10/10/2015
A Polícia Federal confirma que a campanha do petista ao governo de Minas Gerais, em 2014, recebeu dinheiro de origem suspeita e não declarado à Justiça. O nome disso: crime eleitoral
No
projeto de poder traçado pela cúpula do PT, vencer as eleições para o
governo de Minas Gerais em 2014 era mais que uma questão de honra. Era
vital.
As pesquisas indicavam que havia chances reais de o petista
Fernando Pimentel interromper a hegemonia do PSDB no estado. No plano
nacional, Dilma Rousseff também estava de olho nas urnas mineiras.
Um
bom desempenho em Minas poderia garantir a disputa a seu favor. Um mau
desempenho poderia influir na disputa presidencial e consolidar de vez a
imagem de candidato imbatível do seu principal adversário, o
ex-governador mineiro Aécio Neves. Não havia uma segunda opção.
O PT
montou uma estrutura de campanha como poucas vezes se viu. Carros,
aviões, farto material de propaganda, marqueteiros contratados a peso de
ouro, centenas de comitês municipais. Não faltou dinheiro. De azarão,
Fernando Pimentel logo passou a franco favorito e ganhou no primeiro
turno. No plano nacional, o segundo maior colégio eleitoral do país
assegurou a Dilma a vitória no segundo turno por uma diferença apertada
de pouco mais de 3 milhões de votos. Só Minas Gerais garantiu 6 milhões
de votos à presidente. A investida se mostrou perfeita. Quase perfeita.
Dois dias depois do primeiro turno, com o
petista Pimentel ainda comemorando a vitória esmagadora, a Polícia
Federal interceptou no aeroporto de Brasília um avião turboélice
procedente de Belo Horizonte. Uma denúncia anônima alertou os agentes
sobre a presença de dinheiro clandestino a bordo. Não era trote. Os
agentes encontraram 113 000 reais dentro de uma sacola. Mais
interessante, porém, era a identidade de um dos passageiros. Assustado,
falando intensamente ao telefone desde que a aeronave havia sido cercada
pelos policiais, estava o empresário Benedito de Oliveira Filho.
Amigo
íntimo de Fernando Pimentel, Bené, como é conhecido, é um daqueles
personagens que ninguém sabe ao certo de onde surgiram, o que fazem,
para quem trabalham. É um daqueles personagens que, de uma hora para
outra, aparecem do nada, são tratados como autoridade, se comportam como
autoridade e vivem as delícias de uma autoridade. Doutor Bené tinha
todos esses predicados.
Em 2010, quando Dilma foi eleita
presidente pela primeira vez, Doutor Bené saiu das sombras pela primeira
vez. Ninguém sabia, mas, no governo petista, ele se transformara num
megaempresário. Em poucos anos ganhou contratos que somariam mais de 500
milhões de reais – muitos deles sem licitação e, pior, sem a devida
prestação de serviço. Mesmo com esse currículo desabonador, Bené foi
escolhido como uma espécie de gerente do comitê central da campanha
presidencial do PT.
Ao mesmo tempo em que faturava milhões do governo,
ele era o responsável por pagar as despesas do comitê – as corriqueiras e
também as nada republicanas. Uma delas, a que trouxe o operador à luz,
resultou num grande escândalo. O empresário arregimentou um grupo de
arapongas para produzir dossiês contra adversários da candidata petista.
Na época, o coordenador da campanha e chefe de Bené era Fernando
Pimentel. Quatro anos depois, a história se repetiu.
A bordo da aeronave, além do dinheiro, a
Polícia Federal encontrou documentos e arquivos digitais que, pouco
depois, se mostrariam cruciais para uma descoberta muito maior. Sempre
nas sombras, Bené tinha participado ativamente da vitoriosa campanha do
amigo Fernando Pimentel ao governo de Minas.
Os papéis e anotações
mostravam que o protagonismo do empresário no escândalo da campanha de
2010 não serviu, sequer, como lição – nem para ele, nem para seu patrão.
Bené continuou a ganhar milhões no governo federal e, paralelamente, a
prestar auxílio financeiro aos seus companheiros petistas, em especial a
Fernando Pimentel.
Planilhas apreendidas indicavam que o dinheiro do
empresário bancou parte da campanha de Pimentel, além de suas contas
pessoais, passeios e mordomias, inclusive no período em que ele esteve
no cargo de ministro do Desenvolvimento do governo Dilma. A mão generosa
era extensiva a Carolina Oliveira, a mulher do governador. Era
generosidade com dinheiro público.
Deflagrada pela Polícia Federal a partir
dos indícios surgidos no flagrante do aeroporto, a Operação Acrônimo
mergulhou num poço de ilegalidades patrocinadas pela dupla Bené-
Pimentel que extrapola em muito os limites do favorecimento pessoal. Os
investigadores já descobriram que o empresário atuou como um eficiente
pagador de despesas não contabilizadas da campanha de Pimentel ao
governo.
Em um relatório juntado aos autos na terceira etapa da
operação, iniciada na semana retrasada, a delegada encarregada do caso
afirma, taxativamente, que o governador cometeu crime eleitoral ao
esconder de sua prestação de contas despesas milionárias contabilizadas
apenas no caixa dois administrado por Bené. Os policiais juntaram aos
autos cópias de notas fiscais que mostram que gráficas da família de
Bené produziram uma parte significativa do material de campanha usado
pelo PT, sem que esse custo fosse declarado à Justiça Eleitoral, como
manda a lei. Um crime que pode resultar na cassação de mandato do
governador. Mas é ainda mais grave.
As investigações estão comprovando que o
dinheiro que abastecia esse caixa dois era proveniente de negócios
escusos fechados no governo federal nos tempos em que Pimentel era
ministro e tinha em mãos uma caneta poderosa, sob a qual estavam
vinculadas, por exemplo, decisões importantes do Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), subordinado à pasta que ele
comandava.
A partir dos documentos apreendidos, de e-mails e mensagens
telefônicas interceptadas, a polícia já reuniu provas de que os amigos
de Pimentel cobravam propina de empresas em troca de decisões do
ministério e do BNDES. Para a PF, a quadrilha começou a vender
facilidades em 2011, com Pimentel, e seguiu com o sucessor dele, Mauro
Borges.
Quem intermediava as decisões de interesse das empresas era
Bené. E, depois que Pimentel deixou o governo federal, quem atuava para
que essas decisões fossem tomadas era Mauro Borges, também amigo do
petista. Os lucros eram repartidos entre todos – incluindo a campanha, o
governador e sua mulher.
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