16/2/2014
Fernando Basto é o preferido da cúpula careca da política nacional
Novo topete de Renan chamou a atenção para o trabalho do médico
Zeca Ribeiro/03.02.2014/Câmara dos Deputados
Por uma dessas ironias supremas típicas das trajetórias, esse cirurgião plástico e capilar pernambucano simpático e falante de 56 anos, “apolítico consciente e feliz”, teve seu nome e bons resultados profissionais jogados aos holofotes após uma recaída em pecado público de um de seus clientes notórios: o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).
Para restaurar exatos 10.118 fios de cabelo divididos em 5.810 unidades foliculares em sua “ex-careca”, numa cirurgia delicada e artesanal de oito horas — e também numa demanda evidentemente particular —, Calheiros solicitou, no dia 18 de dezembro de 2013, o auxílio luxuoso de um avião da FAB (Força Aérea Brasileira) para ir até o Recife, onde Basto se formou, vive, dá consulta e opera seus pacientes.
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Pressionado pelos veículos de comunicação e a opinião pública, Calheiros devolveu os R$ 27.390,25 do custo do voo de ida e volta. Era uma reincidência: em julho de 2013, o presidente do Senado foi levado a devolver R$ 32 mil aos cofres da União por ter usado uma aeronave da FAB num deslocamento Maceió-Porto Seguro-Brasília para participar do casamento da filha de um colega de casa e de partido, o senador Eduardo Braga (PMDB-AM).
Revelados os 10.118 motivos da recaída aeronáutica de Calheiros, Bastos, que não tem nada com isso, virou alvo do interesse de veículos de comunicação e clientes na proporção da cabeleira impetuosa desabrochada da noite para o dia no outdoor informal do cocuruto presidencial do Senado.
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A mídia à Forrest Gump gerada pelo caso Calheiros ajudou a revelar para muitos que Basto faz a cabeça de boa parte dos políticos brasileiros há muito mais tempo do que se sabia.
A fama entre os figurões da República começou a brotar da raiz em 2007, com os bons resultados da intervenção no coco de um amigo do cirurgião: o ministro do Tribunal de Contas da União José Múcio Monteiro, quando ele era ainda ministro das Relações Institucionais no segundo mandato do ex-presidente Lula.
— O trabalho com Múcio foi realmente muito bem-sucedido. Questionado, ele, dono de uma vaidade saudável, fazia questão de explicar quem eu era, como trabalho e todos os detalhes.
Na onda da renovação do amigo, procuraram Basto, entre outros, o ex-ministro e homem forte do PT José Dirceu (3,5 mil unidades foliculares com 6.170 fios em 2008), o presidente da Câmara dos Deputados Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), Renan Calheiros e “vários outros que realmente não posso revelar porque não autorizam e me comprometi profissionalmente em manter sigilo”, explicou o cirurgião na entrevista ao R7 na última quinta-feira (13).
Um compromisso respeitado, mas aparentemente inútil diante de um estandarte crescente e inevitável: os cabelos que renascem com força em telhados políticos ilustres há muito notadamente não habitados pelos fios. O cantor e compositor Alceu Valença também fez restauração capilar com o cirurgião (“ele sempre teve muito cabelo dos lados, mas faltou no alto”, detalha o médico).
Formado em 1981 pela Faculdade de Ciências Médicas de Pernambuco, Basto entrou no mundo dos fios graças aos conselhos de Perseu Lemos, um dos precursores da cirurgia plástica no Nordeste, seu orientador na residência e de quem foi primeiro assistente por nove anos. Lemos morreu em outubro de 2013. O aluno explica:
— Ele foi um mestre supremo para mim. Era chamado de o Ivo Pitanguy do Nordeste. Sempre me dizia: “Na cirurgia plástica todo mundo faz mais ou menos a mesma coisa. Isso vale com mais força aqui no Nordeste. Então você precisa arrumar algo que o diferencie. Acho essa coisa da restauração capilar um bom caminho".
Basto ouviu o conselho do mestre e, após uma temporada de aprendizado em São Paulo, na clínica de um dos pioneiros da área, Munir Curi, mergulhou de cabeça na causa dos sem-pelos na cabeça.
A partir de 1993, quando reinava entre os transplantes capilares a aparência esquisita e fake dos “cabelos de boneca”, que rivalizava em rejeição e crítica estética com a robustez artificial das peruconas, ele começou a sacudir a restauração capilar no País com algumas descobertas.
Desenvolveu uma técnica própria, a Linha Anterior Irregular, que transformou sua clínica em referência e o levou para congressos no mundo inteiro. E passou a transplantar não fios, mas unidades foliculares com dois, três e, em casos raros, até quatro fios (saiba o que é unidade folicular, conheça as técnicas e o trabalho artesanal da cirurgia neste quadro).
Basto realiza de seis a oito cirurgias por semana. Elas são longas: cada uma consome entre cinco e oito horas. Em casos extremos, duram um pouco mais. Para ficar tanto tempo em ação, ele passou a combinar uma sedação, para o paciente dormir, com a anestesia local na cabeça do paciente. Diz ter sido o primeiro no Brasil a fazer isso:
— Dessa forma o paciente me permite aplicar muito mais cabelo — três, quatro, até cinco vezes mais — do que os colegas, inclusive os do eixo Rio-São Paulo, que não usam a sedação.
O paciente dorme. Às vezes acorda no meio, a gente muda o corpo de posição e, se for o caso, dá outra sedação. Isso faz com que se resolva numa única sessão muitos casos que exigiriam duas ou até três etapas.
O cirurgião capilar foge do assunto quando a conversa caminha para preços e custos. Limita-se a dizer que são valores “capazes de serem pagos pela classe média brasileira”. Fontes de jornais pernambucanos citadas pela repórter Cristina Tardáguila na revista Piauí dão conta de que cada uma custa entre R$ 8 mil e R$ 15 mil.
Em casos especiais, o cliente pode gastar um pouco mais.
Com o tempo tomado pelas longas cirurgias, Basto costuma telefonar, resolver pendências, conversar na internet e, dependendo do caso e da intimidade, até propor encontros pessoais para conversa entre dez da noite e uma ou duas da madrugada com muita naturalidade (o que, admita-se, facilitou os contatos noturnos com o repórter também tomado por impulsos e, às vezes, ataques de insônia).
Em suas raras horas de descanso, se diverte avaliando as carecas premiadas na tevê, sobretudo os canais povoados por autoridades como os das assembleias legislativas, Câmara, Senado e Justiça.
O cirurgião capilar da República admite que gostaria de restaurar a cabeleira de seu conterrâneo Eduardo Campos, ex-governador de Pernambuco e candidato à Presidência pelo PSB.
— Ele já até fez a consulta inicial, mas o nascimento de seu filho e a campanha se tornaram prioridades.
Considera que a careca petista do ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, poderia facilmente ser aplacada e voltar a ser uma laje com telhado fechado.
— Ele tem ótimos e grossos fios e unidades foliculares no entorno da nuca, de onde tiramos a matéria-prima para a restauração (leia quadro). Isso é fundamental para o sucesso.
Em relação a pouca telha tucana de José Serra, diz não ser possível concluir nada seguro a partir da visão da telinha. Precisaria examinar de perto o que sobrou no “pé de fé” do ex-ministro, ex-senador e ex-governador de São Paulo para atestar se o material pode ser eficiente para a restauração.
Considera também ser possível orientar José Dirceu mesmo com ele na penitenciária.
— Hoje, com a internet, muita gente manda foto, eu analiso e dou os conselhos. Basta que alguém de fora tire uma foto e eu envio as respostas.
No final da entrevista, o cirurgião enumera mais um paciente do qual ele pode revelar o nome com tranquilidade: o cidadão pernambucano Fernando Basto, médico cirurgião plástico e capilar, 56 anos.
Isso mesmo: Fernando Basto foi cliente da Clínica Fernando Basto.
Anos atrás, sua equipe tascou um chumação pretão bem lá no alto do telhadão...
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