Nunca
achei, e os leitores sabem disto, que a vitória ou a derrota da Seleção
Brasileira teria uma tradução imediata nas urnas. Tratei do assunto na
minha coluna na Folha na sexta-feira passada, intitulada “A derrota da
Seleção e a de Dilma”. “A derrota da Seleção e a de Dilma”. Escrevi então:
“A vigarice intelectual tenta transformar o tal ‘pessimismo com a Copa’ numa espécie de metáfora –ou metonímia– do suposto ‘pessimismo com o Brasil’. Também as críticas ao governo e o legítimo esforço para apeá-lo do poder segundo as regras do jogo seriam obra de pessoas de maus bofes, que saem por aí a espalhar o rancor e a amargura –coisa, enfim, de quem deveria deixar ‘estepaiz’, já que se mostra incapaz de amá-lo… Com todo o respeito, a tese de que o Brasil precisa perder a Copa para Dilma perder a eleição é só uma trapaça intelectual de quem quer que Dilma vença a eleição, ainda que o Brasil perca a Copa.”
O desastre
a que assistimos no campo, nesta terça, ele sim, é simbólico de certo
estado de coisas no Brasil. Reparem que foram muito poucas as críticas
contundentes ao desempenho pífio da Seleção Brasileira nos cinco jogos
anteriores. Aqui e ali se apontou o descompasso entre a realidade e os
fatos, mas nada com a dureza e com a clareza que a ruindade do time
estava a pedir. Por quê? Porque também o jornalismo — com raras exceções
— vivia e vive sob uma espécie de tutela, com receio de ser acusado de
falta de patriotismo.
O governo
federal decidiu, infelizmente, fazer politicagem com a Copa do Mundo. A
máquina publicitária oficial não teve pudor nem mesmo de pegar carona na
contusão de Neymar, tentando transformá-lo numa espécie de herói
nacional. Dilma Rousseff resolveu bater um papinho com Dilma Bolada no
Facebook, de sorte que não dava para saber se a Bolada era a Rousseff ou
a Rousseff, a Bolada. A presidente encontrou tempo para atacar os
“urubus do pessimismo”. Referia-se, em princípio, àqueles que previam
que o torneio seria um desastre organizacional, o que, é sabido, não
foi. Mas não só a eles: os tais “pessimistas” estariam interessados na
derrota do Brasil só para o PT perder as eleições…
Há, ainda,
uma fatia dos políticos brasileiros que está convicta de que pode
manipular a vontade popular a seu gosto. Sim, muitas críticas infundadas
foram feitas à realização da Copa no Brasil, mas é evidente que parte
delas procedia e procede — como procedentes são milhares de restrições
outras que se fazem ao governo de turno, o que é normal numa democracia.
A máquina
publicitária oficial, no entanto, incapaz de fazer a exploração rasteira
do torneio — como esquecer as vaias do Itaquerão? —, decidiu
“monitorar” às avessas o debate: tolhendo as críticas, intimidando os
críticos, tentando silenciar as vozes discordantes, colando a pecha de
sabotadores naqueles que dissentem.
Não custa lembrar que o PT, com o
apoio de setores comprados da imprensa — comprados pela publicidade
oficial —, criou até uma lista negra de jornalistas, sobre a qual muita
gente que chegou a me parecer séria um dia fez um silêncio cúmplice,
preferindo olhar para o outro lado. Críticos do governo foram tachados
de “jornalistas da oposição” e de “adversários da realização da Copa no
Brasil”.
Pois é…
Nos últimos dias, especialmente depois que veio a público uma pesquisa
Datafolha em que Dilma havia oscilado quatro pontos para cima, na margem
de erro, o Planalto se assanhou de novo em pegar carona na Copa. Dilma
anunciou na sua conversa no Facebook que vai ao Maracanã, no domingo,
entregar a taça ao vencedor — ocasião, então, em que “Maracanaço” talvez
passe a ter outro sentido.
Qual é a
última torcida que cabe à presidente? Por razões que o técnico argentino
chamou nesta terça de “culturais” — ele se referia ao fato de que a
imprensa de seu país comemorava o desastre brasileiro —, resta à nossa
governanta torcer desde já para que seja a Holanda ou a Alemanha a
vitoriosa. Ou lhe caberá a honra, depois de ter esconjurado os urubus,
de entregar o troféu ao capitão da Seleção da Argentina.
Eu não
acho que a derrota da Seleção fará o eleitor votar dessa ou daquela
maneira. Não o subestimo assim. Isso não nega o fato de que o PT tinha
planos para tentar fazer da eventual vitória uma arma para esmagar os
adversários. Seria ineficaz porque, reitero, não é assim que se dão as
coisas. Mas o Brasil ficaria um pouquinho mais incivilizado, matéria em
que essa gente é craque.
É TOIS, DILMA!
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