17/11/2014
Por Robson Bonin, na VEJA.com:
A sétima etapa da Operação Lava Jato, que levou à prisão alguns dos maiores empreiteiros do país, confirma a existência de um lado ainda mais obscuro da quadrilha que atuava na Petrobras. Além de subornar políticos e corromper funcionários públicos para desviar bilhões da estatal, o cartel de empreiteiras, denunciado pelo ex-diretor Paulo Roberto Costa e pelo doleiro Alberto Youssef, estava ameaçando testemunhas do caso em uma tentativa flagrante de atrapalhar as investigações da polícia.
Foi esse, aliás, um dos motivos
que levaram o juiz Sérgio Moro a decretar a prisão dos empresários na
sexta-feira passada. Em setembro, VEJA revelou que a contadora Meire
Poza, uma das principais colaboradoras da investigação policial, havia
sofrido ameaças diretas de emissários das empreiteiras. A ação, típica
das organizações mafiosas, está registrada no despacho assinado por
Moro.
Num
encontro ocorrido em julho deste ano na praça de alimentação de um
shopping em São Paulo, um homem identificado como Edson tentou convencer
Meire Poza a aceitar os serviços de um escritório de advocacia
contratado pelas empreiteiras envolvidas no escândalo de desvio de
dinheiro de obras da Petrobras. A gravação da conversa não deixa dúvidas
sobre as más intenções do grupo, claramente incomodado com o avanço das
investigações da polícia, e muito preocupado com a colaboração de
Meire.
A intenção era intimidá-la. Edson, um suposto advogado, se dizia
representante das empreiteiras Camargo Corrêa, OAS, UTC e Constran,
justamente os alvos principais das prisões realizadas pela PF na
sexta-feira passada. A conversa começa descontraída, amigável, e vai
evoluindo para a ameaça. Prestativo, ele se põe à disposição para
ajudar, dar apoio jurídico, mas a oferta é recusada. Em um tom de voz
linear, o emissário passa a revelar os verdadeiros propósitos do
encontro: “Sabemos que tem uma filha, que são somente vocês duas”, diz.
No mesmo tom linear, lembra que Meire pertence a um “grupo fechado” e
que, como pessoa de confiança de Alberto Youssef, não pode sair desse
grupo ou recusar a ajuda de seus clientes.
E vai ao ponto central do
problema: “Dona Meire, o importante é não falar demais! De repente, uma
palavra mal colocada pode ser perigoso, pode ser prejudicial”. Meire
tenta se esquivar das ameaças, diz que está começando a não gostar do
rumo da conversa, mas o advogado é ainda mais direto: “A senhora pode,
sem querer, ir contra grandes empresas, políticos, construtoras. As
maiores do país, a senhora entendeu?”.
O despacho
das prisões, assinado pelo juiz Sérgio Moro, revela a íntegra da
gravação e mostra que a intenção de ameaçar a contadora era clara. “O
interlocutor prossegue ainda tentando convencer Meire a aceitar a
‘ajuda’ do grupo, mencionando que a mesma faria parte de um grupo
fechado de pessoas que se ajudam, indicando claramente as técnicas de
persuasão para que a mesma pudesse ser ‘controlada’ pela organização
criminosa”, registra o despacho.
Percebendo um sinal de nervosismo na
contadora, ele avança, pergunta se Meire acha que ainda tem alguma coisa
a acrescentar para a polícia e que tipo de acordo ela pretende fazer.
Ela diz que não sabe como procederá. E o advogado vai direto ao ponto
mais uma vez: “A gente não pode deixar que a senhora não aceite essa
ajuda”. Diante da pressão, Meire finalmente reage. Afirma que se sente
ameaçada, que não quer ajuda das empreiteiras e encerra a conversa com
um recado: “O senhor provavelmente vai estar lá com os seus clientes,
com a Camargo (Corrêa), com a UTC, com a Constran, com a OAS… Manda todo
mundo ir tomar…”.
Entre os
alvos do “juízo final”, como a ação foi batizada, está o advogado Carlos
Alberto da Costa e Silva, que foi preso temporariamente e ainda teve
seu escritório vasculhado pelos agentes. Meire Poza disse aos policiais
que conheceu o porta-voz das ameaças no escritório do advogado Costa
Silva, segundo ela o responsável por coordenar uma equipe de advogados
contratados pelas empreiteiras.
Procurado por VEJA em setembro, Costa
Silva admitiu ter conversado com Meire, mas negou qualquer relação com
as empreiteiras. Em nota encaminhada a VEJA, a UTC, que também controla a
Constran, confirmou que o escritório de Costa Silva atuava no seu
quadro jurídico. Costa Silva foi preso na Operação Anaconda, em 2003,
acusado de participar de um esquema de venda de sentenças judiciais em
São Paulo. E o tal Edson? “Não conheço, nunca ouvi falar.” A memória, ao
que parece, não é o ponto forte do advogado.
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