10/02/2014
às 19:30 \ Direto ao Ponto
Ai
da PM se os ferimentos que resultaram na morte de Santiago Andrade
fossem causados por uma bala de borracha ou uma bomba de gás
lacrimogêneo. Antes que se identificasse o autor do disparo, todos os
integrantes da corporação, do comandante ao mais raso dos soldados,
estariam alinhados no paredón da imprensa, diante do pelotão de
fuzilamento formado por repórteres que enxergam em qualquer manifestação
de protesto um combate entre bandidos e mocinhos. Os bandidos usam
fardas, botas e capacetes.
Mocinhos são todos os outros, e como vítimas devem ser tratados.
Mesmo quando matam um cinegrafista de 49 anos que cobria para a Band mais um conflito urbano no Rio, comprova o noticiário dos jornais do domingo sobre Fábio Raposo, que se apresentou à polícia para confessar que participara do que ainda era uma tentativa de homicídio.
Nem precisava: as imagens no vídeo mostram Raposo entregando a um comparsa o rojão que logo explodiria na cabeça de Santiago Andrade. Ambos aparecem vestidos como black blocs. Ambos agiram como black blocs. Mas repórteres e redatores decidiram que o cúmplice confesso não deveria ser associado a essa tribo de selvagens sem causa, sem rosto e sem cérebro.
Aos 23 anos, com um prontuário de desordeiro vocacional, Fábio Raposo não estuda nem tem emprego. Como qualificá-lo? “Tatuador”, concordaram os dois maiores jornais paulistas, que se dispensaram de localizar um único e escasso cliente do artista. Antes que algum leitor perguntasse pelo inexistente local de trabalho, a Folha acrescentou o adjetivo: “Tatuador independente”. Toscas na forma, indigentes no conteúdo, as reportagens também escancaram a anemia criativa dos escalados para esganar os fatos.
No Estadão, por exemplo, foi indiciado não um black bloc, mas um “jovem”. Ou “rapaz”. Além de encampar as expressões usadas pelo concorrente, que transformam faixa etária em profissão, a Folha patenteou a criação de um ofício desconhecido fora do Brasil: “manifestante”.
Faltou explicar se Raposo, que mora sozinho num apartamento no Méier, paga o aluguel com o dinheiro das tatuagens ou com o que arrecada gritando palavras de ordem em algum canto do Rio.
Consumada a tragédia, os torturadores da verdade terão de caprichar nas acrobacias vocabulares para referir-se a Raposo. A morte de Santiago transformou o black bloc militante em cúmplice de um homicídio. Quem tentar absolvê-lo com substantivos malandros merece cadeia por excesso de cinismo.
Mocinhos são todos os outros, e como vítimas devem ser tratados.
Mesmo quando matam um cinegrafista de 49 anos que cobria para a Band mais um conflito urbano no Rio, comprova o noticiário dos jornais do domingo sobre Fábio Raposo, que se apresentou à polícia para confessar que participara do que ainda era uma tentativa de homicídio.
Nem precisava: as imagens no vídeo mostram Raposo entregando a um comparsa o rojão que logo explodiria na cabeça de Santiago Andrade. Ambos aparecem vestidos como black blocs. Ambos agiram como black blocs. Mas repórteres e redatores decidiram que o cúmplice confesso não deveria ser associado a essa tribo de selvagens sem causa, sem rosto e sem cérebro.
Aos 23 anos, com um prontuário de desordeiro vocacional, Fábio Raposo não estuda nem tem emprego. Como qualificá-lo? “Tatuador”, concordaram os dois maiores jornais paulistas, que se dispensaram de localizar um único e escasso cliente do artista. Antes que algum leitor perguntasse pelo inexistente local de trabalho, a Folha acrescentou o adjetivo: “Tatuador independente”. Toscas na forma, indigentes no conteúdo, as reportagens também escancaram a anemia criativa dos escalados para esganar os fatos.
No Estadão, por exemplo, foi indiciado não um black bloc, mas um “jovem”. Ou “rapaz”. Além de encampar as expressões usadas pelo concorrente, que transformam faixa etária em profissão, a Folha patenteou a criação de um ofício desconhecido fora do Brasil: “manifestante”.
Faltou explicar se Raposo, que mora sozinho num apartamento no Méier, paga o aluguel com o dinheiro das tatuagens ou com o que arrecada gritando palavras de ordem em algum canto do Rio.
Consumada a tragédia, os torturadores da verdade terão de caprichar nas acrobacias vocabulares para referir-se a Raposo. A morte de Santiago transformou o black bloc militante em cúmplice de um homicídio. Quem tentar absolvê-lo com substantivos malandros merece cadeia por excesso de cinismo.
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