09/05/2014
às 19:32 \ Cultura
Se vocês nunca entenderam o pensamento esquerdista, aproveitem: basta ler as explicações dadas ao Estadão pela reescritora Patricia Engel Secco, aquela que, sob o pretexto de tornar os clássicos da literatura brasileira mais acessíveis aos novos leitores, mutila os textos originais em projeto financiado com dinheiro público.
Escrevi a respeito no artigo Machado de Assis vai dar beijinho no ombro também? e cerca de sete mil brasileiros já assinaram a petição online que pede que o Ministério da Cultura impeça a alteração de obras em língua portuguesa.
Não vou mutilar aqui as palavras de Patrícia. Prefiro desmascará-la(s):
“Fiquei tão ansiosa com o que está saindo que fui para a rua fazer entrevista. Falei com o gari, com o menino do lava-rápido, com o manobrista do restaurante. Ninguém sabe quem é Machado de Assis. É para eles que estou fazendo esse projeto. Vejo mães discutindo, mas não é para os filhos delas. É para a faxineira delas – não é nem para o filho da faxineira que está na escola; é para ela. Quero o livro na casa dos mais simples.”
Não há limites para a demagogia e o populismo esquerdistas. O velho discurso da luta de classes cai como uma luva para justificar o oportunismo de botar a mão em verbas públicas e ainda posar de defensora dos excluídos contra as elites supostamente malvadas e egoístas.
Se “ninguém sabe quem é Machado de Assis”, é evidente que não será Machado “Secco” – sequinho mesmo – de Assis que vai deixar as pessoas saberem. Apresentar um escritor com uma obra que não é a dele seria como eu apresentar a reescritora com declarações de Dilma Rousseff – embora, neste caso, a diferença talvez fosse menor entre o conteúdo dos discursos.
Quem quer oferecer literatura fácil senta a bunda na cadeira, escreve literatura fácil e procura uma editora. Quem quer “descomplicar” literatura “difícil” dá aulas, reedita obras com notas explicativas, educa. Mutilar a literatura supostamente difícil para facilitar sua digestão, usando dinheiro público, é coisa de aproveitadores cínicos, que tentam vender gato por lebre.
Mas o ápice do cinismo esquerdista vem agora:
“Estou horrorizada [com o abaixo-assinado]. É muito triste pensar que algumas pessoas acham que Machado de Assis, o mestre da literatura brasileira, não pode ser lido pelo sr. José, eletricista do bairro do Espinheiro, que, apesar de gostar de ler, não cursou mais que o primário, ou pelo Cristiano, faxineiro de uma farmácia de Boa Viagem, que não sabe nem mesmo o significado da palavra boticário.”
Quem é que acha que Machado de Assis não pode ser lido pelos pobres senão ela mesma, a mulher que julga necessário reescrevê-lo para eles? É a velha máxima atribuída a Lenin seguida à risca pela enésima vez contra uma elite imaginária: “Xingue-os do que você é, acuse-os do que você faz.” Patricia acusa os outros do seu próprio preconceito escancarado de esquerdista que trata os pobres como incapazes, infantilizando-os com o Estado Babá.
[Ver meu artigo O mundo inteiro está cheio de todo mundo.]
Segundo seus critérios, talvez nem o jovem Machado poderia ter lido uma obra à altura da sua própria, já que nasceu pobre, no Morro do Livramento, assim como Lima Barreto, que era filho de uma escrava liberta, além de inúmeros outros escritores e leitores “Josés” e “Cristianos”, no Brasil e no resto do mundo, que não fizeram da pobreza um pretexto para a ignorância.
Se um faxineiro não sabe o significado da palavra boticário, ele precisa é de DESEJO DE CONHECIMENTO e uma boa dose de vergonha na cara para buscar por si mesmo no dicionário, no glossário ou na nota de rodapé, e não da substituição da palavra por outra – como direi? – menos cheirosa… Leitura não é para manter as pessoas limitadas ao vocabulário que já conhecem, mas, entre outras coisas, para expandi-lo.
Pior do que a falta de professores capazes de incutir-lhes desejo de conhecimento e educá-los, são falsos professores oferecendo-lhes mais um arremedo de educação, entre tantos.
Gustavo Corção (1896-1978), cuja obra felizmente ainda não foi mutilada pelo MinC, escreveu sobre Machado de Assis:
“Não se pode contar um conto de Machado, ou narrar um capítulo de romance com outras palavras. O conteúdo está vitalmente colado à forma. O jogo de ideias está preso ao jogo dos elementos da linguagem. E é por isso que a obra de Machado é praticamente intraduzível em outro idioma, pois seria preciso aparecer no estrangeiro um escritor estilista de alto quilate, que pertencesse à família espiritual de Machado e que tivesse um profundo conhecimento da língua portuguesa.”
No Brasil, só quem aparece para mexer na obra de Machado é gente da família espiritual de Karl Marx. No centenário da morte do escritor, Diogo Mainardi fez uma coluna a respeito:
“Desde que Helen Caldwell, em 1960, negou o adultério de Capitu, moldando Dom Casmurro às suas teorias feministas, Machado de Assis foi raptado pela crítica esquerdista. Em particular, por John Gledson e Roberto Schwarz, que o transformaram ridiculamente num agente da luta de classes, empenhado em denunciar os abusos da classe dominante.
Na realidade, Machado de Assis é mais complicado do que isso. Ele é um satirista conformista e resignado, que zomba da mesquinhez de nossa sociedade e acredita que, quando ela muda, muda sempre para pior.
A série Capitu festeja o abastardamento da obra machadiana. Machado de Assis sabe bem: de agora em diante, isso só pode piorar.”
Pois é. Piorou. Em vez de destruí-lo por fora, Patricia Secco agora o esvazia por dentro. O esquerdismo é assim: sempre evolui para pior.
Felipe Moura Brasil - http://www.veja.com/felipemourabrasil
COMENTARIO
O Socialismo está nivelando o Brasil por baixo e, com isso, aumentado a distancia entre as classes sociais.Em vez de educar está emburrecendo as pessoas de uma forma que vai ser difícil depois consertar.Desse jeito, logo, logo, a diferença entre os brasileiros não será tanto mais a econômica mas a de modos, de nível de conhecimento, de educação.De um lado, vão ficar os broncos, aqueles que curtem funk, dança da garrafa, que picham, que depredam mas que são os "autênticos", os queridinhos do governo. Do outro lado estarão os...civilizados.
Estou desistindo do Brasil.Pensei que, com o tempo, o numero de cavalgaduras fosse diminuir mas está aumentando assustadoramente, regados pelas "bolsas-vagabundagem" e pela proteção do Governo que estimula a burrice de todas as formas possíveis.
anônimo.
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