Apesar do cenário desolador, a solução passa pela conscientização individual e pelo emprego de políticas públicas efetivas para tornar o cidadão protagonista das iniciativas, não apenas expectador
eric.zambon@jornaldebrasilia.com.br
Brasília não tem muito o que comemorar no Dia do Meio Ambiente. O número de pontos de despejo irregular de lixo dobrou em relação ao último levantamento, em 2009, e chegou a mil, segundo estimativas da Agência de Fiscalização (Agefis) em parceria com o Serviço de Limpeza Urbana (SLU).
Além disso, o Lixão da Estrutural parece longe de ser desativado, apesar de existir projeto para a construção do aterro em Samambaia desde 2007.
A coleta seletiva, introduzida à rotina do brasiliense em fevereiro do ano passado, estabeleceu a meta de reciclar 15% das quase 900 mil toneladas de resíduos produzidos anualmente no DF. Cinco cidades tiveram o serviço descontinuado no início de 2015 por “falta de engajamento da população”, segundo o Serviço de Limpeza Urbana (SLU), e o objetivo parece distante – apenas 20 mil toneladas de lixo, o equivalente a 2,2% do total, teriam sido reaproveitadas, segundo a pasta, desde 2014.
Apesar do cenário desolador, a solução passa pela conscientização individual e pelo emprego de políticas públicas efetivas para tornar o cidadão protagonista das iniciativas, não apenas expectador. Especialistas apontam que educação é a primeira coisa a ser trabalhada.
Cada um faz o seu
O coordenador do movimento Jardineiros do Planeta, Sérgio Monroe, sempre desconfiou da eficácia de medidas como a coleta seletiva. “Nós produzimos muito lixo. Não é apenas fazer coleta, mas reduzir o consumo”, alerta o servidor público. Ele mora em Samambaia e, no parque Três Meninas, organiza o grupo que se dispõe a recuperar áreas degradadas, promover conhecimento sobre o Cerrado e ajudar a reciclar materiais.
Sérgio recebe apoio de outros membros, entre eles a corretora de imóveis Rejane Reis. Ela se encanta com as mudas de pequi e os eucaliptos do parque e exalta a ação dos Jardineiros. “É um trabalho de realização pessoal que dá frutos para a comunidade. As pessoas frequentam mais a área verde e vêm pela qualidade de vida”, assegura.
Segundo os voluntários, a consciência deve se tornar parte fundamental da educação do cidadão. Ações em escolas devem ser promovidas cada vez mais. “É clichê, mas as crianças são a próxima geração que vai cuidar deste planeta. Elas devem ter a mesma consciência que nós, senão o mundo ficará abandonado”, aponta Sérgio.
Lixão atual é péssimo exemplo
“Vivemos em um país com necessidades em áreas como saúde e transporte. Alguns pensam que o meio ambiente é frescura, mas não têm noção da importância”, avalia o pesquisador do Núcleo de Estudos Ambientais da UnB Gustavo Salgado. Para ele, essa mentalidade é facilmente constatada na capital. “E o principal poluidor, que dá péssimo exemplo, é o próprio GDF ao manter, por exemplo, o Lixão da Estrutural”, completa.
Quase tão antigo quanto Brasília, o espaço é considerado uma “chaga para a cidade” pela atual gestão, mesma opinião dos últimos governos. Apesar disso, o aterro de Samambaia, única medida substitutiva à disposição, está em fase de construção desde 2007, sem previsão para ser entregue.
“Foram feitas, no ano passado, cinco licitações, três da Novacap, uma do SLU e uma da Caesb, e todas são necessárias para que o aterro possa operar, mas cada contratante tem prioridade diferente”, justifica o diretor técnico do SLU, Paulo Celso dos Reis Gomes. “São mais de 17 instituições envolvidas nesse processo. Não falamos em prazo porque independe de nós, mas queremos finalizar tudo antes do fim do mandato”, promete.
A situação se tornou mais crítica após a morte, nos últimos 45 dias, de dois trabalhadores no Lixão da Estrutural, esmagados por um trator e um caminhão, respectivamente. Isso motivou a declaração de estado de emergência e a criação de um grupo especial dentro do governo para programar uma intervenção. Até a próxima semana, a promessa é de um plano pronto para ser debatido com a população.
Fiscalização e punição são difíceis, diz Agefis
A Agefis admite a dificuldade de fiscalizar e aplicar a multa de R$ 50 mil, relativa a descarte irregular de lixo, pois os responsáveis são os que jogam o material, não os donos do terreno. No Guará, por exemplo, nas proximidades da feira e a poucos metros da administração regional, o funcionário de uma gráfica foi flagrado jogando lixo em um campo aberto, próximo ao trilho do metrô. Ele deixou o local antes que a reportagem pudesse abordá-lo e, até o fechamento desta edição, os telefonemas para a empresa não foram atendidos.
A professora de gestão ambiental da UnB Gama Maria Vitória Ferrari acredita que o fracasso de campanhas sobre sustentabilidade passa pela falta da instrução. “As iniciativas não têm tanta visibilidade e as pessoas raramente procuram saber. A atitude de descartar as coisas na rua é absurda. Não é equívoco, é falta de educação, no sentido mais literal possível”, argumenta.
Para ela, o governo não está isento de responsabilidade, pois deve ajudar a comunidade a ter empatia pelas causas importantes. “Nosso erro, porém, é transferir para o governo as iniciativas. Quais são os principais problemas urbanos? Trânsito, lixo e poluição. Teríamos que fazer uma lista para cada cidadão e depois um mapeamento conceitual”, explica.
O autônomo Luis Hernandes tentou fazer sua parte. Há alguns anos, adotou as ecobags por um tempo, em substituição às sacolinhas de plástico, mas confessa ter abandonado a rotina. “Pararam de falar sobre o assunto e eu parei de me preocupar”, admite o morador de Samambaia.
Ele relata que agentes comunitários visitavam a vizinhança para conscientizar sobre o uso das sacolas ecológicas e até sobre o descarte adequado de lixo, mas isso parou de acontecer e ele viu outros moradores também perderem os hábitos sustentáveis. “Tem a questão do óleo, para não o despejarmos na pia, que parei também”, lamenta.
Fonte: Da redação do Jornal de Brasília
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