Renato Santana
de Brasília
A
primeira batalha de uma guerra ainda longe do fim acabou vencida pelas
bancadas ruralista e evangélica da Câmera Federal. Por 38 votos a dois,
foi aprovada na Comissão de Constituição Justiça e Cidadania (CCJ) nesta
quarta-feira, 21, a
Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/2000. A proposta segue
agora para Comissão Especial e o movimento indígena segue mobilizado.
O
objetivo da PEC 215 é levar para o Congresso Nacional a demarcação e
homologação de terras indígenas, quilombolas e de áreas de conservação
ambiental, que conforme a Constituição Federal são atribuições do Poder
Executivo. Em dia de levante da bancada ruralista no Congresso Nacional,
que força a aprovação do novo Código Florestal, o Planalto pouco fez,
apesar de contrariado, para sustentar os deputados que combateram a
aprovação da PEC.
Durante
a sessão da CCJ, o movimento indígena esteve presente e protestou com
cânticos, rituais e gritos de guerra. A polícia legislativa entrou em
ação e com truculência tentou de todas as formas calar os indígenas,
impedindo-os de mostrar a indignação contra a PEC. “Essa proposta afeta a
vida dessas pessoas, portanto os indígenas têm todo o direito de
protestar”, destacou o deputado Paulo Teixeira (PT/SP).
Estavam
presentes na sessão indígenas – cerca de 30 - dos povos Xakriabá, de
Minas Gerais, Guarani Kaiowá e Terena, de Mato Grosso do Sul, Kaingang,
do Rio Grande do Sul, Macuxi, da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, de
Roraima, além dos povos Marubo, Kanamari, os dois da Terra Indígena Vale
do Javari, e Mura, do Amazonas, além dos Kayapó e XiKrin, ambos do
Pará.
“Essa
PEC é movida por interesses econômicos dos ruralistas, que não são
melhores e mais eficientes que a vida e costumes desses povos que
possuem direitos sobre a terra. Garantir tais direitos é uma questão de
soberania nacional”, opinou o deputado Evandro Milhomen (PCdoB/AP).
Os
deputados aliados da causa indígena e contrários a proposta tentaram de
todas as formas, conforme o regimento, postergar a votação por
entenderem que além dela ser inconstitucional, a proposta mereceria mais
discussão e debate, pois mexeria com a vida dos povos e causaria mais
instabilidade social e jurídica.
Exemplos
como a situação conflituosa no Mato Grosso do Sul, onde em novembro do
ano passado o cacique Nísio Gomes Guarani Kaiowá foi assassinado, sendo
que depois o corpo foi levado pelos pistoleiros, foram citados para
mostrar que a conjuntura é de vulnerabilidade e insegurança.
“Em
verdade, essa PEC deveria ser arquivada. Ela atenta diretamente contra o
direito desses povos, que aqui estavam antes da formação do Estado. A
proposta é flagrantemente inconstitucional porque invade a competência
do executivo”, atacou o deputado Alessandro Molon (PT/RJ), um dos
parlamentares mais incisivos contra a PEC.
Votação tensa
Conforme
estratégia, os deputados contra a PEC passaram a apresentar
requerimentos pedindo o adiamento da votação. Os ruralistas que fugiam
ao controle e iam para o debate eram logo repreendidos por seus pares. A
ordem era para não fazer nenhuma discussão, mas pressionar a votação.
“Os
mesmos que querem alterar o Código Florestal querem aprovar essa PEC e
são contra a PEC do Trabalho Escravo. Isso não é coincidência. Trata-se
da mesma turma”, alertou o deputado Sarney Filho (PV/MA). O deputado
Evandro Milhomen completou: “Os indígenas vão defender e brigar por suas
terras e mais sangue será derramado. A responsabilidade será dos
deputados”.
Tensionada,
a sessão chegou ao fim com a bancada ruralista sobre o presidente da
CCJ, Ricardo Berzoini (PT/SP), enquanto os indígenas cantavam em protesto. A
polícia legislativa agia com truculência e deputados gritavam longe dos
microfones, denunciando os abusos e pedindo o adiamento da sessão. Com o
caos instalado, Berzoini colocou a PEC em votação.
“Está
se colocando a toque de caixa uma alteração da Constituição que afetará
a vida dos indígenas em vista do interesse econômico e imediatista de
meia dúzia de ruralistas, que querem a terra desses povos”, enfatizou o
deputado Ivan Valente (PSOL/SP). A minoria privilegiada impôs uma
derrota não definitiva, mas reveladora sobre o quão fortalecido estão os
setores mais conservadores da sociedade.
Confronto
A
vitória foi comemorada de forma efusiva pelos ruralistas e evangélicos.
No entanto, os indígenas não esmoreceram e decidiram seguir para
protesto e rituais no Salão Verde da Câmara Federal. Mais uma vez a
polícia legislativa entrou em ação e tentou impedir a passagem dos
indígenas. Houve confronto e um dos policiais sacou a pistola de choque,
mas logo foi denunciado pelos indígenas.
Os
deputados Amaury Ribeiro (PT/BA), Domingos Dutra (PT/MA), Padre Ton
(PT/RO) e Alessandro Molon (PT/RJ) intervieram e junto aos policiais
negociaram a passagem dos indígenas. “Com certeza os indígenas vão
passar, ninguém pode impedir”, disse o deputado Amaury ao chefe da
operação policial – que mobilizou cerca de 30 homens. Entre os
indígenas, idosos e mulheres.
Ainda
assim eles não queriam permitir e apenas depois de ligações para a mesa
diretora da Câmara Federal é que os policiais deram passagem. Em
manifestação, os indígenas percorreram o interior do Congresso Nacional
até o Salão Verde com os deputados fazendo uma corrente na frente.
Mais mobilizações
“Se
estamos em 30 hoje chegaremos a 300. Podem nos esperar, porque a guerra
apenas está no começo”, gritou um indígena Xakriabá na direção da
bancada ruralista. Um dos policiais revidou dizendo que era provocação.
“Eu não estou aqui porque quero. Quem me provocou a estar aqui foram
eles (ruralistas)”, respondeu.
Durante
esses dias de mobilizações para combater a PEC, os indígenas ouviram de
tudo. “Eles não são índios, mas negros. Índio tem o cabelo liso”, disse
uma assessora parlamentar da bancada ruralista para a colega da
Confederação Nacional da Agricultura e Agropecuária (CNA), sem se
importar com quem estava ao seu lado.
Apesar
da derrota, o movimento indígena promete realizar mais mobilizações por
todo o país, sobretudo nas aldeias. “Esse é um crime para nós. Sofremos
e vamos sofrer mais com essa PEC. Volto para Roraima para mobilizar o
meu povo”, disse a liderança Jeci Makuxi, da Terra Indígena Raposa Serra
do Sol, de Roraima.
“Se
com a Funai (Fundação Nacional do Índio) já está ruim, imagina com
deputado que não entende nada de índio e está cheio de interesses. Somos
contra por isso”, disse Apuiu Mama Kayapó, do Pará. “Deputado
fazendeiro não vai votar pelo índio. Isso não está direito. Vamos fazer
manifesto grande. O governo já não respeitou com Belo Monte e agora nada
fez contra essa PEC. Vamos ter é que trazer os guerreiros”, concluiu.
Movimento Indígena
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