domingo, 9 de março de 2014

Estudantes da UnB criam página na web para relatar casos de assédio

08/03/2014 15h00 -




Em menos de um mês, grupo ganhou 5.087 seguidores e 152 mensagens


Em 2013, TJDF recebeu 15 mil inquéritos relativos à Lei Maria da Penha.





Raquel Morais Do G1 DF


Estudantes da Universidade de Brasília criaram uma página em uma rede social para denunciar casos diários de assédio que afirmam ocorrer na instituição. 

As agressões variam entre cantadas a violência física. A ideia se expandiu, e as alunas também passaram a desabafar anonimamente sobre abusos ocorridos em outros locais. 

Em menos de um mês, o espaço recebeu 152 mensagens e ganhou 5.087 seguidores.

Em menos de um mês, página criada por estudantes da UNB numa rede social recebeu 152 mensagens e ganhou 5.087 seguidores. (Foto: Facebook / Reprodução)

Em um dos 126 relatos já postados pela “Fiu Fiu – UnB”, uma aluna narra um constrangimento vivido em um happy hour no campus. 

Mesmo acompanhada, ela diz que foi insistentemente abordada por um rapaz, que chegou a puxá-la pela cintura.

"Tentei empurrá-lo, mas ele segurou meus pulsos, o que os deixou roxos depois", escreveu.

Com a ajuda de um amigo dele, a menina teria conseguido se soltar, mas foi novamente assediada pelo homem. "[Ele disse] 'Você é o amor da minha vida. 

Não vou deixar você fugir dessa vez não, gata gostosa. ' Me prendeu contra ele. Dei uma cotovelada no estômago dele e sai correndo. Um grupo de meninos ali perto gritou 'bu' e riu da minha cara."
"Precisamos mostrar que isso [assédio] não é natural, não é aceitável. A sociedade tem obrigação de proteger a mulher" – Olgamir Ferreira, secretária da Mulher do DF

Uma das nove gerenciadoras, Beatriz Sabô afirma que se surpreendeu com o teor e a quantidade de mensagens recebidas. 

A maioria delas relata agressões sofridas dentro de casa ou praticadas por conhecidos. Há, ainda, seis desabafos masculinos, que as estudantes analisam como vão inserir na página.

“Não esperávamos que tivéssemos tantos relatos, tantas histórias tristes guardadas durante tantos anos, sendo revelados assim, tão dolorosamente. Cada relato é diferente, não dá para medir o sofrimento deles. Só sabemos que dói. Quando lemos, é uma mistura de sentimentos: raiva, nojo, tristeza, choque”, disse Beatriz.

Paralelamente às denúncias, as estudantes publicam telefones úteis e artigos que possam ajudar as vítimas a se orientar diante dessas situações.

 O grupo, segundo Beatriz, tem também a intenção de montar uma estatística a partir das informações enviadas.

“Achamos que a página se tornou uma fonte importante de informação e uma ferramenta de utilidade pública e esperamos ver mudanças na sociedade”, conta Beatriz. 

“Buscamos problematizar e debater todo tipo de agressão, desde as mais evidentes já criminalizadas, como o estupro, até as normalizadas, mas tão danosas quanto, como as agressões psicológicas e verbais que são socialmente camufladas pelo inocente título de cantadas.”

Para a secretária da Mulher do Distrito Federal, Olgamir Amancia Ferreira, a iniciativa é interessante. 

“Isso obriga a sociedade a debater o assunto e, ao debatê-lo, temos mais chances de encontrar saídas. Enquanto isso ficar debaixo do tapete, essas coisas não são tratadas. As pessoas fingem que não acontece ou que não tem importância.”


Estudantes da Universidade de Brasília criaram uma página em uma rede social para denunciar casos diários de assédio que afirmam ocorrer na instituição. (Foto: Raquel Morais / G1)Estudantes da Universidade de Brasília criaram uma página em uma rede social para denunciar casos diários de assédio que afirmam ocorrer na instituição. (Foto: Fiu Fiu - UnB / Divulgação)
Olgamir afirma que o assédio à mulher foi historicamente naturalizado, e que isso ajuda a contribuir para que as vítimas não denunciem as agressões e para que haja subnotificação de casos.

“Por que isso acontece? O homem foi trabalhado para pensar que a mulher é objeto, propriedade. E aí, muitas vezes, quando a mulher procura serviços para fazer a reclamação, o olhar da sociedade é de que é uma questão menor. 

‘Por que ir a uma delegacia por causa disso? ’ Precisamos mostrar que isso não é natural, não é aceitável. A sociedade tem obrigação de proteger a mulher”, declarou a secretária.

Conscientização

Olgamir avalia que, em relação ao assédio, não existe um perfil do agressor ou da vítima. Para estimular a sociedade a encarar o assunto de outra forma, a pasta vai lançar ainda neste mês uma campanha contra as abordagens desrespeitosas em coletivos.


“A grande reclamação é que, além de o indivíduo usar o momento do ônibus mais cheio para impor seu corpo em relação ao da mulher, o movimento é testemunhado por outras pessoas que estão lá dentro, que fecham os olhos, fazem de conta que é natural, parte do cenário”, destacou.

 
Denúncias de agressão

Dados da Presidência da República apontam que o DF é a unidade da federação com maior número de denúncias de agressão contra mulheres no país. O último levantamento, com dados do primeiro semestre de 2013, aponta que o índice na capital federal foi de 673,53 casos a cada grupo de 100 mil habitantes.


No ano passado, o Tribunal de Justiça do DF recebeu mais de 14,8 mil inquéritos relativos à Lei Maria da Penha. A norma prevê a atuação do Estado na prevenção, punição e erradicação da violência doméstica e familiar contra a mulher.


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