sexta-feira, 21 de março de 2014

2014 – A eleição da violência


Existem muitos critérios que podem definir o voto presidencial em países democráticos, porém é seguro dizer que o mais presente sempre terá algo a ver com a economia. 

Recessão, desemprego e inflação são exemplos de como as mais importantes variáveis na equação do voto são do grupo econômico. Num país com povo (ainda) tão pobre como o nosso, é natural que ela tenha uma importância ainda maior.

Foi assim que, após o caos inflacionário da era Sarney, o desespero econômico mais o desencanto com “tudo que está aí” abriu alas para projetos presidenciais radicais: um arrivista (Collor), um projeto comunista (o PT de então) e outro socialista-caudilhesco (Brizola, que por muito pouco não foi ao segundo turno). 

A vitória contra a inflação proporcionada pelo Plano Real levou um até então desconhecido do povão à Presidência ainda no primeiro turno, feito que foi consolidado 4 anos mais tarde com a reeleição também no primeiro turno. 

Apagão e cansaço em relação ao estilo tucano em 2002 pavimentaram o caminho do lulismo, que em 2006 e 2010 seguiu em frente após uma extraordinária época de oportunidades para o Brasil (crescimento gigantesco de China e Índia, aumentando demanda por commodities).

É extremamente difícil para o grupo disforme que se aglomera no termo “direita do Brasil” vencer eleições tratando de temas econômicos. 

Nem mesmo a perspectiva de crises, inflação alta ou baixo crescimento ajudam pois o mais fácil seria a população responder às políticas econômicas que nos levaram a esses problemas escolhendo gente que acentuaria as medidas responsáveis por isso. 

Em termos econômicos, o povo brasileiro é totalmente de esquerda.
Não há aqui nenhum juízo quanto à preferência do brasileiro pelas políticas econômicas de esquerda. 

Da mesma forma que em termos de costumes o mais natural e “seguro” para essa mesma população seja adotar opiniões conservadoras, é bem claro que o discurso de esquerda fala mais ao povo, ainda mais voltando ao mote do início deste texto, um povo tão pobre – que por consequência estuda menos, se instrui menos, consome menos cultura. 

Também é natural que pessoas com poucos bens duráveis e propriedades tenham menores noções de respeito à propriedade, dêem menos importância ao tema. 

E imaginem então explicar que políticas de gatilho salarial alimentam o ciclo inflacionário, que cada benefício e novo gasto que se peça ao governo deve necessariamente exigir fontes de financiamento e que essas só existem via impostos… 

Os mais pobres e com subempregos também não “vêem” o pagamento de impostos via retenção na folha de pagamento ou pagando carnês no final do ano. 

Pessoas com pouco dinheiro mais dificilmente abrem legalmente seus negócios, tendo então que sentir na pele o peso, os custos e a ineficiência da imensa burocracia estatal que se justifica consumindo-se a si mesma. 

Por fim, a narrativa revanchista e de ódio econômico aos ricos tem fácil absorção num país tão pobre e historicamente com disparidade social tão grande como a nossa.

Acontece que 2014 tem tudo para ser a primeira eleição nacional em que o grande tema não será algo relacionado à economia, mas à sobrevivência mesmo da população: a violência. 

Se em outros tempos já tivemos piores índices de assassinatos e roubos, além duma eterna subamostragem da real gravidade desse problema, diversos fatores contribuem para que estejamos hoje vivendo o período de maior sensação de insegurança. 

um crescimento substancial no poder aquisitivo da população desde a chegada do Plano Real. 

Houve uma política ativa de incentivo ao consumo pela cessão de crédito, aumentando sua importância nos indicadores econômicos do país e criando uma sensação de, como dizem na esquerda, empoderamento dos mais pobres. 

Em paralelo e independente disso, houve uma aceleração enorme da evolução tecnológica no ramo da informática, tornando computadores e demais aparelhos que surgiram desde então meios importantíssimos de comunicação e busca de informação para pessoas de todas as classes. 

O fim da inflação trouxe mais possibilidade de ascenção econômica, o ciclo de prosperidade das novas potências econômicas aumentou o dinheiro circulando pelo país, o governo estimulou o consumo interno e então o que temos é um período jamais visto de inversão de papéis.


Não é difícil imaginar o descontentamento da pessoa que sonhou ter um carro, ainda mais num país cuja população tanto valoriza os veículos automotores,e quando finalmente pode tê-lo descobrir que tem de pagar caro para ter a sua nova propriedade segurada ou correr o risco de perdê-la em um momento. E quantos desses novos donos de carro não foram vítima de assaltos? 

Transporte essa situação para outros bens almejados pelos pobres: tv, notebook, celular, tênis de marca, relógios. Tudo isso chama atenção e, na lógica do crime brasileiro, tornam a pessoa uma potencial vítima. 

Também relacionado ao crescimento da sensação de violência, quantas pessoas não passaram a ser assaltadas ou a temer andar de noite devido à deterioração urbana causada pelo flagelo do crack e fortalecimento das organizações criminosas?

Somando o incremento no número de potenciais vítimas, do surgimento de pequenos objetos de grande valor e rápida venda no mercado negro (celulares, smartphones, tablets, notebooks) e o crescimento no número de micro-empresários com a mais fácil disseminação tanto de notícias de crimes quanto de indignação diante deles se chega à situação atual em que não passa um mês sem termos um crime chocante virando destaque nos telejornais noturnos, menos propensos a darem espaço a este tipo de notícia.


Para o PT e para a esquerda nacional, nada poderia ser pior. Há um enorme desencontro entre as propostas de esquerda para segurança nacional, e mesmo de leitura do fenômeno, e o senso comum. 

O governo tucano de São Paulo baixou muitos os índices de criminalidade aumentando enormemente o efetivo das polícias e construindo presídios numa velocidade muito acima da média nacional. 

O governo do peemedebista Cabral instalou bases no meio das favelas, as UPPs, e conseguiu retirar parcialmente o total domínio que os criminosos tinham dentro das favelas. 

Como seriam possíveis essas ações em um governo esquerdista? Oras, a esquerda daqui odeia a PM, pretende acabar com ela, sem falar ou dar qualquer idéia de como seria uma polícia desmilitarizada. 

Um petista chegou a dizer que nossos policiais “são homens do século XIX, inadequados para o enfrentamento da nova realidade”! 

O que fariam então com os policiais se fossem desmilitarizar a polícia, demitiriam a todos ou os tornariam “novos homens”? 

Eu não consigo imaginar como seria essa reforma, que deveria ser feita por legislação nacional, mas já consigo perfeitamente imaginar um governo estadual fatiando o orçamento e as diretorias duma nova polícia “social” entre partidos de sua base e repletos de militantes partidários. 

A esquerda daqui também acha que no Brasil “se prende demais”, repete que não devem ser feitos mais presídios e que deve-se mesmo é afrouxar o código penal, isso quando não apresenta propostas que praticamente inviabilizariam qualquer presídio no país, a menos que se liberte metade dos presos (ver projeto). 

E a esquerda nacional também discorda da ocupação de favelas pois eles crêem que polícia equivale a opressão ilegítima, e pensam que todo cidadão teme a PM, ou que os favelados prefeririam o velho domínio de bandidos nas ruas.


Cotidiano macabro
Cotidiano macabro

Quanto mais a violência for debatida até a eleição, mais difícil será a vitória do PT. 

Por mais que ações massivas do crime organizado, como ondas de ataques, possam prejudicar o governo paulista por exemplo, o PT deve pisar em ovos ao falar do tema, ainda mais por haver um histórico do PCC pedindo voto para político petista - político que, maldito destino, hoje encontra-se num lugar em que tal organização se estruturou: um presídio. 

E como o PT explicará, durante a campanha, que de tudo fez para evitar um projeto bastante razoável que aumentava a punição de crimes hediondos cometidos por menores de idade ( link ), enquanto a oposição era favorável ( link )? 

Como o governo dirá à população que sua base esquerdista impediu a tramitação de um projeto que sugere transferir o Auxílio-reclusão, benefício dado à família dos criminosos que contribuíam à Previdência, à família da vítima, quando essa ficar desamparada ( link )? 

Quanto tempo um esquerdista precisa para explicar suas teorias de que o crime existe “porque há muitos pobres”, sem ofender a todos os pobres que não cometem crimes? 

Como o PT explicará a criação de inúmeros ministérios insignificantes com gente desqualificada e a não criação de um Ministério da Segurança Pública, que aliás estava entre as propostas do candidato de oposição derrotado em 2010? 


Como a esquerda dirá que há criminosos porque os pobres estudam pouco sem ofender aos milhões de pobres brasileiros, que estudaram pouco e não estão no mundo do crime?
 
Para o cidadão comum que está distante da luta política, apenas vota e depois sofre as consequências das políticas públicas, é muito proveitoso que a segurança pública seja um tema eleitoral central nas eleições presidenciais. 
 
Pensar que segurança pública é coisa de governo estadual é reduzir demais o peso do problema e ignorar que as Leis são federais, que o Brasil não é grande produtor de drogas nem de armamentos, e que isto foge ao controle dos estados. 

Deixar segurança pública fora da agenda de governo federal é uma posição confortável por evitar os desgastes de um tema tão espinhoso e que prejudica linearmente todos os extratos da população: tanto pessoas de pequenas quanto de médias e grandes cidades; pessoas do campo e do meio urbano; pessoas ricas, de classe média e pobres; brancos, mestiços e negros; jovens e idosos; homens e mulheres 

Cabe aos politólogos de oposição e aos cidadãos que têm interesse em viver num país um pouquinho que seja mais próximo do razoável, não deixar que eliminem esse tema do debate eleitoral.. A violência como foco das eleições será mais um dos casos em que o que será ruim para o grupo no poder será bom para o conjunto da população.



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