sábado, 29 de novembro de 2014
Peixinhos, vasinhos, flechinhas e ...pessoinhas!!
[EcoDebate] A esta altura todos sabem que as propinas pagas a diretores da Petrobrás, políticos, funcionários públicos, secretários de partido e tantos outros na cadeia de corruptores e corrompidos, é apenas a ponta do iceberg de anos de prática tupiniquim corriqueira do “toma lá, da cá”, envolvendo obras públicas e grandes empresas.
São bilhões desviados dos cofres públicos que poderiam estar atendendo a necessidades básicas do povo brasileiro na área de educação, saúde, saneamento, etc. No entanto, gostaria de levantar outro aspecto desta prática criminal, que é o fato da mesma garantir que as obras sejam executadas a qualquer custo, incluindo o ambiental.
Com tanta gente envolvida no esquema corrupto, com certeza não é a constatação do impacto ambiental de um projeto que vai impedir de ser levado adiante. Temos assistido isto ao longo dos anos, onde o discurso da proteção ambiental, da sustentabilidade, da ecologia, passa pelas bocas dos nossos governantes, sem a menor intenção de adotá-lo. A constante pressão sobre os órgãos reguladores e o desmantelamento de seus quadros técnicos é o que se vê em todos o níveis do poder (IBRAM??).
A Resolução Conama Nº 001, de 23 de janeiro de 1986, estabelece as definições, as responsabilidades, os critérios básicos e as diretrizes gerais para uso e implementação da Avaliação de Impacto Ambiental como um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente.
O seu Artigo 2º, esclarece que qualquer atividade modificadora do meio ambiente dependerá da elaboração de estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto ambiental – RIMA, a serem submetidos à aprovação do órgão estadual competente, e do IBAMA, em caráter supletivo, para obter o licenciamento.
Isto inclui projetos para extração de combustível fóssil, de minérios, grandes obras de mobilidade, distritos industriais, exploração de madeira, entre outras, incluindo obras hidráulicas para exploração de recursos hídricos, tais como: barragem para fins hidrelétricos, acima de 10MW. É este item que eu gostaria de analisar, diante da existência de uma política governamental baseada na “ditadura das hidrelétricas”, que vem desde os governos militares, mesmo havendo um horizonte pouco favorável para esta forma de energia que depende da água.
Participando de um seminário onde se discutia diferentes formas de geração de energia e seus impactos, escutei de um interlocutor que defendia a construção de usinas hidrelétricas algo como — “sim, temos problemas com peixinhos, flechinhas e vasinhos, mas não podemos de deixar de explorar os rios para gerar energia”, se referindo aos impactos sobre a biodiversidade e a violação dos direitos indígenas. O tom pejorativo não agradou muitos da plateia, mas creio que isto expressa a visão puramente “engenheira-econômica” deste processo.
Pois bem, agora temos também as “pessoazinhas” para se preocupar, desde que se desenvolveu o AEA (Avaliação de Equidade Ambiental) que cria mecanismos reais para ouvir a população, como manda a legislação vigente. Neste método, a região é estudada a partir do ponto de vista de quem vive no local e são essas pessoas que definem que possibilidades devem orientar a ação do Estado para políticas públicas em seus territórios.
A constante afirmação deste ser o modelo de menor custo para geração de energia elétrica quando se compara somente em kW/h, deve ser revisto diante dos fatos socioambientais que se agravam a cada ano.
Em fato, o que se deve fazer é aumentar os investimentos em eficiência energética, começando pela correção de perdas no sistema de transmissão e distribuição que chega a quase 20%, além do estímulo a construção de edificações eco-eficientes menos devoradoras de energia.
Não se pode também mais admitir nossos tímidos avanços no uso da energia eólica, solar, biomassa, biogás, maremotriz, num país com um potencial gigantesco como o Brasil. Se um controle rígido sobre os projetos faraônicos de hidrelétricas fosse aplicado, com certeza haveria recursos financeiros de sobra para investimentos nestas formas de energia de menor impacto.
Vimos recentemente que a construção de usinas hidrelétricas, como a polêmica Belo Monte, foi adiante, apesar de várias posições contrárias, não somente dos ambientalistas, com também da comunidade científica e intelectual do país. A pergunta pertinente no momento é: Qual será o valor das propinas e do superfaturamento quando Belo Monte for investigada?
Lembrando que o Consórcio Construtor de Belo Monte (CCBM) envolve as empreiteiras Andrade Gutierrez, Odebrecht e Camargo Corrêa, todas envolvidas no caso da Petrobrás!
Neste cenário podemos também incluir as Usinas de Jirau e Santo Antônio, com obras ainda em andamento, no Rio Madeira, principal afluente do Rio Amazonas, que passaram por cima de qualquer avaliação socioambiental mais séria. Para o Prof. Edgardo Latrubesse, do Departamento de Geografia e Meio Ambiente, da Universidade do Texas, nos Estados Unidos, considerado um dos maiores especialistas em bacia Amazônica do mundo, a construção da usina de Jirau teve vários dos seus impactos ignorados.
Estes vão desde a inundação de reservas de ouro aluvial, passando pela perda da maior jazida de fósseis pleistocênicos da Amazônia até impactos hidrogeomorfológicas, que alteram a alimentação de nutrientes levadas pelo Rio Madeira até o Rio Amazonas e mudança nos regimes pluviais da região. Este pode ser um o maior desastre ambiental da Amazônia, alerta o pesquisador. Muito especialistas já haviam colocado a culpa nas barragens pela enchente histórica do primeiro semestre de 2014, elevando o nível do rio Madeira em 19 metros e desabrigando mais de 12 mil pessoas, só no Brasil.
Voltamos a mesma pergunta: Quanto de dinheiro desviado envolveria as empreiteiras nestas obras, orçadas inicialmente em cerca de 14 bilhões de dólares? Lembrando que a Usina de Jirau é a maior obra federal do Pacote de Aceleração de Crescimento (PAC). Com a palavra a Polícia Federal e o Ministério Público. Sugestão de nome para a operação: Abrindo as Comportas!
Prof. Dr. Eloy F. Casagrande Jr, Coordenador do Escritório Verde da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR)
Publicado no Portal EcoDebate, 27/11/2014
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