Agonizando em praça pública
Thomas Traumann deve rodar
As
últimas 24 horas demonstraram com rigor a crise profunda em que o governo Dilma
está mergulhado,
agregando uma série de problemas criados por seu próprio entorno aos que já
estão sobre a mesa desde a reeleição.
Dois fatos especialmente aumentaram a pressão sobre o governo: um documento atribuído à Secretaria de Comunicação (Secom)
com sugestões absurdas da tática a ser usada para tentar reverter a
popularidade negativa do governo; e a crise criada por
um comentário do ministro Cid Gomes, repetindo como farsa uma frase de
Lula em 1989 sobre a quantidade de picaretas e achacadores que o Congresso
abriga.
Não bastassem os problemas que o governo
tem que enfrentar sem apoio da base aliada, que continua
dividida entre seus próprios interesses e a tentativa de fazer populismo num
momento de grave crise econômica, vem o ministro Cid Gomes levar para
dentro do Palácio do Planalto uma crise política que seria dispensável nesse
momento.
Lula já dissera, quando terminou seu mandato de deputado
constituinte, que havia 300 picaretas no
Congresso. Essa sua frase não foi obstáculo a que, anos
mais tarde, fizesse acordos políticos com a maioria desses picaretas, e
mais alguns que surgiram pelo caminho.
Já Cid Gomes, depois de ter dito coisa
similar, saiu ontem do Congresso debaixo de críticas contundentes, que
recebiam aplausos dos “achacadores”
de plantão. Para o ex-governador do Ceará, há no Congresso entre 300 e 400
deputados que vivem do quanto pior, melhor. ( Neles incluídos os deputados do PMDB que prometem regularizar invasões em áreas ambientalmente protegidas em troca de votos!)Seriam os “achacadores” do governo, que, disse ele na fala em que
supostamente pediria desculpas, deveriam “largar
o osso”.
Sua maneira arrogante de se dirigir ao Congresso, até mesmo apontando o dedo para o presidente da Câmara, deputado
Eduardo Cunha, dizendo que preferia ser chamado de mal educado a ser
acusado de achacador como Cunha o fora pelo Ministério Público, só fez piorar a
situação, embora possa ter tido sucesso em setores do Palácio do Planalto que
pensam como ele e não podem explicitar esse sentimento.
Não está aqui em questão se o ministro da Educação tem
ou não razão, ou se ele é a pessoa mais adequada para fazer essa acusação.
Cid Gomes simplesmente atravessou a calçada para
escorregar em uma casca de banana, e o pedido de demissão é uma
consequência lógica da pressão do PMDB, mas
o que importa é que governo vai agonizando em praça pública.
Só um governo
destrambelhado, sem comando e sem rumo como esse, não resolve esse
problema com a demissão do ministro no momento exato em que a frase foi
divulgada, não importa se o conteúdo é verdadeiro ou não. E também só em um governo que está em seus
estertores acontece o vazamento de um documento como o da Secom.
E só num governo
incompetente alguém coloca no papel propostas
tão absurdamente ilegais como se fossem naturais. Como, por exemplo, reconhecer que há uma simbiose
entre o aparato oficial de comunicação do governo e os do PT, além de elementos
externos, como os chamados “blogueiros
sujos”, classificados de “soldados”
de fora do governo, pagos para fazer uma “guerrilha” de
informação:
“As responsabilidades da comunicação oficial do governo federal e as do PT/Instituto Lula/bancada/blogueiros são distintas. As ações das páginas do governo e das forças políticas que apóiam Dilma precisam ser muito melhor coordenadas e com missões claras. É natural que o governo (este ou qualquer outro) tenha uma comunicação mais conservadora, centrada na divulgação de conteúdos e dados oficiais. A guerrilha política precisa ter munição vinda de dentro do governo, mas ser disparada por soldados fora dele.”
Diz também o documento atribuído à Secom e
não desautorizado, que “a publicidade
oficial em 2015 deve ser focada em São Paulo, reforçando as parcerias com a
Prefeitura. Não há como recuperar a imagem do governo Dilma em São Paulo sem
ajudar a levantar a popularidade do Haddad. Há uma relação direta entre um e
outro.”
Não é com propaganda que os governos, o de Dilma e o do prefeito Fernando Haddad, recuperarão a popularidade perdida devido à incompetência no
trato das questões do dia a dia do cidadão-eleitor. Só fatos, decisões
concretas, reconhecimento de erros, farão com que seja possível pensar em uma
recuperação de imagem. E assim mesmo sem garantia de sucesso.
A proposta só demonstra claramente como o governo Dilma se confunde com o PT e
não tem uma visão global, nem dos problemas nem das soluções.
Um governo para todos, balela da
propaganda oficial.
Por: Merval Pereira – O Globo
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