Por Merval Pereira
Bastou o boato de que o ex-presidente do Banco Central
Henrique Meirelles substituirá Graça Foster na presidência da Petrobras para as
ações da estatal subirem na Bolsa de Valores. Meirelles, ou alguém com
instrumentos semelhantes, mais cedo ou mais tarde assumirá mesmo a Petrobras,
por que não há amizade que possa prescindir de mudanças profundas em uma hora
de crise como a que vive a Petrobras.
É uma decisão básica para dar uma esperança de novos dias,
coisa que a presidente Dilma ainda não conseguiu nesse seu segundo mandato.
Todo governo novo traz consigo uma renovação de expectativas que por si só
ajuda a melhorar o ambiente, e pode ser punido quando essa esperança nele
depositada é traída.
Existem diversos exemplos recentes, e o melhor deles, no
sentido positivo, é o segundo governo de Lula, que conseguiu superar a crise do
mensalão para transformar-se em um líder de altíssima popularidade. As sequelas
do mensalão continuarão a marcar a sua trajetória política, e seguidas do
escândalo da Petrobras, retiram dele a aura de intocável que por muito tempo o
acompanhou.
Mas ele foi beneficiado pela situação da economia
internacional nos primeiros anos e, sobretudo, contou com os efeitos do Bolsa
Família, que àquela altura de seu segundo governo começavam a aparecer,
consolidando sua fama de pai dos pobres e transferindo a força eleitoral do PT
para o norte e o nordeste do país.
Um fato interessante desse período é que foi o então
ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Patrus Ananias, quem
detectou e explorou a força eleitoral do programa Bolsa Família. Ele assumiu o ministério
criado em 2004, quando as políticas sociais do governo federal estavam em crise
devido à disputa de grupos políticos e a concepções distintas de suas
validades.
O programa Fome Zero, do qual o Bolsa Família era apenas
um efeito colateral sem maiores perspectivas, dera errado, devido à burocracia
que o paralisava e à disputa conceitual não resolvida de diversas facções
petistas. O Bolsa Família estava sendo tocado como um programa de cunho mais
político do que eleitoral.
O então assessor especial da Presidência, Frei Betto, via
o programa como um canal de fortalecimento da cidadania, e retirou das
prefeituras o poder de interferir na distribuição das bolsas, fazendo com que
grupos de cidadãos fossem os responsáveis pelo cadastramento e distribuição,
com o objetivo precípuo de impedir o uso político do programa.
Patrus, ao contrário, viu o prestígio político que aquele
programa daria a Prefeitos de todo o país e transferiu aos municípios a tarefa
de distribuir o Bolsa Família, que ganhou um cunho assistencialista enquanto o
novo ministério tratava de dar conceitos técnicos ao cadastramento e ao
acompanhamento das condicionalidades do programa.
Embora tenha sido o responsável pelo sucesso do programa,
Patrus
Ananias não teve os dividendos políticos da ação e acabou
alijado da política partidária até recentemente, quando retornou ao mesmo
ministério no segundo governo Dilma, sem o aval do presidente Lula.
O problema da presidente reeleita é que não há mais
programas novos para lançar, nem dinheiro para implementá-los, e resta a ela
esperar que nomes como Meirelles ou Levy, vindos de outras hostes - que ela
hostilizou na campanha eleitoral - consertem o que há de errado na economia
para ter a esperança de terminar o segundo mandato recuperando a imagem de boa
gestora.
Para isso, ela ironicamente depende que o ministro da Fazenda Joaquim
Levy cumpra o que prometeu ontem a diversos internautas em um bate-papo
promovido pela Presidência da República: dificuldades a serem superadas nos
dois próximos anos para que, a partir de 2017, o país volte a crescer em ritmo
mais forte e com uma base mais firme.
É nessa expectativa que a presidente Dilma está aceitando
mudar seus conceitos econômicos, postos em xeque no primeiro governo, que teve
números pífios. Levy fala de "empregos melhores" ao fim das mexidas,
mas o que se terá até lá é o aumento do desemprego. O que não se sabe é até
quando Dilma aguentará os efeitos colaterais negativos das medidas que têm que
ser tomadas agora para que, mais adiante, a economia volte a funcionar.
Merval Pereira é Jornalista e membros das Academias
Brasileira de Letras e de Filosofia. Originalmente publicado em O Globo em 10
de janeiro de 2015.
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