Mente Aberta – ter, 11 de fev de 2014
A figura do bode expiatório é tão
antiga quanto a prática de encontrar um culpado - tenha ele culpa ou não
- para um desgoverno, uma calamidade, ou mesmo para um desfortúnio
pessoal. Culpar alguém fora de nós pode aliviar a dor, mas não resolve o
problema. Digo que também há acidentes sem culpados, as fatalidades.
Escorregar numa folha seca, bater com a cabeça no meio-fio e morrer.
Nesse caso, de quem é a responsabilidade? Da folha? Do meio-fio? Do
acidentado?
Mas voltando à expiação. Dependendo do momento político-econômico,
os culpados viram sujeitos coletivos. Os judeus foram perseguidos em
épocas diferentes da história. Idem os árabes que, neste começo de
século, são os bodes do ocidente. Imigrantes também levam a culpa quando
o desemprego aumenta. Quando tudo vai bem, são bem-vindos. Basta o
barco fazer água para muita gente querer afogá-los.
No Brasil de 2014, a Copa do Mundo
é candidata preferencial a bode expiatório pelas nossas (velhas)
maldades. A educação vai de cinco a zero? Culpa da Copa. A saúde pública
é uma doença generalizada? Culpa da Copa. Meu amor não me ama mais?
Culpa da Copa! Os políticos também viraram culpados coletivos. Mais
fácil jogá-los na vala comum da corrupção, do que diferenciá-los. Mais
simplório se esconder atrás de uma máscara do que pôr conteúdo nos
protestos.
Pois diferenciar, matizar,
organizar dão trabalho. Nos obrigam a mexer com os neurônios, a buscar
referências, a estudar a História do Brasil. Quantos se dispõem à
reflexão? Menos trabalhoso meter a boca na Copa do Mundo, xingar a
todos. Mais confortável dizer ninguém me representa. Assim como na vida pessoal, preferimos acreditar que a relação amorosa não deu certo porque o outro teve a culpa.
Se levássemos em conta que todos
temos responsabilidades e que essas responsabilidades se entrecruzam,
talvez não precisássemos eleger bodes expiatórios. Políticos ruins são
reeleitos por eleitores ruins. Programas de baixarias na TV são mantidos
por espectadores que gostam de baixarias. Então vale perguntar: como eu colaboro com a violência e a humilhação? Como eu colaboro para nossa tremenda desigualdade?
Respondendo a essas questões, posso chegar a outras perguntas: O que eu
posso fazer pela não violência? Como contribuir para um Brasil educado?
De que forma votarei melhor? Que habilidade posso oferecer à sociedade?
Qual a taxa de densidade do meu grãozinho de areia na praia do mundo?
Imagem: Régine Ferrandis sobre "O acusador" de Adèle Vergé.
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