Riscos para a população com a pior estiagem em 80 anos vão além da falta d’água
A estiagem que castiga a Bacia do Rio Paraíba do Sul, responsável pelo abastecimento de 14 milhões de pessoas, tende a se agravar. Mas já deixou a Represa do Funil, em Itatiaia, no Sul Fluminense, operando com 10% de sua capacidade de geração de energia — o segundo pior índice desde que entrou em atividade, em 1969.
A bela paisagem não anima: reservatório do Funil, em Itatiaia, funciona com a capacidade quase comprometida
Além do desabastecimento na maioria das 37
cidades que captam água diretamente do manancial nos estados do Rio, de
São Paulo e Minas Gerais, o colapso do sistema afeta em cheio a geração
de energia elétrica e pode causar surtos de doenças provocadas pelo
consumo de água de poços artesianos contaminados, alternativa que virou
febre, como na Baixada Fluminense e na Zona Oeste.
Em abril, relatório do Operador Nacional do
Sistema Elétrico já havia adiantado que a bacia corre o risco de
praticamente secar até o final do ano, caso não chova o suficiente,
alcançando o negativo recorde de 1,8% de sua capacidade. Hoje, está na
casa de 5%. David Zylbersztajn, do conselho de administração da Light e
sócio-diretor da DZ Negócios com Energia, já garantiu que o sistema
elétrico brasileiro não terá energia suficiente em 2015.
Segundo especialistas, as chuvas do verão não serão suficientes para que reservatório volte ao nível normal
Foto: Ernesto Carriço / Agência O Dia
Na Represa do Funil, o cenário é desolador. A
usina, que, com o armazenamento de até 890 milhões de metros cúbicos de
água, gera 216 megawatts para a Light, revendida para 600 mil clientes,
operava na sexta-feira com 10% de sua capacidade de volume útil, o
segundo pior índice. Áreas que deveriam estar alagadas, deixam à mostra
pedras, lixo e areia.
“Neste verão, há riscos reais de racionamento
de água e energia e desencadeamento de epidemias de enfermidades, como
hepatites, diarreia infecciosa e cólera”, ressalta o engenheiro
sanitarista e assessor de Meio Ambiente do Crea-RJ, Adacto Ottoni. Ele
cobra, desde 2005, o reflorestamento de 80% de áreas devastadas no
entorno da Bacia do Paraíba.
Bertoldo Rocha lembra que há 20 anos pescava 40 quilos por dia no Rio Paraíba. Hoje, só 4 quilos
De acordo com a meteorologista Marlene Leal, do
Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), somente no outono de 2015,
em maio, é que choverá em quantidade suficiente para suprir a falta de
água no Paraíba. Hoje está prevista a chegada de uma frente fria ao
Médio Paraíba, mas o volume será baixo. “As chuvas de Primavera e Verão
não superarão o déficit de água nos reservatórios do Sudeste”, avalia
Marlene.
Em nota, a Light explicou que ainda não há
impacto no fornecimento de energia para seus 4 milhões de clientes nos
31 municípios que opera, incluindo a capital, e que, ser for necessário,
acionará o Sistema Interligado Nacional para compensar
desabastecimento.
A escassez de água pode ser vista ao longo do
curso de água. Em Resende, Barra Mansa e Volta Redonda, o assoreamento
do leito deixa à mostra bancos de areia, mato e lixo que chegam à metade
do manancial, em alguns pontos. “Pesco há 56 anos aqui e nunca vi o rio
num estado de calamidade tão grande”, atesta o pescador de Volta
Redonda, Bertoldo Rocha, 72 anos. Ele conta que há 20 anos pescava em
torno de 40 quilos por dia de peixes e hoje não passa de 4 quilos.
Baixa nos reservatórios expôs bancos de areia, pedras e até lixo, deixando em risco o seu funcionamento
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