domingo, 9 de março de 2014

Vannuchi: pressa em projeto sobre protestos pode despertar 'espíritos conservadores'

Lei 'anti-vandalismo'


Analista da Rádio Brasil Atual faz ponderação sobre necessidade de regime de urgência para proposta sobre manifestações que governo envia ao Congresso este mês, com expectativa de aplicá-lo no Mundial
 
por Redação RBA publicado 09/03/2014 08:15

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Texto do Senado sobre terrorismo foi tido como perigoso pelo governo, que decidiu apresentar alternativa

Sâo Paulo – “É preciso de fato uma nova lei no Brasil, ou as leis existentes, com uma nova orientação à polícia, com mais treinamento, não poderiam dar conta do problema? O Código Penal tem artigos que já garantem a penalização daqueles que agridem, que matam, que promovem danos ao patrimônio.”

 A ponderação é do cientista político Paulo Vannuchi, analista da Rádio Brasil Atual.

Ele se refere à intenção do governo de enviar ao Congresso projeto de lei que tenha como objeto o direito de manifestações. 

Esta semana, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, informou que o texto está sendo finalizado e deve ser encaminhado ao Legislativo ainda nesta quinzena. 

Ele adiantou que haverá restrições quanto ao uso de máscaras em manifestações e obrigatoriedade de notificação prévia das autoridades sobre a realização de marchas.

Ao comentar o tema, Vannuchi observa que essa discussão, associada ao ambiente de manifestações de junho para cá, com a presença de black blocs e mascarados, carrega o risco de estimular reações do segmento policial e da parcela conservadora da sociedade. 

“Eles vêm sempre pedir leis mais duras, afirmam que as leis atuais seriam brandas, e abrem-se brechas para a defesa de penas de 100 anos, 200 anos, prisão perpétua e pena de morte. E claro que se você endurece as leis há também danos à liberdade de manifestação, mais controle, mais vigilância”, argumenta.

O analista político avalia, apesar disso, que o projeto é cuidadoso, embasado em linguagem democrática e tem como justificativa assegurar o direito constitucional de manifestação de todos, e de impedir o uso de instrumentos que são indícios de prática violenta.

 “Alguém que tem coquetel motolov, ninguém controla se esse fogo vai eventualmente matar alguém. Facas, pedras. O cinegrafista Santiago Andrade morreu depois de ter sido atingido por um rojão. Mas carrega o que chama de choque de direitos. No caso, o direito de manifestação e o direito à vida”, diz.


Ele entende que a elaboração do texto leva em conta um apanhado de experiências de vários países. 


Vannuchi cita o exemplo do Estados Unidos, que criou leis para lidar com o uso de máscaras pela Klu Klux Klan – a seita racista cujos integrantes se vestiam com mantas e capuzes para espancar negros e assassiná-los em fogueiras – para mencionar que a Constituição brasileira garante a expressão do pensamento e coíbe o anonimato.

 “O uso de máscara em manifestação é antidemocrático, quem usa máscara é quem age lutando contra uma ditadura – e o Brasil não tem –, ou quem age para cometer crimes, homicídios, sequestros. Inclusive mascarados atuam para assassinar indígenas, lideranças sem-terra”, diz.


A morte de Santiago Andrade, durante uma manifestação ocorrida em fevereiro no Rio de Janeiro, foi justamente o motivador do debate sobre uma regulamentação das manifestações públicas. 

Inicialmente, senadores trabalharam para aprovar com rapidez o Projeto de Lei 499, de 2013, que tipifica o crime de terrorismo, com penas de até 30 anos. 

O PL estabelece ainda reclusão de 24 a 30 anos se a ação terrorista resultar em morte. Também considera os crimes previstos inafiançáveis e insuscetíveis de graça, anistia ou indulto. 

E o condenado só terá direito ao regime de progressão após o cumprimento de quatro quintos (4/5) do total da pena em regime fechado.


Mas, a pedido do governo, este debate foi interrompido no Senado. À época, o ministro da Justiça argumentou que era necessário promover uma avaliação criteriosa do tema e evitar distorções. 

Ele apresentou a ponderação de que os termos utilizados na proposta eram genéricos, o que daria margem a abusos por parte de agentes públicos.

Em relação ao novo texto, a expectativa do governo é vê-lo aprovado em um intervalo de no máximo 45 dias, a tempo de que seja utilizado já durante o Mundial, que será aberto em 12 de junho. 

Para isso, o Executivo pedirá tramitação em regime de urgência. Vannuchi, questiona, entretanto, se um projeto dessa complexidade não exige uma tramitação lenta, para que seja ouvida a sociedade, como as centrais sindicais, os movimentos, as universidades brasileiras.




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