sábado, 12 de julho de 2014

Ganeses dizem que vão para Caxias por emprego e rede de assistência


Em 10 dias, 213 imigrantes africanos pediram refúgio na cidade gaúcha.
Prefeitura argumenta que não há mais postos de trabalho para estrangeiros.



 Do G1 RS


Ganeses começaram a chegar em Caxias do Sul na última quarta (2) em busca de emprego (Foto: Reprodução/RBSTV)Ganeses começaram a chegar a Caxias do Sul
na última semana 
Promessas de emprego, facilidades para conseguir o protocolo de refugiado e uma rede de assistência aos imigrantes. Segundo autoridades e entidades ligadas ao tema, esses são os principais atrativos de Caxias do Sul para os estrangeiros que desembarcam na cidade em busca de uma nova vida no Brasil. Após haitianos e senegaleses, nos últimos dias o município da serra gaúcha vem recebendo uma nova onda migratória, desta vez de ganeses.

Segundo a delegacia da Polícia Federal (PF) de Caxias do Sul, em 10 dias foram recebidos 213 pedidos de refúgio no país para cidadãos de Gana. Aproveitando o apelo da Copa do Mundo, os estrangeiros entraram no país com vistos de turista, válidos por 90 dias e concedidos pela embaixada brasileira em Acra, capital de Gana. Com o protocolo de asilo, eles podem permanecer legalmente no país até que o pedido seja analisado pelo Comitê Nacional para Refugiados (Conare), vinculado ao Ministério da Justiça.

Segundo o Centro de Assistência ao Migrante na cidade, a maioria dos estrangeiros alega estar pedindo refúgio no Brasil por conflitos religiosos, étnicos e tribais em seus países. O vice-ministro de Informação de Gana, Felix Kwakye Ofosu, disse a uma rádio local do país africano que esses pedidos têm “base completamente falsa”, segundo informa a agência AFP.


Segundo polo metalmecânico do Brasil, segundo a prefeitura, Caxias do Sul lidera as cidades gaúchas que mais têm recebido estrangeiros, seguida por Passo Fundo, no norte do estado, e Santa Cruz do Sul, no Vale do Rio Pardo. Em 2011, antes do início da movimentação de imigrantes, a PF registrou três pedidos de refúgio durante todo o ano. Em 2012, esse número saltou para 127, aumentou para 293 em 2013 e agora, nos primeiros sete meses de 2014, já passa de 600. 


Na quarta-feira (9), foram 65 pedidos.


Com o segundo maior PIB do estado, a cidade industrial de 465 mil habitantes, distante cerca de 120 quilômetros de Porto Alegre, recebeu um contingente de cerca de 3 mil estrangeiros nos últimos anos, a maioria oriundos do Haiti e do Senegal. A prefeitura, no entanto, argumenta que não há mais postos de trabalho para os estrangeiros nem estrutura de assistência social para os imigrantes.
“Em um primeiro momento havia oferta de emprego na cidade que acolhia esses imigrantes, mas depois esse mercado saturou. Se você caminha pelas ruas do Centro de Caxias hoje, vai encontrar muitos deles trabalhando como ambulantes”, analisa o delegado da PF de Caxias, Noerci da Silva Melo.


A delegacia de Caxias do Sul teve de buscar auxílio junto à Superintendência da PF, em Porto Alegre, pedindo mais funcionários e equipamentos para atender a demanda cada vez maior no protocolo de registros. Segundo Noerci, enquanto o número de haitianos estabilizou, o de senegaleses, depois de um ano e meio da chegada dos primeiros cidadãos, segue aumentando significativamente. 


E agora há os ganeses.


A rapidez na emissão do protocolo de refúgio em Caxias do Sul estava atraindo imigrantes de vários estados do país, como Santa Catarina, São Paulo e Minas Gerais. Muitos vinham apenas para buscar o documento, sem interesse em permanecer na cidade, diz o delegado Noerci. Mas com o aumento da demanda registrada nos últimos dias, a PF passou a limitar o atendimento de imigrantes a 20 pedidos por dia a partir desta sexta (11).

Ganeses dizem que são perseguidos no país africano
 
O número de atendimentos a estrangeiros foi ainda maior no Centro de Assistência ao Migrante (CAM), ligado à congregação das Irmãs Scalabrinianas, da Igreja Católica. No mesmo período de 10 dias, 241 pessoas buscaram auxílio lá. Só na quinta-feira (10) à tarde, o local recebeu 33 ganeses. A irmã Maria do Carmo Gonçalves, coordenadora do centro, conta que a maioria dos estrangeiros alega estar pedindo refúgio no Brasil por conflitos religiosos, étnicos e tribais em seus países.



“Temos ouvido muitas histórias de episódios violentos que eles relatam. Mas, além disso, há também a motivação econômica e a perspectiva de vida que eles buscam aqui. Eles querem trabalhar. A região tem tudo para potencializar essas pessoas. Eles vêm para cá cheios de saúde, com documentos em dia e têm muita esperança”, conta a irmã, acrescentando que muitos pensam em trazer famílias após se estabelecerem.


Imigrantes ganeses buscam emprego em Caxias do Sul, na serra gaúcha (Foto: Reprodução/RBS TV)Mais de 200 ganeses pediram refúgio em Caxias nos últimos 10 dias 
Para a coordenadora do CAM, que já acompanhava a situação de outros grupos de imigrantes, Caxias do Sul oferece vários atrativos aos estrangeiros, apesar de ser uma cidade do interior. “Há a ideia de que aqui tem trabalho. Além disso, Caxias é considerada pelo próprio IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] como uma metrópole funcional. São oferecidos serviços aqui que são oferecidos em capitais. Tudo isso torna a cidade atrativa”, analisa.


Maria do Carmo avalia também que há diferenças entre a chegada dos ganeses agora e dos senegaleses há quase dois anos. Segundo ela, os senegaleses chegavam em grupos e já se conheciam. No primeiro ano, foi organizado um espaço de acolhimento para recebê-los, mas depois houve acomodação natural da comunidade, conforme se integraram à cidade. Atualmente, a Associação de Senegaleses mantém uma casa para receber os conterrâneos recém-chegados.


Os ganeses, no entanto, relataram que não se conhecem. Cada um conta ter chegado por conta própria à Serra. “A gente pergunta se eles tiveram ajuda ou algo do gênero, como chegaram a Caxias, mas ainda não sabemos de nada. Há quem diga que encontrou a cidade no mapa e resolveu vir para cá”, relata a coordenadora do CAM.


O grande contingente de ganeses em um curto espaço de tempo também chama a atenção da PF. Existe a suspeita sobre a atuação de "coiotes", uma rede ilegal que cobra para auxiliar os estrangeiros. Pela apuração da própria polícia, muitos dos imigrantes que chegam já estavam em outras partes do Brasil como São Paulo, Goiás e Santa Catarina.


“Pelo que acompanhamos, entre os haitianos e senegaleses, há pessoas que estão há mais tempo no país e auxiliam os que estão chegando. Mas estamos investigando a situação e como está ocorrendo”, afirma o delegado Noecir.


Grupo de ganeses preenche formulários na Câmara de Vereadores de Caxias do Sul para encaminhar solicitação de refúgio junto à Polícia Federal (Foto: Rafael Lopes/Câmara de Vereadores Caxias do Sul )Grupo de ganeses preenche formulários na Câmara de Vereadores de Caxias 
Comunidade ajuda estrangeiros com doações

 
Para descentralizar o atendimento de assistência social aos estrangeiros, a Comissão de Direitos Humanos (CDH) da Câmara de Vereadores de Caxias do Sul passou a auxiliar no preenchimento dos requerimentos a serem encaminhados à polícia. 



Os atendimentos começam por volta das 9h e seguem por todo o dia até as 19h.


O desembarque de muitos imigrantes que vieram apenas com a roupa do corpo também mobilizou uma rede de assistência, sustentada quase integralmente pela comunidade de Caxias. Os estrangeiros que chegam desde a última semana e que ficam em Caxias estão sendo alojados em uma quadra de esportes do Seminário Nossa Senhora Aparecida. Colchões e cobertores foram todos conseguidos por doações feitas através da Igreja Católica.


A alimentação dos estrangeiros está sendo mantida por doações de alimentos não perecíveis da prefeitura municipal e da própria comunidade caxiense. Voluntários da Comissão dos Direitos Humanos também estão ajudado com traduções, para auxiliar na comunicação dos ganeses que só falam inglês, a língua oficial do país africano.


Mas nem todos pensam em ficar em Caxias do Sul. Muitos deles só passaram pela cidade para encaminhar a documentação e seguiram para outros municípios, onde já tinham promessas de emprego. Em contato com a PF de Criciúma, em Santa Catarina, o delegado Noecir conta que a cidade catarinense encaminhou 300 pedidos de refúgio para ganeses no último mês.


O Ministério da Justiça acompanha a invasão de ganeses a Caxias do Sul. Em nota emitida na quinta-feira (10), a pasta afirmou que enviará uma missão especial de elegibilidade à cidade para entrevistar os estrangeiros que solicitaram refúgio e encaminhar relatórios que possibilitem aos conselheiros do Conare tomar decisões sobre cada caso.


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