terça-feira, 16 de setembro de 2014

Na grande São Paulo governo permite desmate e ocupação de mananciais.E no DF o PT faz o mesmo!




Ocupações irregulares, desmatamento e agropecuária agravam os minguados mananciais da Grande São Paulo e a deixam sem reservas para enfrentar estiagens, que podem se agravar se o clima continuar mudando, como preveem modelos de computador

Bares e quitandas –além de pequenas montanhas de lixo– brotaram rapidamente no início 2014 numa área de preservação ambiental próxima à represa Guarapiranga, zona sul de São Paulo. Estão ali para atender a milhares de pessoas que ocupam a Nova Palestina, invasão patrocinada pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) em novembro de 2013 para que o terreno fosse destinado a moradias populares.

É um dos muitos exemplos de áreas às margens de rios e represas que deveriam ser preservadas para prevenir a falta de água, mas acabam, por vezes com ajuda do poder público, degradadas devido ao crescimento desordenado.

A Nova Palestina tomou um pedaço da área total de preservação de 1,1 milhão de m². No local há mais de 40 nascentes que abastecem a Guarapiranga, a menos de 1 km dali. Por ser área de proteção de mananciais, o terreno estava demarcado para se tornar parque municipal.
Lalo de Almeida/Folhapress

Ocupação Nova Palestina, do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, erguido em área próxima à represa Guarapiranga, na zona sul de São Paulo


A ocupação Nova Palestina, erguida por sem-teto perto da Guarapiranga, em área de mananciais onde existem mais de 40 nascentes.

No final de março de 2014, do alto de um carro de som numa manifestação do MTST, o prefeito Fernando Haddad (PT) anunciou que poderia revogar o decreto que transformava a área em parque, desde que com o novo Plano Diretor fosse aprovada a figura jurídica das Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis). Haddad conseguiu o apoio e a pressão do MTST para aprovar seu plano diretor. O movimento conseguiu que parte do futuro parque fosse transformada em Zeis.

O MTST está contratando uma empresa especializada, a Gesto Arquitetura, para urbanizar uma fatia já desmatada de 300 mil m², próxima à Guarapiranga. Planeja construir ali moradias para 4.000 famílias, com recursos do programa federal Minha Casa, Minha Vida. Os outros 800 mil m² seriam preservados.

Questionado sobre o efeito devastador das obras e de mais 4.000 famílias sobre a área de manancial, Newton Massafumi, da Gesto Arquitetura, diz que, “por ser área de preservação, todos os cuidados serão tomados”. Afirma, no entanto, que não há como prever ou controlar o que pode acontecer à vizinhança quando milhares de novos moradores, com seus automóveis e demandas –novas vias, linhas de ônibus, comércio, escolas etc.–, se estabelecerem por ali.

“Infelizmente, o Brasil real precisa de moradias, e ocupa o que é possível. Aquele endereço atende às condições econômicas e sociais daqueles que o ocuparam. Não existe alternativa”, afirma Massafumi.
O problema é que a população toda, e não só o grupo liderado pelo MTST, precisa de água, cada vez mais água.

O PASTO E A FLORESTA

No extremo oposto da Grande São Paulo, a fazenda Cravorana, em Piracaia (a 80 km da capital paulista), é uma das muitas que cercam a represa Jacareí-Jaguari. O gado pisoteia as encostas e simboliza a destruição das matas, o outro lado da mais importante crise hídrica dos últimos cem anos em São Paulo. Mas nesta propriedade as coisas começaram a mudar. 

Em vez de apenas bois, esse pedaço do manancial de 1.230 km² (equivalente a 80% da área da cidade de São Paulo) entre as cidades de Bragança Paulista, Vargem, Piracaia e Joanópolis volta a abrigar árvores para que a floresta produza água.

O reservatório, que opera desde 1982, é o maior do sistema Cantareira, que tem mais quatro represas. Só dele saíam 67% da água usada pela Sabesp (companhia estatal paulista de água e saneamento) para abastecer quase 9 milhões de pessoas na Grande São Paulo.
O Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ), sediado em Nazaré Paulista (SP), estuda há mais de 30 anos o ambiente natural de regiões como a do Cantareira. De acordo com levantamento feito pela ONG, 49% do entorno da represa foram ocupados por pastos. Outros 38% ainda são florestados, e em 8% a mata está em recomposição. Os restantes 5% estão tomados por eucaliptos.

Se a mata ainda estivesse lá, é possível que a situação do Cantareira não se tivesse agravado tanto como nos últimos dois anos. O solo florestado funciona como uma esponja e favorece a lenta infiltração da água para o lençol freático, que ajuda a encher as represas.
Sem a cobertura das árvores, a água escorre mais rapidamente pelo terreno –causando erosão– e provoca enchentes mais à frente.

A ocupação do solo em áreas de mananciais é um grave problema a ser enfrentado nas próximas décadas. Mais que obras de engenharia para buscar água cada vez mais longe de onde é consumida, a recuperação ambiental, a conservação dos mananciais e a redução do desperdício formam o tripé capaz de impedir que a água acabe em áreas muito populosas.
A situação de estresse hídrico que a Grande São Paulo vive é dramática. Os sistemas de armazenamento da Sabesp produzem cerca de 6 milhões de metros cúbicos de água por dia, mas quase metade disso vem de bacias hidrográficas que ficam fora da zona metropolitana. E o cenário continuará a se agravar com o constante crescimento da metrópole.

O descaso com o serviço ecológico prestado pelas matas levou à situação que também inferniza o cotidiano de mais de 5 milhões de pessoas nas regiões de Campinas e de Piracicaba, que dependem da mesma bacia hidrográfica –conhecida como PCJ (rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí)– que alimenta o sistema Cantareira.

A história da fazenda Cravorana ilustra bem a situação do Cantareira e o que pode ser feito para remediá-la. Há quase um ano, administradores da propriedade e pesquisadores do IPÊ começaram a “semeadura da água”. O projeto tem colhido bons resultados e será reproduzido em várias áreas do Cantareira.
Pequenas áreas de pastos (piquetes) mais ou menos regulares foram demarcadas e cercadas em um dos morros da fazenda, que tem pastagens degradadas, com o capim já rareado e o solo bastante compactado pelo pisoteio do gado. As chuvas lavavam tudo, deixando erosão e prejuízos em sua esteira.

Os animais agora pastam por alguns dias em um determinado piquete. Depois passam a pastar em outro. Na parcela que ficou descansando uns dias (o tempo varia com o clima e o ritmo do rebanho), o capim está visivelmente mais verde, e o solo, menos endurecido. Quando chove, a água se infiltra, e só uma pequena parte escorre barranco abaixo. A erosão retrocedeu quase inteiramente.

“Estamos fazendo projetos semelhantes em várias propriedades da região. Nossa intenção, além de deixar que mais água se infiltre no solo, é recuperar matas ao lado de nascentes e de riachos”, afirma Alexandre Uezu, biólogo da ONG IPÊ e coordenador do projeto, que já tem um ano.

Ele diz que, se todas as encostas do sistema Cantareira estivessem preservadas, a crise hídrica atual seria menos grave, ou nem existiria. “Com os lençóis freáticos armazenando água sempre, as represas seriam abastecidas de forma mais perene, e não só por meio de enxurradas”, explica.

A secretaria estadual do Meio Ambiente aprovou em 2009 projetos piloto de pagamento por serviços ambientais a 13 propriedades nos municípios de Joanópolis e Nazaré Paulista, como remuneração pela produção de água graças à manutenção de áreas florestadas. Sua escala reduzida não representa ainda uma contribuição de peso para as dificuldades da bacia PCJ, mas se trata de um passo modesto na direção correta.

No âmbito federal, a Agência Nacional de Águas (ANA) criou o Programa Produtor de Água (PPA), que destinará R$ 5,6 milhões para financiar projetos de proteção de mananciais e para pagamento de serviços ambientais.

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