sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Seminário demonstra que há uma possibilidade de o bom senso impedir que a política brasileira vá para a clandestinidade



Oh, alvíssaras! De vez em quando os sinos bimbalham, e três pessoas conseguem fazer um debate relevante sobre um tema importante, dizendo coisas consequentes, concordemos com elas ou não. A que me refiro? Está em curso em Brasília o XII Congresso Brasiliense de Direito Constitucional, promovido pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP). Na manhã desta quinta, uma das mesas reuniu o ministro do Supremo Dias Toffoli, presidente do TSE, o senador eleito José Serra (PSDB-SP) e o vice-presidente Michel Temer (PMDB). O tema: a reforma política. O ministro Gilmar Mendes, diretor do IDP, também estava presente.


Houve convergência integral ou parcial sobre muitos aspectos. A primeira e bastante importante: o lugar da reforma é o Congresso Nacional — este que está aí, não outro. Ainda que isto não tenha sido com todas as letras, o que está obviamente entendido é que não faz sentido a tese petista da Constituinte exclusiva.


Todos concordaram também, com modulações, que a ADI (Ação Direita de Inconstitucionalidade) que está no Supremo, com uma maioria provisória que proíbe a doação de empresas a campanhas eleitorais, é um malefício. Serra alertou para o óbvio: aumentaria o volume de caixa dois nas campanhas. Mendes notou que é preciso definir primeiro o sistema para, depois, deliberar sobre como financiá-lo. Temer é favorável a doações privadas, mas acha que as empresas têm de escolher um candidato, em vez de contemplar a vários. E Toffoli, eis uma boa notícia, evidenciou uma mudança de opinião em relação a pronunciamento já feito no STF.


O ministro admitiu que, se o tribunal proibir o financiamento privado, “o mundo real acabará criando situações que não ficarão bem colocadas”.  E emendou: “É melhor que isso seja refletido de maneira mais aprofundada. Soluções simplistas não vão resolver problemas muito complexos”. Toffoli está alertando, em suma, para um risco óbvio para o qual já chamei a atenção aqui tantas vezes, enfatizado por Serra: proibir a doação legal só estimulará a doação ilegal. O presidente do TSE acenou com outra proposta que me parece sensata: criar um teto para a doação das empresas. A sugestão de Temer seria boa num país que não tivesse um estado gigante como o Brasil: por aqui, o partido que estivesse no poder levaria enorme vantagem.


Serra defendeu o voto distrital já para as eleições municipais de 2016 em cidades com mais de 200 mil eleitores, proposta vista com simpatia por Temer, que a estenderia também para a eleição dos deputados estaduais. Os leitores deste blog sabem que sou um entusiasta desse sistema. O vice-presidente e o senador eleito divergem apenas sobre a forma de eleger a Câmara Federal: o peemedebista defende o voto majoritário: elegem-se os mais votados, e ponto final. O tucano apoia o voto distrital misto.


Todos concordaram ainda que é preciso criar mecanismos para coibir a multiplicação desenfreada de partidos políticos, que não traduzem, evidentemente, a diversidade ideológica da sociedade, mas a mera conveniência de grupos organizados.


A questão do financiamento de campanha está no Supremo. Mendes pediu vista, e não há prazo para que o julgamento seja retomado. Enquanto não é concluído, ministros podem mudar de ideia e reformar o próprio voto. Fico satisfeito ao perceber que Dias Toffoli se mostra sensível ao apelo da razão. Ainda tenho a esperança de que a maioria do Supremo não vai afrontar de maneira tão escandalosa a lógica.


Eu me sinto algo recompensado. Durante alguns meses, fiquei praticamente sozinho, na imprensa ao menos, insistindo no óbvio. 


Por Reinaldo Azevedo

Nenhum comentário: