Presidente da Petrobrás à época da compra da refinaria de Pasadena, nos
Estados Unidos, em 2006, José Sergio Gabrielli admitiu em entrevista ao
Estado sua parcela de responsabilidade no polêmico negócio, mas dividiu
o ônus com a presidente Dilma Rousseff...
Segundo ele, o relatório entregue ao Conselho de Administração da
estatal foi "omisso" ao esconder duas cláusulas que constavam do
contrato, mas Dilma, que era ministra da Casa Civil e presidia o
conselho, "não pode fugir da responsabilidade dela".
Gabrielli defende a compra da refinaria conforme as circunstâncias da
época e alfineta sua sucessora, Graça Foster, ao afirmar que a Petrobrás
não foi construída nos dois anos de gestão da atual presidente da
estatal. De acordo com ele, a queda do preço das ações da estatal não se
deve a Pasadena, mas à conjuntura externa, afetada pela crise
financeira global de 2008, e à política do governo de manutenção
artificial dos preços da gasolina no Brasil abaixo do mercado
internacional. Política que, segundo Gabrielli, está contaminada pela
disputa eleitoral.
O senhor se considera responsável pelo relatório entregue ao conselho
administrativo da Petrobrás antes da compra da refinaria de Pasadena?
Eu sou responsável. Eu era o presidente da empresa. Não posso fugir da
minha responsabilidade, do mesmo jeito que a presidente Dilma não pode
fugir da responsabilidade dela, que era presidente do conselho. Nós
somos responsáveis pelas nossas decisões. Mas é legítimo que ela tenha
dúvidas.
O relatório é falho e omisso como disse a presidente Dilma?
Acho que não (foi falho). Ele foi omisso. Sem dúvida nenhuma foi omisso
porque as duas cláusulas mencionadas (Put Option, que obrigou a
Petrobrás a comprar a outra metade da refinaria, e Marlim, que
compensaria a então sócia Astra por possíveis prejuízos) não constavam
da apresentação feita aos conselheiros.
O conselho teve acesso à totalidade dos documentos antes de aprovar a compra da refinaria?
Não teve acesso a essas cláusulas. Mas isso não é relevante, a meu ver,
para a decisão do conselho. O que é relevante é se o projeto é aderente
tecnologicamente e estrategicamente ao que você faz e ter dado
rentabilidade com os pressupostos daquele momento. Essas três condições
fariam a decisão do negócio.
Se o Conselho de Administração da estatal soubesse dessas cláusulas no primeiro momento teria aprovado a compra da refinaria?
Eu acho que teria aprovado porque o objetivo naquele primeiro momento
era a possibilidade de ter um negócio nos Estados Unidos em uma
refinaria que tinha preços adequados ao mercado. E poderia ser uma
entrada forte nossa nos Estados Unidos, o mercado que mais crescia no
mundo na época. Continuo achando que foi um bom negócio para a
conjuntura de 2006, um mau negócio para a conjuntura de 2008 a 2011 e
voltou a ser bom em 2013 e 2014.
O que mudou na Petrobrás de Lula para Dilma?
Não acho que houve mudança. É bom lembrar que saí em fevereiro de 2012 e
o acordo de Pasadena é de junho de 2012. Enquanto estive lá, a partir
de 2008, só fiz disputar judicialmente com a Astra. Não fiz nenhum
acordo com a Astra.
Então a mudança foi de Gabrielli para Graça Foster?
Eu não disse isso. A gestão da presidente Graça deu continuidade aos
planos estratégicos desenvolvidos pela diretoria anterior. Não vejo
ruptura entre mim e Graça. É uma presidência de continuidade.
Pelo menos em um ponto importante vocês divergem. Graça diz que a
compra de Pasadena foi um negócio ruim e o senhor diz que foi bom.
Nós não divergimos. Graça disse de forma explícita que hoje ela não
faria o negócio mas que na época foi um bom negócio. Portanto nós não
temos divergência. Na época eu faria a mesma coisa. O negócio depois
ficou ruim e hoje está melhor outra vez.
Existe uma tentativa de responsabilizar a sua gestão por um negócio que não deu o resultado esperado?
Cheguei na Petrobrás e a empresa valia US$ 15 bilhões. Comigo a
Petrobrás foi a US$ 350 bilhões e quando eu saí ela estava valendo US$
180 bilhões. Essa é a realidade no mercado. A empresa vinha num processo
de esvaziamento, de quebra da unidade operacional, sendo fatiada. Havia
várias iniciativas para vender as refinarias em pedaços. Saímos da
situação de uma empresa acuada na área de gás e energia para nos
transformarmos no principal ator produzindo hoje um volume superior
talvez à energia de Itaipu. Isso não se fez nos últimos dois anos.
As dúvidas sobre negócio de Pasadena são uma mácula à sua gestão?
Não posso aceitar isso. Posso falar da minha gestão em termos de
resultados. Posso falar de uma empresa que saiu de ter duas sondas de
perfuração para ter 69, que saiu de 33 mil pessoas trabalhando para 85
mil, que foi nesse período que se descobriu o pré-sal e se atingiu a
autossuficiência. Na minha gestão a companhia teve os maiores lucros da
história e realizou a maior capitalização da história do mundo em termos
de venda de ações no mercado. Não posso dizer que foi uma gestão
equivocada. Desafio quem quiser discutir sem xingamento a dizer que foi
uma má gestão.
Qual sua opinião sobre a declaração da presidente Dilma de que estariam tentando atingir a Petrobrás?
A oposição faz uma campanha irresponsável contra a Petrobrás. A
Petrobrás é um patrimônio nacional extremamente bem gerido, com uma
competência instalada extraordinária. O ataque só pode ser entendido por
interesses eleitoreiros combinados com alguns interesses muito mais
complicados.
Quais?
Interesses na área financeira de redução dos valores da Petrobrás para
poder viabilizar operações no mercado de ações e ameaçar o papel
histórico da empresa de desenvolver o pré-sal brasileiro. Quando nós
mudamos o marco regulatório do pré-sal em 2010 com a introdução da
partilha de produção que altera as formas de apropriar o futuro e com
isso vai viabilizar mais recursos para a educação brasileira, isso teve
uma oposição muito grande. É quem hoje está atacando a Petrobrás. Quem
hoje ataca a Petrobrás também ataca o modelo da partilha e o conceito de
que a companhia deve ser a operadora do pré-sal.
Como o senhor explica a grande desvalorização da empresa apesar da descoberta do pré-sal?
Em dezembro de 2002 uma ação da Petrobrás em Nova York custava US$
3,67. No dia 1.º de agosto de 2008 chegou a US$ 55,31 e hoje está a US$
13,50. Esse período pós 2008 deve ser explicado por dois fenômenos.
Primeiro, pela crise financeira mundial que reduziu a demanda de
petróleo dos EUA. Segundo, pela queda do preço de petróleo e do mercado
de ações. No Brasil tem um componente importante que está penalizando as
ações da Petrobrás que é o ajuste dos preços da gasolina e diesel no
mercado nacional abaixo dos preços praticados no exterior.
O preço da gasolina no Brasil deve aumentar?
Deve aumentar. Não precisa ser instantaneamente mas tem que haver um
aumento gradual para permitir uma mínima aproximação do preço doméstico
com o preço internacional. Não há como a Petrobrás manter
permanentemente uma diferença entre o preço doméstico e o internacional.
Tem que ter um processo de convergência e no dia que acontecer isso as
ações da Petrobrás voltam a crescer.
A política sobre os preços da gasolina também está contaminada pelo debate eleitoral?
Claro. Acaba sendo afetada, influenciada.
Houve US$ 530 milhões de baixas contábeis da Petrobrás por causa de
Pasadena. Existe possibilidade de a companhia recuperar esses valores?
Não sei os números de hoje, mas a presidente Graça diz que o lucro é de
US$ 58 milhões em janeiro e fevereiro de 2014. Se multiplicar US$ 58
milhões em 10 meses ela recupera os US$ 530 milhões. É uma conta linear.
Existe algum conflito ético na indicação do seu primo José Orlando para o cargo de presidente da Petrobrás América?
O Zé Orlando entrou na Petrobrás em 1978. Quando cheguei, em 2003, era
conhecido como primo de Zé Orlando. Não ele (conhecido como) meu primo.
Quando a indicação para presidência da Petrobrás América chegou, eu
tinha as seguintes opções: veto porque é meu primo ou aceito porque é a
pessoa mais correta. Aí resolvi comunicar à CVM (Comissão de Valores
Mobiliários) porque não é justo vetá-lo por ser meu primo. Enquanto ele
esteve lá nós só fizemos disputa judicial. Não teve nenhum pagamento à
Astra.
Fonte: RICARDO GALHARDO Estadão - 20/04/2014 - - 10:50:20
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