Por: Senador Rodrigo Rollember
PSB/DF e líder do partido no Senado
Brasília não é para amadores. Tão grande quanto o desafio de construí-la é o desafio de preservá-la. O desenho generoso de uma cidade que nasceu plural, pensada para todos, corre o risco de virar um grande borrão, pensado para poucos. Com propostas que ameaçam a concepção original e o tombamento da capital, o Governo do Distrito Federal aprovou no Conselho de Planejamento Territorial e Urbano (Conplan), com o repúdio da sociedade, o Projeto de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCub).
O projeto prevê a criação e a expansão de bairros dentro e bem próximos do Plano Piloto, o aumento de gabarito dos prédios do setor Noroeste, a extensão dos setores centrais da área tombada, a privatização de lotes hoje destinados a escolas e equipamentos públicos (no Cruzeiro e Sudoeste), além de alterações de usos da orla do Lago Paranoá.
O que deveria ser um bem-vindo plano de preservação mais parece um plano de estímulo à especulação imobiliária para uma superocupação urbana e loteamentos em áreas verdes públicas. Além disso, fere os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil desde 1987, como país signatário da Convenção do Patrimônio Mundial, e pode levar à perda do título de Brasília como Patrimônio Cultural da Humanidade, concedido pela Unesco.
Como disse a jornalista Regina Rocha em matéria no Portal 2014, “imagine um dia a cidade de Veneza fechando seus canais só para aumentar a área disponível a novos empreendimentos”. Ou ainda Paris, a cidade luz, autorizando à iniciativa privada novas construções bem ao lado da Torre Eiffel e hotéis às margens do Sena que, provavelmente, funcionariam como flats residenciais que impediriam — ou inibiriam — o acesso público.
Imagine a vista do horizonte da nossa capital roubada por prédios de alto gabarito, ferindo o “céu de Brasília, traço do arquiteto”, como eternizaram os músicos Djavan e Caetano Veloso, que, como nós, gostam tanto dela assim. Essa possibilidade trágica pode acontecer com a cidade se o PPCub for aprovado pela Câmara Legislativa com a anuência do Iphan. Trata-se de verdadeira afronta à concepção de Brasília e à qualidade de vida da população.
O governo insiste em empurrar a proposta com um conturbado processo de encaminhamento que levou até a manifestação de repúdio dos representantes da Universidade de Brasília, do Instituto de Arquitetos do Brasil e do Instituto Histórico e Geográfico do DF, que participavam do grupo técnico de revisão do projeto. Depois de terem analisado apenas duas das 72 tabelas do PPCub, foram surpreendidos com o anúncio da votação do projeto no Conplan. Pior ainda, a proposta enviada pelo GDF incluía novos artigos que nem sequer eram do conhecimento do grupo de trabalho.
Além desse golpe na democracia e da ameaça à capital, o PPCub traz sérios impactos ambientais, pois autoriza construções muito próximas a unidades de conservação ambiental, afetando a Bacia do Paranoá e o Parque Nacional de Brasília. Até o momento, o governo nem sequer apresentou os estudos técnicos que comprovem a viabilidade do PPCub. Nem mesmo as recomendações feitas pela missão da Unesco em Brasília foram consideradas. O PPCub está suspenso, por enquanto, graças à atuação enérgica do Ministério Público e do Tribunal de Justiça do DF.
A cidade precisa se apropriar dessa discussão. Tenho acompanhado o extraordinário trabalho cívico dos brasilienses nas redes sociais, em sua perspectiva contestatória, mas também propositiva. O que comprova o quanto Brasília está ávida de um destino cidadão, para além do monumento oficial.
Uma cidade deve ser feita por sua gente, vivida por sua gente e pensada por sua gente. O estado de pertencimento e apropriação da ideia libertária que Brasília sugere nos incita a intervir, amorosamente, para dar sentido ao meio e nos sentirmos íntegros e integrados a esse meio. Não somos partes, não estamos fragmentados em conflito com o traçado, nem em confronto com os trajetos. Somos a linha e o desenho de novas realidades.
Em seu discurso dedicado aos operários candangos na véspera da inauguração de Brasília, Juscelino Kubitschek disse que a chave desta cidade “é tão minha quanto vossa, quanto de todos os brasileiros”, num vínculo profundo entre criador e criatura, entre o construtor e os construtores. Palavras que nos orientam no sentido maior da continuidade do sonho concreto, que não ficou parado em um tempo histórico. Precisamos, hoje, retomar a cidade como lugar para todos, como legado que herdamos para devolvê-lo melhor.
PSB/DF e líder do partido no Senado
Brasília não é para amadores. Tão grande quanto o desafio de construí-la é o desafio de preservá-la. O desenho generoso de uma cidade que nasceu plural, pensada para todos, corre o risco de virar um grande borrão, pensado para poucos. Com propostas que ameaçam a concepção original e o tombamento da capital, o Governo do Distrito Federal aprovou no Conselho de Planejamento Territorial e Urbano (Conplan), com o repúdio da sociedade, o Projeto de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCub).
O projeto prevê a criação e a expansão de bairros dentro e bem próximos do Plano Piloto, o aumento de gabarito dos prédios do setor Noroeste, a extensão dos setores centrais da área tombada, a privatização de lotes hoje destinados a escolas e equipamentos públicos (no Cruzeiro e Sudoeste), além de alterações de usos da orla do Lago Paranoá.
O que deveria ser um bem-vindo plano de preservação mais parece um plano de estímulo à especulação imobiliária para uma superocupação urbana e loteamentos em áreas verdes públicas. Além disso, fere os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil desde 1987, como país signatário da Convenção do Patrimônio Mundial, e pode levar à perda do título de Brasília como Patrimônio Cultural da Humanidade, concedido pela Unesco.
Como disse a jornalista Regina Rocha em matéria no Portal 2014, “imagine um dia a cidade de Veneza fechando seus canais só para aumentar a área disponível a novos empreendimentos”. Ou ainda Paris, a cidade luz, autorizando à iniciativa privada novas construções bem ao lado da Torre Eiffel e hotéis às margens do Sena que, provavelmente, funcionariam como flats residenciais que impediriam — ou inibiriam — o acesso público.
Imagine a vista do horizonte da nossa capital roubada por prédios de alto gabarito, ferindo o “céu de Brasília, traço do arquiteto”, como eternizaram os músicos Djavan e Caetano Veloso, que, como nós, gostam tanto dela assim. Essa possibilidade trágica pode acontecer com a cidade se o PPCub for aprovado pela Câmara Legislativa com a anuência do Iphan. Trata-se de verdadeira afronta à concepção de Brasília e à qualidade de vida da população.
O governo insiste em empurrar a proposta com um conturbado processo de encaminhamento que levou até a manifestação de repúdio dos representantes da Universidade de Brasília, do Instituto de Arquitetos do Brasil e do Instituto Histórico e Geográfico do DF, que participavam do grupo técnico de revisão do projeto. Depois de terem analisado apenas duas das 72 tabelas do PPCub, foram surpreendidos com o anúncio da votação do projeto no Conplan. Pior ainda, a proposta enviada pelo GDF incluía novos artigos que nem sequer eram do conhecimento do grupo de trabalho.
Além desse golpe na democracia e da ameaça à capital, o PPCub traz sérios impactos ambientais, pois autoriza construções muito próximas a unidades de conservação ambiental, afetando a Bacia do Paranoá e o Parque Nacional de Brasília. Até o momento, o governo nem sequer apresentou os estudos técnicos que comprovem a viabilidade do PPCub. Nem mesmo as recomendações feitas pela missão da Unesco em Brasília foram consideradas. O PPCub está suspenso, por enquanto, graças à atuação enérgica do Ministério Público e do Tribunal de Justiça do DF.
A cidade precisa se apropriar dessa discussão. Tenho acompanhado o extraordinário trabalho cívico dos brasilienses nas redes sociais, em sua perspectiva contestatória, mas também propositiva. O que comprova o quanto Brasília está ávida de um destino cidadão, para além do monumento oficial.
Uma cidade deve ser feita por sua gente, vivida por sua gente e pensada por sua gente. O estado de pertencimento e apropriação da ideia libertária que Brasília sugere nos incita a intervir, amorosamente, para dar sentido ao meio e nos sentirmos íntegros e integrados a esse meio. Não somos partes, não estamos fragmentados em conflito com o traçado, nem em confronto com os trajetos. Somos a linha e o desenho de novas realidades.
Em seu discurso dedicado aos operários candangos na véspera da inauguração de Brasília, Juscelino Kubitschek disse que a chave desta cidade “é tão minha quanto vossa, quanto de todos os brasileiros”, num vínculo profundo entre criador e criatura, entre o construtor e os construtores. Palavras que nos orientam no sentido maior da continuidade do sonho concreto, que não ficou parado em um tempo histórico. Precisamos, hoje, retomar a cidade como lugar para todos, como legado que herdamos para devolvê-lo melhor.
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