspirado num trecho do Promenade Plantée, de Paris.

A ideia ganhou apoio de moradores e autoridades e, em 2004, a prefeitura destinou US$ 50 milhões para concretizá-la. O projeto do parque foi entregue à empresa de arquitetura e paisagismo James Corner Field Operations e ao escritório de arquitetura Diller Scofidio + Renfro.



A primeira parte da obra, entre a Gansevoort Street e a 20th Street, foi iniciada em 2006, com a remoção de trilhos, do balastro (a mistura de areia, cascalho e outros materiais assentada na ferrovia para segurar os dormentes) e do entulho. 

A seguir foram feitos jateamento de areia para recuperar o aço, reparos no concreto e nos sistemas de drenagem e colocação de repelentes de pombos sob a via. Em 2008 foram instalados pontos de acesso, trilhas, assentos e iluminação. 

As espécies que brotaram na via durante o período de abandono foram replantadas. Em 2009, o trecho foi inaugurado. A segunda parte do parque, mais ao norte, entre a 20th Street e a 30th Street, foi aberta em 2012.


O xodó dos novaiorquinos

Por enquanto, o High Line tem 1,6 km de extensão, inseridos em um segmento de 2,3 km da via elevada. Há planos para estendê-lo até a 34th Street, com boa chance de êxito: a empresa dona do trecho já sinalizou que pretende doá-lo à cidade. O parque fica aberto diariamente, das 7 da manhã às 10 da noite.

Rapidamente, o High Line se tornou um xodó de nova-iorquinos e turistas. Um de seus atrativos é permitir uma visão nova, inusitada, da cidade e do Rio Hudson, que margeia o oeste de Manhattan. Uma plataforma põe o visitante no nível da copa das árvores. 

Há um gramado com mais de 450 m2 (raridade na área), uma pista de skate e diversos locais para sentar-se e apreciar o ambiente. A cada primavera, a vegetação recebe uma cuidadosa poda. E não faltam locais para comer e beber, tanto no parque aéreo como nos arredores.

Segundo o arquiteto James Corner, um dos projetistas do parque, os detalhes foram pensados para torná-lo um espaço que dê ao visitante a sensação de ter chegado a um "jardim secreto e mágico no céu". 

"O que é ótimo no High Line é que há refúgios, recantos e abrigos. 

Há descobertas incríveis por fazer, e se as pessoas subirem ao parque e encontrarem deleite ali, acho que fomos bem-sucedidos", disse aos jornais.

A vida cultural anima a aura do parque. Um setor do Friends of the High Line, o High Line Art, produz e comissiona obras de arte pública, tanto na via quanto nas cercanias, além de promover exibições, performances, programas de vídeo e outros eventos.

O parque está revitalizando o Lower West Side. Bem frequentado e com baixos índices de criminalidade, a via já estimulou a construção de cerca de 30 empreendimentos imobiliários, já prontos ou com obras em andamento. 

A lista inclui até dois hotéis sofisticados – o Standard, na 13th Street (sobre o High Line), e o Americano, entre a 27th Street e a Décima Avenida.

O sucesso já inspira outras metrópoles, como Chicago, Filadélfia e Saint Louis, a fazer algo similar. Rahm Emanuel, prefeito de Chicago, disse ao The New York Times que o parque é "um símbolo catalisador da revitalização de bairros". Oxalá o exemplo frutifique em outros hemisférios e latitudes.

LOW LINE, O PARQUE SUBTERRÂNEO

Nova York também deverá abrigar nos próximos anos o pioneiríssimo primeiro parque subterrâneo: o LowLine (oficialmente, Delancey Underground) pretende ocupar cerca de 8.100 m2 de uma estação do metrô desativada há décadas em Delancey Street, no sudeste de Manhattan.

Criação do arquiteto James Ramsey, do executivo da rede social PopTech Dan Barasch e do administrador de investimentos R. Boykin Curry IV, o LowLine pretende não apenas de servir à comunidade numa região muito carente de áreas verdes, mas também de se tornar um modelo de aproveitamento de espaços vazios subterrâneos.


Claraboia remota, uma iluminação especial

Ex-engenheiro de satélites da agência espacial americana (Nasa) e atual arquiteto-chefe do Raad Studio, Ramsey desenvolveu um sistema de iluminação especial para o projeto, a "claraboia remota". 

Ele canaliza a luz solar por cabos de fibra óptica que filtram as radiações infravermelhas e ultravioleta nocivas, mas deixam passar os comprimentos de onda presentes no processo de fotossíntese, a fim de permitir o crescimento de plantas e árvores. 

"Propomos usar um sistema de irrigação solar para coletar e concentrar a luz do sol", diz o arquiteto. 

Ele imagina uma plataforma com dúzias de coletores solares na Delancey Street alimentando um sistema de iluminação situado no interior da estação.



O engenheiro garante que o projeto vai virar realidade. Antes de requisitar o espaço pretendido ao órgão responsável, a Metropolitan Transit Authority (MTA), eles planejam passar um período engajando moradores do Lower East Side na ideia, apresentando-o em escolas de ensino médio e encontros comunitários. 

A coleta online de US$ 100 mil para produzir maquetes do empreendimento, proposta em 2012, superou em US$ 50 mil a meta estipulada. 

Atualmente, Ramsey e sua equipe trabalham junto ao MTA para obter autorização para construir o parque, enquanto prosseguem buscando contribuições para a iniciativa.

Nenhum comentário: