quarta-feira, 5 de novembro de 2014

PMDB: um obstáculo aos projetos ideológicos do PT

05/11/2014


Eduardo Cunha, a pedra no sapato bolivariano do PT. Fonte: El País


Tem certas coisas que só falamos baixinho por aí, com alguma vergonha. Uma delas é que o PMDB vai, pelo incrível que pareça, salvar nossa democracia e impedir que o Brasil seja a próxima Venezuela. Já disse isso várias vezes em palestras e até em artigos, mas se perguntarem, eu nego!


Brincadeiras à parte, o PMDB se tornou um partido do “centrão”, mais fisiológico do que qualquer coisa. Um saco de gatos. Tem de tudo lá. Mas justamente por isso, não lhe interessa virarmos uma Argentina ou Venezuela, o que mataria a galinha dos ovos de ouro.

O PT sonha com a hegemonia, com a instauração do partido único. Quer ser como o PRI mexicano no mínimo, ou de preferência como os chavistas da Venezuela. O problema é que sua bancada não dá conta do recado, e ainda saiu reduzida nessas eleições, com a perda de 18 deputados.

A solução encontrada no passado foi comprar todos que estavam à venda (e no Brasil tem muita gente à venda). O mensalão foi isso, o Petrolão também. Com a crise econômica que vem aí, vai faltar verba. Além disso, os escândalos ainda terão desdobramentos, há as delações premiadas, e todos estão com mais receio de punições.

Ou seja, a vida promete não ser nada fácil para o PT nos próximos anos. Os anseios autoritários encontrarão barreiras firmes à frente. A começar pela presidência da Câmara, que deverá ir para Eduardo Cunha, desafeto do partido e tido como “conservador” para os padrões nacionais.

Em entrevista ao El País, Cunha disse que o PMDB não fez um “acordo eterno” com o PT, e que a Câmara não quer o partido na presidência agora, pois sua agenda é muito ideológica:

P: Você fala sobre essa questão ideológica do PT. A que se refere?
R: Aos conselhos populares, à regulação de mídia… Pautas que são ideológicas. Estando na presidência, o poder de colocá-las em discussão será maior.
P: Mas a gente vê que o Congresso está mais conservador. Não há um cenário de mais resistência a pautas mais progressistas?
R: Sem dúvida, mas não porque o Congresso está mais conservador. Mas porque o Congresso está mais bem representado do que é a sociedade. A sociedade é conservadora. O Congresso representa a sociedade. Hoje ele está mais próximo da sociedade do que esteve antes.

É exatamente por esse motivo que veremos cada vez mais colunista e “formador de opinião” espalhando por aí que o PMDB é o grande mal do país, e que precisamos superar esse entrave parlamentar para que as reformas progressistas possam deslanchar.

A “democracia direta” é o sonho chavista do PT, para poder manipular os “movimentos sociais” e desviar dos obstáculos da democracia representativa. Negociar dá trabalho, contemporizar idem, fechar acordos com base em programas muito mais. O PT detesta tudo isso. Ele detesta, no fundo, a democracia, usada apenas como “farsa” para a chegada ao poder.

O PMDB tem sido um aliado importante do PT, mas está cada vez mais rachado. Até mesmo Sarney votou em Aécio Neves, e depois que isso veio à tona num vídeo, justificou-se que foi pela gratidão ao seu avô Tancredo. Afinal, graças ao mineiro ele chegou à presidência em 1985.

O partido, naquela época, contava com figuras como Ulysses Guimarães, o D. Quixote da nossa democracia, aquele que fez da luta pela redemocratização sua cruzada na vida. Muitos condenavam o antigo MDB na ocasião, por ser “oposição” ao regime militar, o que daria um verniz de legitimidade aos militares. Ulysses rechaçava com veemência a alternativa da luta clandestina, pois só acreditava em solução pelas vias legais, de dentro do sistema.

Assumindo que hoje estamos numa espécie de regime autoritário e opressor, até golpista, só que do PT, então o PMDB poderá ser o fiel da balança novamente, aquele que lutará de dentro do sistema para preservar nossas instituições democráticas. Com todos os seus defeitos, ainda é a principal arma que temos contra o bolivarianismo, que deverá ser derrotado pelas vias legais, fortalecendo-se o Congresso, e não o contrário.

Que o PMDB honre o legado democrático de Ulysses Guimarães!


Rodrigo Constantino

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