Em cinco anos, orçamento do Ministério do Meio Ambiente
cai R$ 1,3 bilhão, diz estudo
Levantamento da WWF Brasil em parceria com a ONG Contas
Abertas foi divulgado nesta terça-feira. Verba para áreas consideradas
fundamentais caiu R$ 100 milhões de 2017 para 2018.
Por Lucas Salomão, G1, Brasília
06/03/2018 00h01 Atualizado 06/03/2018 10h19
Estudo divulgado pela WWF-Brasil, em parceria com a ONG
Contas Abertas, aponta que, em cinco anos, o orçamento do Ministério do Meio
Ambiente (MMA) caiu mais de R$ 1,3 bilhão. Em 2013, a verba prevista para a
pasta era de pouco mais de R$ 5 bilhões – já em 2018, o orçamento autorizado é
de 3,7 bilhões.
O levantamento aponta ainda que houve uma de mais de R$ 93
milhões entre 2017 e 2018 para áreas consideradas fundamentais.
Segundo o estudo, em 2017, o orçamento destinado às unidades
de conservação e a ações como o combate ao desmatamento, a conservação de
espécies, a regularização de imóveis rurais e a implementação da Política
Nacional de Recursos Hídricos foi de pouco mais de R$ 2,216 bilhões. Já em
2018, o orçamento para essas áreas é de R$ 2,123 bilhões.
As despesas com pagamento de pessoal, por outro lado,
tiveram um aumento de 2% – saíram de R$ 998 milhões em 2017 para 1,01 bilhão em
2018.
O G1 procurou os ministérios do Meio
Ambiente e da Fazenda (de onde os dados para o levantamento foram tirados) e
aguardava resposta até a publicação desta reportagem.
Procurado, o Ministério do Planejamento afirmou que, em
razão do "atual momento fiscal e em busca de assegurar o cumprimento das
metas fiscais, o governo federal se viu obrigado a reduzir os gastos em todos
os órgãos da União".
"Cabe ressaltar que, hoje, mais de 90% do orçamento federal
corresponde a despesas obrigatórias ou não contingenciáveis. Portanto, qualquer
ampliação de limites de gastos, sem que haja redução em outros ministérios,
depende do aumento do espaço fiscal", informou a pasta.
Orçamento autorizado para o Ministério do Meio Ambiente
desde 2009
Verba prevista para 2018 é mais de R$ 1,3 bilhão menor do
que há cinco anos
Fonte: Siafi/Tesouro Nacional
Embora a diminuição de recursos liberados pelo governo em
2018 não seja uma exclusividade do MMA, de acordo com o estudo, a pasta dispõe
de orçamento bastante inferior se comparado a outros ministérios.
O levantamento aponta que os gastos autorizados para o
Ministério do Meio Ambiente equivalem, por exemplo, a pouco mais de 20% do
montante autorizado ao Ministério da Agricultura, e apenas a 10% do total
repassado ao Ministério de Minas e Energia.
O estudo apontou ainda um descompasso entre os rendimentos
da exploração de recursos naturais e o repasse desses valores para o
financiamento de políticas de meio ambiente.
Segundo o documento, nos últimos dez anos, a União arrecadou
cerca de R$ 400 bilhões referentes à exploração de recursos naturais como água,
petróleo e outros minerais. Ao mesmo tempo, no mesmo período, o orçamento
repassado ao MMA por fontes de recursos não ultrapassou R$ 64 bilhões.
'Meio ambiente não é prioridade'
Especialista em políticas públicas do WWF-Brasil, Jaime
Gesisky afirmou à reportagem que, após o estudo, há uma "clara
mensagem" que o governo passa à sociedade:
"O meio ambiente não faz parte das prioridades dos
políticos", disse.
"O Ministério do Meio Ambiente precisa ser tratado como
prioridade na repartição do dinheiro público porque quando você investe na
área, você está investindo no futuro. O meio ambiente é como se fosse uma
poupança, você precisa investir para poder aproveitar. Essas áreas [que
sofreram cortes orçamentários] fornecem coisas essenciais para a gente, como
água, ar, alimento. É o futuro que está em jogo", disse Gesisky.
O especialista também destacou que houve um corte
"significativo" nos repasses ao Instituto Chico Mendes de Conservação
da Biodiversidade (ICMBio), órgão vinculado ao Ministério do Meio Ambiente
responsável pela manutenção das unidades de conservação.
Em 2018, houve uma redução de 44% no repasse de verbas ao
ICMBio – a previsão orçamentária para a área é de R$ 708 milhões para esse ano,
contra R$ 1,25 bilhão em 2017.
Além disso, as verbas repassadas diretamente às unidades de
conservação foram reduzidas em mais de R$ 15,7 milhões – R$ 252 milhões em
2017, contra R$ 236 milhões em 2018.
"Uma primeira grande mensagem que a gente vê é que os
cortes recaem sobretudo sobre o ICMBio, que é um órgão que executa a
preservação de áreas conservadas no Brasil. O que nós estamos entendendo é que
há um processo de enfraquecimento do Sistema Nacional de Unidades de
Conservação. Se não tem dinheiro para essas áreas, nós estamos enfraquecendo
essas áreas protegidas", pontuou.
Gastos autorizados para as principais ações do MMA
AÇÃO
|
2017
|
2018
|
Bolsa Verde
|
R$ 68,5 milhões
|
R$ 0
|
Conservação de espécies
|
R$ 204,3 milhões
|
R$ 182,1 milhões
|
Desmatamento
|
R$ 90,8 milhões
|
R$ 110,2 milhões
|
ICMBio
|
R$ 1,2 bilhão
|
R$ 708 milhões
|
Manejo florestal
|
R$ 3,5 milhões
|
R$ 3 milhões
|
Mudanças climáticas
|
R$ 7,3 milhões
|
R$ 7,3 milhões
|
Pagamento de pessoal
|
R$ 998 milhões
|
R$ 1,01 bilhão
|
Recursos hídricos
|
R$ 181,6 milhões
|
R$ 136,2 milhões
|
Unidades de conservação
|
R$ 252,2 milhões
|
R$ 236,4 milhões
|
Fonte: Siafi/Tesouro Nacional
Bolsa Verde
O corte orçamentário mais profundo, de acordo com o estudo,
foi no Bolsa Verde, programa que paga a cada três meses R$ 300 a famílias
extremamente pobres e que moram em áreas protegidas, como incentivo à
conservação dos locias.
Em 2017, a verba destinada ao programa foi de R$ 61,7
milhões. Já em 2018, não há orçamento previsto para o Bolsa Verde.
"Um Estado que dá dinheiro para pagar
auxílio-moradia para juízes é o mesmo Estado que corta o Bolsa Verde para
famílias extremamente pobres que moram em unidades de conservação",
criticou Jaime Gesisky.
Segundo o estudo, ao defender o corte no Bolsa Verde, o
governo federal informou que buscará manter os repasses às famílias por meio do
Fundo Amazônia, criado para captar doações destinadas a investimentos em ações
de prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento, e de promoção da
conservação e do uso sustentável da Amazônia Legal.
O problema, porém, é que o principal doador do fundo, a
Noruega (que é responsável por 98% dos repasses), reduziu a verba para mais da
metade. Em dezembro do ano passado, o governo norueguês repassou ao fundo US$
41,8 mil, cerca de 43% do valor transferido em dezembro de 2016 (US$ 97,9 mil).
O governo norueguês atribuiu a redução do repasse ao aumento do desmatamento registrado no Brasil entre
agosto de 2015 e julho de 2016.
Para as entidades responsáveis pelo estudo, a redução na
área vai "completamente na contramão" do que o prometido pelo
presidente Michel Temer em setembro do ano passado na abertura da 72ª
Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU).
Na ocasião, o presidente afirmou que o Brasil reduziu em 20% o desmatamento na Amazônia e que persistiria
"nesse caminho.
'A tendência é piorar'
Fundador e secretário-geral da ONG Contas Abertas, Gil
Castello Branco disse que, após a conclusão do estudo, a grande preocupação é
"com o que vai acontecer".
"A grande preocupação é com o que vai acontecer, porque
a dotação prevista para esse ano é inferior à dotação do ano passado. Ou seja,
aquilo que já não era muito bom, passa a ter uma perspectiva pior nesse ano,
porque há uma queda em diversas dessas iniciativas consideradas prioritárias,
como as verbas para as unidades de conservação ou a verba para recursos
hídricos", disse.
Para ele, a situação fiscal do país e a mudança de foco do
governo para a área de segurança pública são dois dos principais motivos para a
preocupação das entidades que atuam na área do meio ambiente.
Castello Branco disse ainda que a tendência para esse e para
os próximos anos é de que haja uma "intensa disputa por recursos
orçamentários".
"Agora, como o foco é a segurança, para aumentar a
verba para as ações de segurança, naturalmente você vai precisar tirar de
outras áreas. Aí você tem a PEC do teto de gastos (aprovada em 2017 pelo
Congresso). Além disso, tem as despesas obrigatórias, que são gigantescas,
pagamento de pessoal, emendas parlamentares, dívidas do governo", disse o
secretário da Contas Abertas.
"É uma preocupação legítima diante da crise fiscal.
Então a disputa por recursos orçamentários nesse ano vai ser muito intensa, e o
Ministério do Meio Ambiente já sai com essa dificuldade inicial de redução no
orçamento", concluiu.
Nenhum comentário:
Postar um comentário