terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Levy terá de desfazer a maquiagem na conta do setor elétrico



Leandra Peres
Valor Econômico



O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, receberu uma herança inesperada: o ex-secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, que havia prometido repasses ao setor elétrico em dezembro, “pedalou” R$ 1,25 bilhão para janeiro e transferiu ao caixa que será gerenciado pelo novo ministro um problema que pode somar R$ 6 bilhões.



É que, além da manobra fiscal, o ministro Levy terá que arrumar recursos para cobrir o déficit de 2014 da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), fundo setorial que financia a redução nas tarifas de energia.



A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) já trabalha com uma estimativa de um saldo negativo de R$ 4,5 bilhões. A maior parte dessa despesa são subsídios devidos pelo Tesouro Nacional relativos a despesas ocorridas ao longo de 2014, mas que ainda não foram contabilizados nas estatísticas do setor




Esse balanço se refere apenas a gastos do ano passado que não foram cobertos pelo Tesouro. Não inclui, portanto, as despesas de 2015, que serão novamente elevadas por causa da baixa quantidade de chuvas. Também estão fora os pagamentos da energia gerada pelas termelétricas em novembro e dezembro de 2014, um gasto estimado em R$ 3 bilhões que vence em janeiro e fevereiro e para o qual ainda não há solução.



AUMENTAR TARIFAS?
O ministro Levy tem dito que não pretende usar recursos do Tesouro Nacional para socorrer o setor elétrico. Segundo declarações, o ajuste tem que ser feito por meio de repasses à tarifa de energia elétrica. Durante a transição da equipe econômica, Levy foi surpreendido pelo tamanho do problema acumulado nas contas do setor elétrico. A descrição feita ao Valor é de imenso “incômodo”.



O balanço total das “pedaladas” de 2014 será muito superior ao que ocorreu no setor elétrico. Mas esse número só será conhecido nas próximas semanas, à medida que o sistema de controle de gastos do governo federal registre todas as operações.



O que chama a atenção na operação feita na CDE é que o ex-secretário Arno Augustin havia se comprometido publicamente a transferir os recursos em 2014. Na última entrevista coletiva que deu à imprensa, ele disse que o Tesouro pagaria R$ 1,5 bilhão ao setor elétrico em dezembro.




NO FERIADO BANCÁRIO
Tecnicamente, o pagamento foi feito no mês passado. Mas o Tesouro se aproveitou dos feriados bancários para que o desembolso dos recursos só ocorresse em janeiro. A ordem bancária para pagamento do fundo CDE foi dada no dia 31 de dezembro às 9 horas. Como não há expediente bancário no último dia útil do ano, o saque dos recursos só pode ser feito na sexta-feira. Com isso, o governo engordou o resultado de 2014, ao mesmo tempo em que aumentou a pressão sobre o caixa deste ano.


A manobra não é restrita ao setor elétrico. O site Contas Abertas, ONG que monitora gastos públicos, estimou em até R$ 3,1 bilhões os gastos de investimentos de 2014 que foram transferidos para 2015. A ordem bancária à CDE também foi localizada pela entidade a pedido do Valor.



O levantamento do Contas Abertas mostra que o pagamento de investimentos somente no último dia do ano totalizou R$ 2 bilhões. Nos dias 29 e 30 de dezembro, o Tesouro emitiu ordens bancárias para pagar investimentos no valor de R$ 1 bilhão.


Nas demais despesas do governo, o Contas Abertas mostra um aumento de R$ 3,2 bilhões nos restos a pagar processados. No jargão orçamentário, essas são despesas já reconhecidas pelo governo e que estão apenas aguardando o pagamento. Em 2014, esses gastos totalizaram R$ 33,6 bilhões. Na virada para 2015, somaram R$ 36,8 bilhões.

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