segunda-feira, 17 de novembro de 2014
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, espera que a prisão de
executivos e presidentes de grandes empreiteiras do país na operação
Lava Jato faça com que muitos dos detidos busquem o instituto da delação
premiada para tentar reduzir o tamanho de suas penas. "Isso é um rastilho de pólvora. Quando um começa a falar, o outro diz:
Vai sobrar só para mim?'. E aí eles começam a falar mesmo."
Questionado sobre a possibilidade de haver uma quadrilha operando no
desvio de recursos da Petrobras, Janot afirma que "em princípio sim,
tudo indica que sim, mas está cedo para falar ainda".
À Folha, o procurador fez ainda um balanço de sua gestão no comando do Ministério Público e rechaçou críticas de que recomendou o arquivamento de muitos inquéritos no Supremo Tribunal Federal desde que assumiu o cargo, em setembro de 2013.
À Folha, o procurador fez ainda um balanço de sua gestão no comando do Ministério Público e rechaçou críticas de que recomendou o arquivamento de muitos inquéritos no Supremo Tribunal Federal desde que assumiu o cargo, em setembro de 2013.
NOVAS DELAÇÕES
Isso é um rastilho de pólvora. Quando um começa a falar, o outro diz:
Vai sobrar só para mim?', e aí eles começam a falar mesmo. Todos vão
negociar. Se um abrir a boca, abre todo mundo. Um me perguntou: E se eu
não tiver ninguém para entregar?' Eu disse: Sempre tem, você pode se
entregar, se entregue, autodelação'. Eu só não aceito perdão judicial
[no acordo de delação]. Se for um crime que tenha já semiaberto, sempre
que for possível eu vou botar o aberto. Vá cumprir pena em casa, sem
problema nenhum.
EMPREITEIROS
Em principio é fraude em licitação, lavagem de dinheiro, crime contra o mercado e corrupção ativa.
Elas [empreiteiras] diziam que eram alvo de concussão [exigência de
dinheiro por parte de funcionários da Petrobras]: Eu sou obrigado a dar,
senão eu não consigo participar desse negócio e eu morro à míngua'. Se
puder me explicar como a fraude à licitação decorre de concussão, eu
concordaria com a tese. Como a concussão te obriga a fazer um cartel,
fraudar uma licitação e ganhar um dinheirão? Está sendo extorquido para
ganhar dinheiro? Para ter que botar US$ 100 milhões no bolso? Vamos
combinar, não é. A delação quebrou com essa ponte.
PRESÍDIOS
A gente ainda vai pegar esse dinheiro. Hoje são cerca de R$ 700 milhões
bloqueados [dos empreiteiros]. Se as empreiteiras vierem [fazer
delação], nas cláusulas do acordo, vamos colocar a exigência para a
construção de presídios. Nós vamos ter que fazer licitação para
construir? Não. Eles vão me dar é in natura'.
POLÍTICOS
São muitos fatos e muitas pessoas. Há também muita gente que não tem
foro, mas tem relação com o fato. O que estamos investigando? Pagamento
de propina com dinheiro desviado da Petrobras. As empreiteiras faziam o
retalho das licitações. Teu lote é aquele, teu lote é aquele outro. Eu
pego meu lucro, engordo ele, os outros engordam mais. Essa diferença
entre meu lucro e o que engordei vai irrigar o sistema. Desse dinheiro,
pelo que entendi do [ex-diretor da estatal] Paulo Roberto Costa, você
tem dinheiro destinado a caixa dois de campanha.
INTERFERÊNCIA
Estava visível que queriam interferir no processo eleitoral. O advogado
do Alberto Youssef operava para o PSDB do Paraná, foi indicado pelo
[governador] Beto Richa para a coisa de saneamento [Conselho de
administração da Sanepar], tinha vinculação com partido. O advogado
começou a vazar coisa seletivamente. Eu alertei que isso deveria parar,
porque a cláusula contratual diz que nem o Youssef nem o advogado podem
falar. Se isso seguisse, eu não teria compromisso de homologar a
delação.
LEGADO DA LAVA JATO
O sistema republicano e a Justiça começam a mudar de paradigma. A
Justiça de três, quatro anos para cá, não é mais uma justiça dos três
Ps, de puta, de preto, de pobre. Ela está indo em cima de agente
político e de corruptor. Acho que [essas novas operações e prisões]
serão o grande propulsor da reforma política. E esse sistema é corruptor
mesmo, se continuar esse sistema não vai mudar nada, pois vamos
derrubar essas pessoas e outros virão ocupar esses espaços. O efeito que
estou apostando é a reforma política.
ARQUIVAMENTO
Eu arquivei 65 inquéritos, desses, cinco envolvem o senador Cícero
Lucena (PSDB-PB). Em dias separados pegou uma motoca, botou caixa de som
e começou a fazer propaganda eleitoral. Instauram-se cinco inquéritos,
crime eleitoral, ambiental e de trânsito. Outros cinco da Kátia Abreu
(PMDB-TO). Uso de armas da República em papel da CNA (Confederação
Nacional da Agricultura).
Há caso de deputado que cometeu crime quando
era prefeito, mas foi verificar e ele não era prefeito no período.
Arquivei um do senador Fernando Collor (PTB-AL). Alguém num avião ouviu
que o Collor havia mandado matar o PC Farias e abriram inquérito de
homicídio. Você precisa ter um mínimo de elementos para abrir inquérito.
No STF se perguntavam como esses casos poderiam estar lá, ocupando a
pauta do Supremo. O que eu fiz? Tirei o que tinha de lixo. E mais vai
sair. Dizem que eu arquivei só do PT. São 20 do PMDB, 8 do PSDB e 3 do
PT.
INQUÉRITOS ABERTOS
Eu requisitei a instauração de 29 inquéritos. Coisas que têm
fundamentos. Também apresentei 11 denúncias contra parlamentares. Isso
sem contar o trabalho na Lava Jato, na operação Ararath [que apura
crimes contra o sistema financeiro e lavagem de dinheiro em Mato
Grosso]. A atuação está visível.(Folha de São Paulo)
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