Os chamados conflitos fundiários seguem uma estratégia socialista,
driblando o Judiciário, isto é, a lei. Assustador é que o rompimento do
Estado de Direito seja apoiado também por figurões do governo, como o
tétrico Gilberto Carvalho, espião de Lula no palácio. Quando não há
garantias sobre a propriedade, a democracia mesma corre perigo. Já
vivemos uma ditadura consentida?
Editorial do Estadão vai ao ponto:
Ganha terreno no debate público a ideia de
que os conflitos fundiários devem ser resolvidos à margem da lei - e,
muitas vezes, ao arrepio dela. Sob o gelatinoso argumento da "questão
social", defende-se que a propriedade, por mais documentada que seja,
nada vale ante a urgente necessidade de "reparação histórica", o que
obrigaria os proprietários formais a restituir a terra àqueles que
seriam seus "legítimos" donos - índios e quilombolas.
Se tal ideia fosse
subscrita apenas pelos ditos movimentos sociais, amparados por suas
convicções socialistas, não haveria nenhum problema, uma vez que, numa
democracia, é lícito defender qualquer ponto de vista, inclusive os
esdrúxulos. No entanto, gente graúda do governo federal resolveu apoiar
essa flagrante ilegalidade, travestindo-a de "justiça" - não a Justiça
institucional, que garante o Estado de Direito, e sim aquela que aparece
nos gritos de guerra dos invasores de terra.
Em recente evento em Brasília, um seminário intitulado "Conflitos
Fundiários em Debate", o ministro-chefe da Secretaria-Geral da
Presidência da República, Gilberto Carvalho, corroborou uma tese segundo
a qual as disputas por terra entre seus legítimos donos e os chamados
"povos tradicionais" que a reivindicam deveriam ser resolvidas não mais
no âmbito do Judiciário, e sim por meio de "mediação". Ele chegou a
defender a criação de uma "escola de mediadores".
Também presente ao encontro, um importante funcionário do Ministério
da Justiça, o secretário de Reforma do Poder Judiciário, Flávio Caetano,
declarou que é preciso "mudar a cultura jurídica do País, que é a
cultura do processo, do litígio" - como se o legítimo proprietário da
terra não tivesse o direito óbvio de recorrer à Justiça para se queixar
de quem a invadiu.
A opinião de Carvalho e de Caetano respaldou-se em estudos das
organizações não governamentais Instituto Pólis e Terra de Direitos,
ambas dedicadas a cobrar a regularização de territórios que, em sua
visão, pertencem a índios e quilombolas.
Em tais pesquisas, encomendadas
pelo Ministério da Justiça, a retórica é poética - um dos relatórios
diz que o objetivo é "construir um caminho dialógico para a
democratização da justiça" -, mas, na prática, o palavrório a respeito
de "mediação" significa criar maneiras de driblar o Judiciário para
favorecer os "povos tradicionais".
Em seu discurso no seminário, Carvalho chegou a lamentar que o
"aparelho de Estado" brasileiro, a começar pelo Executivo, que ele
representa, seja obrigado a cumprir a "tarefa ingrata, inglória" de
fazer valer o que está na lei, mesmo uma lei com a qual "sabidamente nós
não podemos estar de acordo".
O ministro disse ainda que "há uma
mentalidade no aparelho de Estado que se posiciona claramente contra
tudo aquilo que é insurgência", como se não fosse obrigação do Estado
combater aqueles que ameaçam a ordem democrática. Carvalho expressa,
assim, um mal-estar do governo em relação ao próprio Estado de Direito.
A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) não demorou a
se manifestar a respeito desse absurdo. Dizendo-se "perplexa", a
entidade expressou especial preocupação com "a defesa, por autoridades,
da submissão de conflitos de enorme complexidade a mediadores
ideologicamente comprometidos, em substituição a magistrados imparciais,
protegidos por garantias constitucionais e selecionados com
impessoalidade, por meio de rigorosos concursos públicos".
A respeito das tais "escolas de mediadores" sugeridas por Carvalho, a
CNA observou que o ministro não esclareceu "qual será o currículo e
quem serão os professores desses futuros substitutos de juízes". Nem é
preciso muita imaginação para supor que tal escola teria como cartilha
os alegados direitos históricos dos índios e dos quilombolas sobre as
terras.
Tem razão a CNA ao reagir com firmeza. O governo federal tem sido
omisso em relação às ordens judiciais para a reintegração de posse de
terras invadidas por supostos índios - como acontece neste momento no
sul da Bahia -, e agora apela à antropologia de botequim para questionar
o próprio direito constitucional à propriedade.
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