20/04/2014 15h04
Concea diz que sigilo sobre testes cabe à comissão de ética das entidades.
Cientistas dizem haver atraso e que órgão coleta informações desde 2008.
Levantamento do G1 e dados obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação mostram que dados sobre pesquisas com animais realizadas hoje no país ainda são escassos, desconhecidos pelo governo ou mantidos sob sigilo. Só um terço das instituições autorizadas têm suas pesquisas divulgadas oficialmente, e apenas 4% buscam alternativas a esses métodos.
O governo federal publica a lista de instituições e tipos de testes no site do Concea (Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal), órgão responsável pelo controle das pesquisas com animais do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Dos 230 institutos ou universidades autorizados, 196 estão cadastrados, e apenas 77 têm suas informações disponibilizadas (33,4%).
O G1 pesquisou cada instituição da lista de credenciadas no site. Muitas das informações fornecidas estão truncadas ou incompletas e os registros nem sempre são atuais.
Por meio da Lei de Acesso à Informação, o G1 pediu ao ministério o “detalhamento do tipo de pesquisa aprovada e para quais fins se destina”. O Concea afirma que não possui os dados e que cabe às Comissões de Ética no Uso de Animais (CEUA) de cada universidade ou laboratório divulgá-los no site. A CEUA é uma comissão obrigatória criada pelas próprias instituições para avaliar e autorizar os testes.
Sigilo
O conselho diz também que as comissões, com base na Lei Arouca, não estão obrigadas a informar ao público que tipo de pesquisa estão fazendo com os animais. "Compete à CEUA decidir sobre a não disponibilização da informação", respondeu José Mauro Granjeiro, coordenador do Concea.
saiba mais
"A Resolução Normativa do Concea nº 12, de 2013, em seu item 5.2.3.6,
colocou as informações produzidas no âmbito da CEUA sob o resguardo de
sigilo e confidencialidade. São consideradas imprescindíveis à segurança
da sociedade ou do Estado e, portanto, passíveis de classificação as
informações cuja divulgação ou acesso irrestrito possa prejudicar ou
causar risco a projetos de pesquisa e desenvolvimento científico ou
tecnológico (...)", completa.- Concea nega vetar animais em testes e dá 5 anos para validar alternativas
- Veja como estão os beagles do Instituto Royal seis meses após a invasão
- Brasil ainda não valida pesquisas alternativas ao uso de animais
- Veja testes que já não exigem cobaias e aqueles em que são necessárias
- Alckmin sanciona lei que proíbe o uso de animal em teste para cosmético
- Após invasão, cientista sugere que Brasil discuta leis sobre animais
- 19 dias após invasão, Instituto Royal encerra atividades em São Roque
- INFOGRÁFICO: É possível deixar os testes?
Sem controle
A reportagem do G1 procurou alguns dos institutos que, segundo o ministério, não publicaram suas informações.
No caso do Instituto Royal, invadido por um grupo para resgatar dezenas de beagles usados em pesquisas em São Paulo, o governo foi quem declarou o sigilo das pesquisas. O instituto encerrou suas atividades, mas chegou a ter projeto de R$ 5,25 milhões aprovado em parceria com dois ministérios, divulgado apenas como “criação, manejo e fornecimento de animais para desenvolvimento pré-clínico de fármacos” e classificado pela Finep (Agência Brasileira da Inovação).
Ana Lúcia Marigo é secretária da CEUA da Embrapa Meio Ambiente, um dos institutos para os quais não constam informações no site. Segundo ela, as instituições são informadas de que devem se cadastrar no Ciuca (Cadastro das Instituições de Uso Científico de Animais), lançado em 2008 quando foi instituído o Concea. “Mas está tudo tão cru ainda", diz.
O governo divide as instituições entre "deferidas" (76 ao todo) e "em andamento" (154), mas todas estão autorizadas a realizar as pesquisas, ainda que o Concea não tenha analisado a documentação.
"São pouquíssimas as que já têm o credenciamento deferido. A gente tinha um prazo até o ano passado para submeter e, em janeiro, recebemos uma correspondência dizendo que os dados estão sendo avaliados”, afirma a pesquisadora.
Segundo Marigo, hoje o Brasil não possui nenhum controle prévio sobre as pesquisas com animais e não é possível saber, por exemplo, se o mesmo procedimento está sendo feito em estados diferentes com o mesmo objetivo, sacrificando mais de um animal.
“[O Concea] começou esse levantamento em 2008. Até tudo começar a caminhar do jeito que deve ser vai demorar muito tempo. Muita gente está perdida e tem muita coisa errada para ser arrumada. Imagine um pesquisador que trabalha com animais há 30 anos, nunca precisou preencher um protocolo, sempre matou quantos ratos quis. É claro que a gente segue as orientações [do Concea], mas a fiscalização deles é perante os relatórios das pesquisas”, afirma.
Octavio Presgrave, coordenador do CEUA da Fiocruz no Rio de Janeiro, também diz que o instituto vem colaborando com o Concea, apesar de as pesquisas do Centro de Pesquisas René Rachou, parte da Fiocruz Minas, não estarem listadas no site. "A gente vem alimentando, mas não sei responder se isso eles vão tornar isso público", afirma.
Para o cientista, ainda que mantenha parte das pesquisas em sigilo, em razão de quebra de patentes, por exemplo, o governo poderia divulgar relatórios quantitativos para auxiliar a comunidade científica. “A União Europeia publica relatórios sobre quantos animais são utilizados nas pesquisas, áreas de pesquisa. Hoje só é possível saber o que o outro está fazendo através de artigos que são publicados. Acho que a ideia do Concea é juntar esses dados para poder divulgar”, afirma.
Nenhum comentário:
Postar um comentário