Edital destinado a alugar veículos para Secretaria Especial de Saúde Indígena foi manipulado
Mino Pedrosa e Lindauro Gomes
Especial para o Jornal de Brasília
Fim de semana agitado na Capital Federal por conta das denúncias sobre fraudes em licitações milionárias no Ministério da Saúde.
O ex-ministro petista Alexandre Padilha, candidato do partido ao Palácio dos Bandeirantes de São Paulo, pode estar sem dormir desde a última sexta-feira.
Para completar, as denúncias têm acirrado os ânimos da imprensa internacional, como é o caso da BBC, inglesa, que desde janeiro tenta explicações do secretário Especial de Saúde Indígena, Antônio Alves, sobre a mortandade de índios no Brasil, que estariam abandonados pelo Ministério desde 2007.
Deixou rastros
Um e-mail, que teria sido criado na trama para fraudar licitação do Ministério da Saúde, deixou rastros com provas irrefutáveis de uma organização criminosa, que seria conhecida do então ministro da Saúde, Alexandre Padilha.
Foi no escritório de advocacia Jacoby Fernandes e Reolon Advogados e Associados, na Península dos Ministros, local dos mais nobres de Brasília, que foi formatado o edital dirigido a alugar veículos para a Secretária Especial de Saúde Indígena do Ministério da Saúde (Sesai).
O contrato superfaturado teve como objetivo a prestação de serviços continuados de transportes (locação de veículos com motoristas), nos modelos pick-up, pick-up para urgência e emergência em Plantão Noturno, carro popular e van, todos destinados a atender ao Distrito Especial de Saúde Indígena na Bahia, conforme especificações e quantitativos estabelecidos no Termo de Referencia e no Edital de Licitação.
A intenção do grupo que montou o processo era ter em mãos a Ata de Registros de Preços, o que permitiria atuar em todo o Brasil em licitações públicas com o mesmo objeto.
A Ata é um recurso muito utilizado por administradores dispostos a fugir de concorrências e colocar contratos bilionários nas mãos de companheiros.
A documentação e as gravações que trazem os registros do computador do escritório de advocacia chegaram às mãos da Polícia Federal e ao Ministério Público em São Paulo.
O assunto deu munição para a oposição sair para o contra-ataque. Nos corredores do Congresso, as denúncias circularam como bombas na última sexta-feira.
O líder do PPS na Câmara, deputado federal Rubens Bueno (PR), acionou o Tribunal de Contas da União (TCU) pedindo auditoria completa nos contratos da locadora de veículos San Marino com o Governo Federal.
O senador tucano Álvaro Dias (PR) também não deixou barato e vai pedir ao Ministério Público, que se aprofunde nas investigações sobre as denúncias envolvendo Padilha e outros prováveis participantes do esquema.
O presidente do PSB de São Paulo, deputado federal Marcio França, também vai ao Ministério Público paulista e PF, onde toda a documentação da denúncia foi entregue, pedir urgência nas investigações.
Cautela leva pregão para Salvador
Locadora de veículos San Marino, a empresa vencedora, cobriu despesas. O pregão foi realizado na Bahia para evitar grandes empresários brasilienses.
A quantidade de carros exigidos também limitava a participação no edital de megaempresas com fortes estruturas e elevado aporte de capital.
Assessora coordenou o processo
Com perfume francês, escarpin e roupas coladas marcando a silhueta, Beatris Gautério de Lima, assessora da Secretaria de Saúde do Distrito Federal, circulava com desenvoltura entre o gabinete do ministro Alexandre Padilha e a Sesai – órgão que cuida da área indígena no Ministério da Saúde. Beatris Gautério foi emprestada ao ministro Alexandre Padilha para coordenar a utilização de documentos que seriam produzidos pelo escritório de advocacia que tem Jaques Fernando Reolon à frente.
A licitação, na forma de pregão presencial, foi realizada na Bahia, no Grande Hotel, onde Beatris Gautério recebeu diárias do Ministério da Saúde para dirigir o certame que teve como vencedora e beneficiada a locadora de veículos San Marino.
Carro à disposição
A empresa vencedora pagou todas as despesas de hospedagem e transportes dos concorrentes, além de colocar um carro à disposição de Beatris Gautério durante sua estada em Salvador.
O pregão foi realizado na Bahia para evitar os olhos de grandes empresários brasilienses.
A quantidade de carros exigidos também limitava a participação no edital de megaempresas com fortes estruturas e elevado aporte de capital.
No escritório Jacoby Fernandes e Reolon Advogados e Associados, Beatris Gautério tinha super-poderes.
Falava em nome do então ministro da Saúde, Alexandre Padilha, do secretário especial de Saúde Indígena, Antonio Alves de Sousa, e do diretor de departamento, Fernando Rodrigues da Rocha, enquanto estaria sendo montado o edital.
Do grupo, participariam ainda uma advogada com primeiro nome Karina e os representantes legais da San Marino, Darcio Maria de Lacerda e seus filhos Gustavo Lacerda e Guilherme Lacerda.
Todos com a mesma finalidade: abocanhar contratos que, com as adesões às atas, podem chegar ao montante de mais de R$ 1,7 bilhão.
A tomada de preços obrigatória teria sido realizada com três empresas do mesmo proprietário, Darcio Lacerda.
Com a fiscalização da Advocacia Geral da União (AGU) burlada e já com edital direcionado por Beatris Gautério, pelos irmãos Gustavo e Guilherme Lacerda e pelo advogado Jaques Fernando Reolon, teria surgido o primeiro obstáculo para efetivar o pregão.
Furou o esquema
A empresa Asatur Transportes LTDA, de Rondônia, furou o esquema montado para a San Marino abocanhar a mamata por todo o país.
O valor do serviço prestado pela Asatur para cada caminhonete era de R$ 10 mil mensais, inferior ao da empresa envolvida na fraude. Foi aí que começou o desespero dentro do ministério.
Um perfil muito especial
Perfume francês, escarpin e roupas coladas marcando a silhueta são marcas de Beatris Gautério de Lima, assessora da Secretaria de Saúde do Distrito Federal que foi cedida ao Ministério da Saúde.
Ela chegou a viajar a Salvador para conduzir o processo que levou à elaboração do edital que abriu caminho para a licitação hoje colocada sob suspeita da Polícia Federal e do Ministério Público.
Com ordem de cima, valores são reduzidos
No escritório de advocacia, o grupo se recusava a baixar o valor das locações das caminhonetes. Beatris Gautério teria sido chamada pelo ministro que queria suspender a licitação pois, com o resultado de Roraima e Rondônia, Padilha temia que tudo poderia terminar em escândalo. Beatris voltou ao escritório e teria narrado conversa que teve com o ministro e Fernando Rodrigues da Rocha:
“O ministro disse que vai cancelar a licitação. Temos que baixar o preço. Ele acha que vai dar problema”.
Darcio Lacerda, proprietário da San Marino, vencedora do pregão, no primeiro momento, não teria concordado em baixar o preço, mas Jacoby Fernando o teria convencido.
O valor do aluguel das caminhonetes caiu de R$ 17.630 para R$ 16.500 mensais. Em compensação, o valor do Gol/Volkswagen permaneceu em R$ 12.970 mensais, para um contrato de 5 anos.
Mas a van, que na licitação de Rondônia teve o valor de R$ 13 mil, no contrato montado pelo grupo para um veículo com as mesmas especificações, custaria aos cofres públicos, R$20 mil.
A ata de preços com esses valores percorreu todo Brasil superfaturada em três a quatro vezes o valor real de mercado.
Beatris Gautério falava nas reuniões, bem como para o investidor chamado para garantir o certame, que 15% do valor bruto da fatura seriam divididos entre o escritório e o ministro Alexandre Padilha.
O que ela não definia era quanto o ministro receberia dos 15%.
Através de contatos por telefone e por e-mail, criado exclusivamente para tratar da montagem do edital, foram distribuídas as senhas de acesso para todos os envolvidos na fraude.
Só um detalhe: os computadores deixaram os números dos IPs registrados em todos os documentos, conforme atesta um empresário.
Fonte: Da redação do Jornal de Brasília
Nenhum comentário:
Postar um comentário