segunda-feira, 10 de março de 2014

Por que não apoio “Marcha da Família” e muito menos pedidos por volta dos militares

BLOG Ceticismo Politico

marcha


Demorou para eu tocar neste assunto, por que “haja saco” para algumas coisas. Mas já não era sem tempo. Felipe Patury, figura pouco confiável, publicou o seguinte em sua coluna na Época:

No próximo dia 22, em São Paulo, sai da Praça da República rumo à Catedral da Sé a segunda edição da Marcha da Família com Deus pela Liberdade. A original fez, em 1964, percurso semelhante dias antes de o ex-presidente João Goulart ser derrubado. Há 50 anos, a organização coube à então primeira-dama do estado, Leonor de Barros, e mulheres de empresários. A atual foi convocada pelas redes sociais, recebeu apoio de lideranças evangélicas, espírita e, pelo Facebook, da apresentadora Rachel Sheherazade, do SBT. O grupo diz contar com a simpatia do filósofo Olavo de Carvalho e até de Denise Abreu, a petista que mandou na aviação civil no governo Lula e ficou famosa por sua predileção por charutos.
Ao que parece a simpatia de Olavo não é tão forte assim. Será que Patury foi desonesto ao não pesquisar o que Olavo disse em seu próprio perfil? Seja lá como for, aqui está:
É claro que apóio a Marcha, mas há um problema. A Marcha de 1964 foi a maior manifestação popular da história do Brasil. Levou dois anos para organizá-la, com o apoio de inumeráveis organizações cívicas muito poderosas e influentes (Maçonaria, Liga das Senhoras Católicas, Associações Comerciais de todo o Brasil, ABI, OAB, etc, etc, além de vários governadores de Estados). Agora vocês não têm um milésimo desse apoio. O simples fato de dar à Marcha o nome da manifestação de 1964 já é uma imprudência. Apóio portanto o conteúdo moral da manifestação, mas não a maneira como a coisa está sendo conduzida. Não fui consultado a respeito e acho mesmo um mau sinal que alguém, após dispensar os meus conselhos e fazer tudo à sua própria maneira, me use de garoto-propaganda.
Várias e várias pessoas já me perguntaram o que acho a respeito disso tudo no Facebook. Agora é o momento de meu parecer: não vejo a coisa com bons olhos.

Há um sério problema na Marcha da Família atualmente. Primeiro, que essa marcha original foi um movimento conservador. E, hoje em dia, não há mais espaço para um movimento conservador, e sim para uma aliança entre liberais e conservadores. Caso contrário, vamos perder em volume. Segundo, quanto mais o frame “conservador” for propagado, menos atraente tudo vai se tornar para os liberais que também são contra a esquerda.

É quando pegamos uma das lições principais de Gramsci e jogamos fora: no momento de se criar ações em guerra assimétrica, quanto mais díspares esses grupos lutando a nosso favor forem, melhor. Basta que tenham um objetivo em comum. Entretanto, se este grupo estipula restrições para a entrada no grupo (ex.: é preciso ser contra o aborto, é preciso ser contra o casamento gay, etc.), menos aderência teremos.

Por esse princípio, Gramsci entendeu que não precisava nem sequer que todos aqueles ao seu lado se interessassem pelo marxismo original. Bastaria que estivessem contra “o capitalismo opressor”, e usassem qualquer configuração de conflitos e luta contra os valores ocidentais que já estaria valendo. Pensando assim, ele retirou várias das restrições daqueles que lutariam ao seu lado, em prol de um ataque em larga escala ao senso comum de direita da população.

Hoje em dia, para ser um gramscista, basta comprar qualquer uma das lutas de classe arbitrárias e ser a favor do inchaço estatal que alguém já será parte do exército gramscista. Não é preciso nem ter lido Marx.

A Marcha da Família, por outro lado, tenta dar uma visão unificada do que seria uma resposta ao pensamento de esquerda no Brasil. 

O problema é que a Marcha da Família é um movimento de “defesa de valores específicos”, enquanto na verdade o melhor, hoje em dia, seria um movimento de “ataque a valores específicos da esquerda”, independentemente de alguém ser ateu ou religioso, ou de alguém apoiar a família tradicional ou não. (Aliás, eu não vejo problemas na Marcha da Família em si. 

Acho que eles possuem valores interessantes, mesmo que eu não compartilhe de todos. Só não quero que eles posem como “a direita”. Eu não sou conservador, e sou de direita.)

A Marcha da Família, neste sentido, é prejudicial por trazer, mais uma vez, aquela imagem de John Lithgow no filme “Footlose”, para a direita – para quem não se lembra deste filme, o papel de Lithgow era o de um reverendo que não queria que “ninguém se divertisse”, ou, ao menos, é assim que ele foi percebido. 

E neste momento não precisamos desta imagem. Precisamos de uma direita mais diversificada, que tenha conservadores, liberais e libertários, todos eles atacando sem dó os cânones da esquerda. 

Por exemplo, eu tenho visto alguns neo-ateus que debandaram para o liberalismo e hoje atacam a esquerda com uma assertividade e estratégia que os conservadores ainda precisam assimilar. 

Eu mesmo aprendi a atacar a esquerda de forma assertiva com os neo-ateus, dentre outros. O fato é que a esquerda possui alguns cânones que devem ser atacados, e não precisamos restringir nosso grupo para esmagar ideias como:
  • vitimismos artificiais
  • lutas de classe mais falsas que menstruação de travesti
  • pedidos de inchaço estatal
  • fascismo
  • censura à imprensa e Internet
Ao que parece a Marcha da Família pede muito mais do que luta contra esses itens acima, e, portanto, restringe a participação das pessoas e tenta vender uma imagem muito restrita da direita. Em termos de guerra política, no mínimo isso é contraprodutivo. 

(Em síntese, eu não tenho nada contra a Marcha da Família, mas temo pela forma como ela pode ser usada. E algo me diz que a esquerda vai se aproveitar muito bem disso. Portanto, tomem cuidado, pessoal da Marcha…)

Como se isso não fosse o suficiente, ainda temos o fato da Marcha da Família ser associada normalmente à Revolução Militar de 1964, que resultou na implementação de uma ditadura. E nesse jogo, algumas das pessoas da direita caem, dizendo que “os militares precisam voltar”. Não, não precisam, e vou dizer o motivo.

O regime militar de fato nos livrou de um bando de psicopatas com sede de sangue. Regimes marxistas conseguiram, no século XX, ceifar 100 milhões de vítimas. 

Em Cuba, mataram 100.000 pessoas. Dá para imaginar o que fariam no Brasil. Qualquer pessoa em sã consciência deve gratidão aos militares por terem nos livrado de um bando de psicopatas. Ponto.

Por outro lado, o regime militar falhou miseravelmente na guerra cultural. É explicado: aquele que investe seus esforços na luta armada direta tende a se desfocar quanto a guerra cultural. 

O resultado é que a esquerda marxista nadou de braçada durante o regime militar. Difícil imaginar um desempenho pior, em termos de guerra cultural, do que aquele do regime militar. Merece uma nota zero com louvor.

É uma dura realidade reconhecermos que, se por um lado os militares nos livraram de marxistas sanguinários em 1964, por outro eles não nos agregaram valor algum em termos de guerra cultural e, por isso, não tem mais espaço no ambiente político atual.

O novo ambiente é baseado naquele que consegue o poder a partir de derrubadas de hegemonia existentes e construção de novas hegemonias, a partir de guerras de posição, em termos culturais, e isso envolve a inserção de pessoas na academia, nos jornais e em diversos meios de comunicação. 

Envolve também aparelhamento e desaparelhamento de instituições ligadas ao estado. Tudo isso sem precisar usar a força. Apenas executar a guerra de posição adequadamente. Neste novo território, ganha quem conseguir ocupar os espaços da melhor forma possível.

No debate público, onde deveríamos focar a maior parte de nossos esforços, ganha quem controlar o frame da melhor forma. É quando, na solicitação por “volta dos militares”, vejo alguns direitistas fazendo propaganda para a esquerda.

É hora em que eu preciso ser duramente honesto, não importando com quem se magoe com o que vou dizer: o pedido por “volta dos militares” quase sempre beira a infantilidade.

Explicarei o motivo, em alguns bullets:

  • tudo o que o esquerdista quer é um governo totalitário, que controle todo e qualquer passo de nossas vidas, e garanta uma vida nababesca aos donos do estado inchado
 
  • em prol deste ideal, ele dirá que luta pela “democracia”
 
  • tudo o que o direitista quer é um governo que não controle cada passo de nossas vidas, ou seja, um governo que nos sirva, ao invés de sermos serviçais do governo
 
  • em prol deste ideal, alguns da direita dizem que devemos “ter a volta dos militares”
 
Quem quer que não perceba que há algo de gravemente errado nos discursos aí em cima simplesmente não prestou atenção em como funciona a guerra política ou realmente não entendeu a lição número 1 da política.

O que podemos entender é que, com raiva pela situação atual, alguns direitistas jogam um “foda-se” e pedem “que venham os militares”. 

Ou seja, eles sentem algo e em seguida falam. Mas a fase em que sentimos e automaticamente falamos, especialmente em território aberto, é a infância. 

É por isso que eu digo que esse comportamento não pode ser tolerável a quem tem mais de 12 anos de idade.

No caso da esquerda, no entanto, eles sentem que precisam do poder totalitário, mas, em público, falam exatamente o oposto, pedindo “democracia”. 

Qual o motivo pelo qual fazem isso? Por que eles sabem que o frame “democracia” é poderoso, principalmente por que eles viveram sob um regime militar que acusam de ditatorial. 

Em outras palavras, não importa o quanto eles queiram de totalitarismo (por exemplo, eles apoiam as barbáries de Nicolas Maduro na Venezuela), eles sempre dirão “lutar pela democracia” por que isso dá a eles a autoridade moral necessária. 

Enquanto isso, alguns da direita dizem “que voltem os militares”, dando ao esquerdista a propaganda dos sonhos dele.

Deixe-me explicar de forma mais didática.

O esquerdista acorda e abre sua agendinha, antes de suas ações políticas, especialmente aquelas envolvendo lançamento de discursos em território aberto. Eis o que ele tem na agenda:
  • Como esquerdista, não posso esquecer da meta de dar poder totalitário aos meus líderes
 
  • Mas não posso esquecer de dizer que “quero democracia” enquanto faço isso
 
  • É essencial para mim que alguns direitistas digam que querem “a volta dos militares”
 
  • É importante que alguns deles façam isso, pois eu direi que eles querem “ditadura”
 
  • Com isso, poderei vender a mim e aos meus como “lutadores da democracia” e eles como “adeptos da ditadura”
 
  • Com alguns draminhas lembrando unhas arrancadas no regime militar, poderei me fingir de vítima e transformá-los em vilões
 
Essa é a verdade nua e crua. Sempre que alguém da direita pediu “volta dos militares”, principalmente depois dos anos 80, sempre terminou fazendo propaganda para os esquerdistas, que estão, a cada dia, obtendo cada vez mais poder totalitário. 

E quanto mais pessoas da direita pedirem “volta de militares” mais fácil o jogo fica para eles, pois tudo serve como propaganda gratuita para a esquerda.

Eu sei que eles querem o poder totalitário. Qualquer leitor sabe. Mas o que importa, para eles, é como se vendem ao público. 

E eles tem sido extremamente talentosos ao vender a imagem de “lutadores pela democracia”, e, para isso, precisam de um bando de direitistas “motivados” do outro lado dizendo que querem “a volta dos militares”.

 Claro que nestes últimos vemos uma ingenuidade absurda e inaceitável. E pior: esses direitistas que pedem “volta de militares” não recebem um centavo dos esquerdistas. 

Aí não dá. Ser um serviçal, em termos de propaganda para a esquerda, e não receber nada em troca é demais!

Ao pessoal que pede a “volta dos militares”: comecem a cobrar alto dos esquerdistas pela propaganda feita para ajudá-los. Caso contrário, sugiro que deixem essa ideia para lá.

Como alternativa à Marcha da Família e “pedido por volta de militares”, sugiro uma agenda:

  • Apoiar a todos aqueles que sejam contra a agenda da esquerda, sejam eles: ateus ou teístas, heterossexuais ou homossexuais, puritanos ou “largados”, conservadores ou liberais, etc.
 
  • Não precisamos dizer como os outros devem se comportar, mas definir valores dos quais as pessoas devem fugir, que são os valores da esquerda, como: moral psicopática, apologia a criminosos, cultura do vitimismo, culto ao estado, etc.
 
  • Devemos rejeitar qualquer “volta de militares”, mas lutar para vencer a guerra cultural. Não há outra opção além dessa.
 
  • Reconhecer que a esquerda jamais ganhou nada. Foi a direita que perdeu. Basta a direita reconhecer isso e investir em consciência política e estratégia política, que recuperamos o território perdido.
 
  • Devemos causar rejeição social ao comportamento de esquerda, e saber que esquerdismo é uma falha de caráter, e, em muitos casos, uma doença mental.
 
  • Devemos, em última instância, revisar o estatuto ético do esquerdismo. Ser esquerdista é moralmente errado.

Com uma agenda como essa (e olhe que nem coloquei todos os itens), podemos enfim gerar danos ao pensamento de esquerda, e eliminar, por parte deles, qualquer propaganda (ao menos aquelas que sejam feitas com base em nosso discurso) que queiram fazer.

Alias, é por isso que esquerdistas dificilmente conseguem me atacar, pois minha agenda é não apenas assertiva, como amplamente amparada pelos princípios da guerra política. 

Lembremos: temos que falar para um eleitorado tão amplo quanto possível, e não apenas para aqueles que possuem todos os valores iguais aos nossos (ver o texto Política e Princípios, da Arte da Guerra Política, de David Horowitz).

Os esquerdistas sabem que precisam temer meu discurso, pois eles não podem pegar nenhuma parte do que eu digo para usar em favor deles. 

Eu sou inclusivo, compassivo, tolerante, defensor da pluralidade e ao mesmo tempo ataco-os com uma contundência que poucos conseguem equiparar. Este é o tipo de adversário que devemos ser para a esquerda. 

Não como o pessoal do “Marcha da Família”, que restringe os que pertencem ao seu grupo, ou aqueles que pedem “volta dos militares”, e, no fundo, quebram o galho da esquerda.

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