Atualizado em 21 de agosto, 2014 -
A trajetória de Marina Silva é marcada por uma série de guinadas e recomeços.
Cabem algumas vidas nos 56 anos da nova
candidata à Presidência pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), no
lugar do falecido Eduardo Campos.Desde então, vem cultivando seu espaço na política brasileira com movimentos muitas vezes surpreendentes, como quando anunciou no ano passado seu apoio a Eduardo Campos.
Conheça algumas das transições mais marcantes em sua vida.
Infância difícil
Batizada Maria Osmarina Silva e Souza, Marina nasceu em uma família de seringueiros que vivia no seringal Bagaço, a 70km da capital do Acre, Rio Branco.
Dos 11 irmãos, três sucumbiram a doenças que quase lhe vitimaram também. Ela sobreviveu a casos de malária e hepatite e guarda até hoje as consequências de ter tido o sangue contaminado por mercúrio na infância.
Os problemas de saúde incluem intolerância a carne vermelha, frutos do mar, lactose, bebidas alcoólicas, maquiagem e cosméticos em geral.
Ela e as irmãs caminhavam quilômetros todos os dias para trabalhar com o pai no seringal. Ninguém na sua família havia ido à escola.
Aos 16 anos, Marina resolveu ir para a capital em busca de educação e tratamento para a hepatite. Em uma entrevista à revista Piauí, seu pai, Pedro Augustinho da Silva, lembrou da sua reação ao saber que a filha queria "ir aprender": "E tu lá vai aprender alguma coisa?", reagiu.
Marina foi acolhida por freiras no convento das Servas de Maria e aprendeu de fato a ler e escrever. Depois, deixou o convento e trabalhou como empregada doméstica na casa de uma família em troca da moradia enquanto estudava.
Quando viu seu nome na lista dos aprovados do primeiro curso equivalente ao primário, Marina se ajoelhou e agradeceu a Deus, como lembrou em entrevista à BBC Brasil alguns anos atrás.
"Aquela lista que me aprovou como alfabetizada, apta à educação, me abriu um portal."
Início na política
Marina aproximou-se da política na época da faculdade de História, quando filiou-se ao Partido Revolucionário Comunista (PRC).
Na época, conheceu o seringueiro e líder sindical Chico Mendes e trocou o PRC pelo PT. Foi eleita vereadora em 1998, com o maior número de votos em Rio Branco.
No mesmo ano, o amigo Mendes foi assassinado por seu ativismo pela preservação da Amazônia e dos meios de subsistência dos seringueiros. Em 1990, Marina foi eleita deputada estadual, e, aos 36 anos, chegou ao Senado.
"Ela vai ganhando o plano nacional de forma lenta e bastante consistente", diz o cientista político Ricardo Ismael, professor da PUC-Rio.
"Se há um Estado distante do centro das atenções no Brasil, é o Acre, e ganhar destaque vindo de lá não é algo trivial. Mas ela vai ganhando espaço nacionalmente como uma pessoa que conhece bem a Amazônia, uma região até hoje discutida de maneira episódica no Brasil."
Ministra
Marina já havia se consagrado como ambientalista e defensora da Amazônia quando foi anunciada por Lula como um dos primeiros nomes a compor seu ministério, em 2003. A notícia repercutiu bem internacionalmente.
"Ela já era um ícone nacional e internacional, e Lula sabidamente aproveitou sua boa imagem e a chamou para ser ministra do Meio Ambiente", diz o cientista político David Fleischer, da Universidade de Brasília (UnB).
"Ela deu bastante dor de cabeça para Lula e também para Dilma, então chefe da Casa Civil. Até que não aguentou mais e caiu fora."
Os cinco anos como ministra reforçaram o seu prestígio como ícone na luta ambiental – durante sua gestão, centenas de pessoas foram presas por crimes ambientais, o índice de desmatamento na Amazônia foi reduzido e uma área recorde de reserva indígena foi demarcada.
Mas Marina bateu de frente com ruralistas e amargou derrotas como a aprovação de safras de soja transgênicas e o asfaltamento da BR-163, que liga Cuiabá, no Mato Grosso, a Santarém, no Pará.
Cada vez mais isolada, decidiu deixar o Ministério em 2008, após a notícia de que o Plano Amazônia Sustentável tinha sido passado a outro ministro. Após mais de 20 anos no PT, rompeu com o partido em 2009.
Candidata à presidência
Foi lançada à Presidência e conquistou inéditos 19 milhões de votos para o partido – ficando em terceiro lugar, atrás de Dilma Rousseff e José Serra, e forçando a ida da disputa para o segundo turno. Afirmava querer ser "a primeira mulher negra e de origem pobre" a ocupar o Palácio do Planalto.
No ano passado, mostrou que continuava com disposição para concorrer ao cargo tentando lançar o partido Rede Sustentabilidade, mas não obteve assinaturas suficientes para a empreitada.
Mesmo com a forte campanha de "marineiros" indo às ruas para buscar apoio à criação da sigla, Marina não conseguiu validar as quase 500 mil necessárias para fundar o novo partido, ficando 50 mil abaixo da meta.
Ela deu, então, mais uma guinada surpreendente, declarando apoio a Eduardo Campos – e depois tornando-se sua candidata à Vice-Presidência.
Eleições 2014
Depois de passar os últimos dez meses viajando pelo país para impulsionar a campanha de Campos – a quem tinha "aprendido a respeitar" durante este período – Marina se vê agora no centro das atenções.
Apesar de um primeiro resultado promissor em uma pesquisa de opinião, só agora os brasileiros poderão começar a vê-la e ouvi-la como candidata à Presidência – e colocar na balança as diversas imagens construídas a partir de sua biografia, como a de ambientalista radical, promessa de mudanças, evangélica devota ou liderança carismática.
Para David Fleischer, da UnB, muitos ainda têm dela a imagem de alguém que defendia posições radicais e batia de frente com o agronegócio. Mas há também um entusiasmo inspirado em suas propostas de mudança.
O fato de ser evangélica divide opiniões e afasta eleitores que discordam de sua posturas conservadoras contra o casamento gay e o aborto.
Por outro lado, ela tem uma vivência do país que a aproxima de eleitores mais pobres.
"Ela se credencia numa lógica parecida com a de Lula – a de quem conhece os problemas do Brasil por andar na rua e correr o país", diz Ismael, da PUC-Rio.
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