Atualizado em 14 de agosto, 2014 - 18:33 (Brasília) 21:33 GMT
Dia 13 de julho. Maracanã. Um
enorme jogo de futebol, taticamente muito bem jogado, tecnicamente quase
perfeito, com ritmo, velocidade, emoção, casa histórica, cheia,
torcedores misturados, golaço decisivo. Era a final da Copa do Mundo.
Tudo bem, é verdade. Não dá para um evento ser muito melhor do que a
final da Copa do Mundo.
Ao longo de um mês, um mês cravado desde o final da Copa, tivemos:
- Jogador apanhando de torcedores e sendo ameaçado de "demissão" pelo próprio clube, que deveria ser o primeiro a protegê-lo; Estádios às moscas, com públicos ridiculamente pequenos dois ou três dias depois da decisão da Copa. A ressaca nem havia passado ainda e o futebol lixo já estava sendo empurrado goela abaixo;
- As brigas de sempre entre torcedores, quase sempre os tais "organizados". Emboscada na porta de estádio, cadeiras quebradas, alpinismo pra pular de um setor a outro de estádio da Copa, etc, etc, etc;
- Jogos espetacularmente ruins, falta de gols, de passes certos, de futebol dinâmico, de campo encurtado, tudo isso junto com as velhas retrancas, o modus operandi consagrado dos últimos anos: a busca pelo resultado, não importa como;
- Um calendário sendo anunciado para o ano que vem sem a pré-temporada corretamente exigida pelos jogadores, um calendário que segue matando tanto clubes grandes quanto pequenos;
- Os dirigentes da CBF tirando olimpicamente o corpo fora ao colocar Dunga de volta no comando técnico da seleção. Mais um que aceita ser a cara da derrota, em caso de derrotas;
- Clubes tradicionais do nosso futebol demitindo treinadores após uma ou duas derrotas, depois de tê-los deixado trabalhando durante toda a pausa para a Copa do Mundo. E o pior, voltando até duas décadas no tempo para trazer os respectivos substitutos (19 anos atrás, repito, DEZENOVE anos atrás, São Paulo, Flamengo, Grêmio, Internacional e Atlético Mineiro tinham os mesmos técnicos que têm hoje);
- Movimento da "Bancada da Bola" no Congresso Nacional para aprovar uma lei de responsabilidade fiscal que parcelaria as históricas e vultuosas dívidas dos clubes de futebol para com a sociedade que paga seus impostos (sem, claro, as devidas contra partidas). Um show de dirigentes fazendo biquinho e tentando convencer os torcedores de que os clubes são pobre coitados e, se não tiverem a mão benevolente do governo, não poderão fomentar a lúdica prática esportiva a partir do ano que vem;
E, passados 31 dias, chegamos ao 13 de agosto. Um mês depois da Copa.
Pela TV a cabo, poucos viram ou mesmo ficaram sabendo do título inédito do San Lorenzo na Copa Libertadores da América.
Veja bem. Na Europa, dia de final de Champions League é o dia do "para tudo". Não importa de que país sejam os times finalistas. O jogo será transmitido pela TV que mais pagou, de preferência in loco, pelo melhor narrador, comentarista e repórter possíveis, com interesse total porque, afinal, estarão em campo os melhores do continente. Os times que chegaram onde todos os outros queriam chegar.
O país não conhece o San Lorenzo. Alguns sabem apenas que é o “time do Papa”. Pois é. A maioria tampouco conhecia Kroos, Khedira e aquele loirinho simpático que nadava no mar com os locais lá na Bahia. A ignorância é uma grande amiga da arrogância.
No dia da final da Libertadores, um mês depois da Copa, o que vimos foi a Copa do Brasil. Um torneio bacana. E que, como o mata-mata faz muita falta, tinha tudo para ser o mais bacana do país. Só que aí a CBF inventou uma regra: quem é eliminado da Copa do Brasil pode acabar tendo como “prêmio” a disputa da Copa Sul-Americana.
Como no futebol se classificar para algo virou mais importante do que ganhar algo, era óbvio que muitos times iriam preferir buscar a vaga na Libertadores seguinte via Sul-Americana, um torneio de menor nível técnico. No ano passado, pela primeira vez na história da Copa do Brasil, sete times de primeira divisão foram eliminados antes das oitavas de final do torneio. Coincidência?
A Ponte Preta mandou reservas e foi eliminada da Copa do Brasil pelo Nacional do Amazonas, então na quarta divisão. "Caiu" para a Sul-Americana. Chegou à final e quase conquistou o primeiro título internacional de sua história.
O assunto das possíveis "marmeladas" não ganhou corpo, porque os times grandões do país não haviam sido eliminados de forma esquisita e precoce.
Só que eis que no 13 de agosto de 2014, um mês depois da final da Copa, o Fluminense (levando de 5 no Maracanã), o São Paulo (de 3 no Morumbi) e o Internacional caíram na Copa do Brasil para times da segunda divisão. O prêmio? A Sul-Americana (o Flu ainda não está garantido, depende de o Santos não dar vexame igual).
No futebol brasileiro, é simplesmente difícil acreditar na idoneidade de todos os atores ao mesmo tempo. Muito difícil. No país em que os pontos corridos foram notabilizados pelas entregas nas rodadas finais, para que rivais locais fossem prejudicados, a CBF conseguiu criar uma situação de “o melhor é perder” até mesmo em um torneio de mata-mata.
Mas o fato é que a quarta-feira à noite, um mês depois da Copa que deveria ter mudado nossos rumos, no mesmo dia em que o campeão continental foi definido, o único assunto que se falava era a “esquisitice” de eliminações de times grandes e os bizarros regulamentos da CBF.
Tem gente que também acredita que os 7 a 1 foram só um acidente.
Eu simplesmente não acredito mais em nada.
Para não dizer que tudo foi catástrofe neste mês que se passou, alguns poucos pontos positivos podem ser destacados. Neymar deu uma boa entrevista, admitindo que, na base, "ensina-se futebol de forma errada”. Nomes importantes e com opiniões fortes e duras, que destoam da maioria, como Leonardo, foram ouvidos. A TV Globo, dona do produto, está se mexendo de alguma forma para cobrar dos clubes mais qualidade.
O Bom Senso FC tem conseguido se mexer e foi fundamental, com a ajuda de alguns parlamentares, para que a lei que tanto querem os dirigentes não fosse aprovada.
O futebol brasileiro agoniza na UTI. As esperanças são poucas. Quem tem o remédio não pode nem entrar no hospital. E, ao que parece, os que têm a chave são fãs da eutanásia.
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