Nesta terça-feira ocorreu o evento
“Comunicação & Mercado no Brasil: Desafios e Oportunidades”, no
Ibmec da Barra. O diretor do Ibmec, Fernando Schuler, fez a apresentação
inicial e passou a palavra a Patrícia Blanco, presidente do Instituto
Palavra Aberta. Houve a assinatura do termo de cooperação que criou a
cátedra Ibmec Palavra Aberta de Liberdade de Expressão, uma iniciativa
louvável que nasceu desta parceria em prol da luta constante pelo
direito de se expressar em nosso país.
O professor Eugênio Bucci foi o primeiro
palestrante, e defendeu de forma veemente que nenhum tipo de censura
prévia pode existir quando se trata de expressão individual. O que
devemos é fortalecer a responsabilidade de cada um ao usar tal direito,
que não vem do estado – este deve apenas garanti-lo, ou seja, proteger
aqueles que desejam se expressar. Caso haja alguma ofensa maior ou
abuso, isso deve ser apurado somente depois.
Bucci lembrou que a imprensa, no Brasil,
veio depois da censura. Ou seja, a Corte já trouxe a imprensa oficial
quando havia um jornal circulando em Londres específico sobre o Brasil, e
era proibido ou clandestino por aqui. Combater a censura prévia é
tarefa fundamental em nosso país.
A palestrante seguinte foi a ministra
Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, que lançou mão da literatura
para tentar definir um conceito mais amplo de liberdade. Citou Cecília
Meireles, Clarice Lispector e Guimarães Rosa, e resumiu a liberdade como
um “sentimento”. Liberdade seria algo muito maior do que aquilo
presente nas leis, e o papel do estado é justamente garantir tais leis,
mas não a liberdade nesse lato senso.
Para Cármen Lúcia, o conceito de justiça
muda com o tempo, e as leis devem se adaptar a isso. Cada sociedade terá
seus próprios valores, e isso precisa ser levado em conta. Só não ficou
claro, para mim, quem teria esse papel, pois uma das coisas que mais
temo é exatamente juízes, especialmente ministros do SFT, com uma
inclinação mais ativista. O papel legislativo pertence ao Congresso e ao
Senado, e o STF é o guardião da Constituição.
O segundo painel contou com palestras de
Fábio Barbosa, presidente da Abril, Paulo Tonet Camargo, das
Organizações Globo, e de Marcel Leonardi, diretor de Políticas Públicas
da Google no Brasil.
Barbosa destacou a importância do tripé
indissociável formado pela liberdade de imprensa, a livre iniciativa e a
democracia. O anunciante usa a comunicação e a publicidade para levar
aos consumidores informação sobre seus produtos, e isso garante a
independência jornalística dos veículos de imprensa, que por sua vez é
necessária para manter a democracia.
Barbosa citou ainda duas frases usadas
pela presidente Dilma (ao menos na retórica) que definem muito bem a
importância da liberdade de imprensa: “O único controle que aceito é o
remoto”, lembrando que cada um é livre para simplesmente mudar de canal,
ou comprar outro jornal ou revista, caso não aprecie aquele conteúdo.
E: “Prefiro os ruídos da imprensa livre ao silêncio ensurdecedor dos
porões da ditadura”. Cacofonia, risco de excessos que serão julgados a
posteriori, tudo isso é muito mais saudável do que censura prévia.
Outro ponto abordado por Barbosa e que
deve ser levado em conta pelos liberais brasileiros é que a desigualdade
material em si não é o problema, mas sim a ausência de condições
mínimas de oportunidade para todos. Falar em meritocracia, algo de
extrema importância, ignorando que falta saneamento básico e educação
básica para milhões de brasileiros acaba soando incompleto. Garantir
tais direitos aos mais pobres seria crucial para um modelo mais justo,
segundo Barbosa.
Tonet colocou muita ênfase nos valores da
sociedade, citando como exemplo de uma nação afundada em crise por
falta de valores sólidos nossa vizinha Argentina. As pessoas precisam
parar de delegar tanto ao estado, pois as mudanças começam por cada um
de nós, e é a própria sociedade que precisa resolvê-los.
Tonet alertou ainda para a importância da
pluralidade de ideias, para combater o pensamento único, maior ameaça
às liberdades. Incluiu o politicamente correto na lista dessas ameaças,
justamente por aderir a essa Verdade única que se torna intolerante.
Lembrou que o problema não é parcialidade – muitos jornais nasceram de
partidos políticos. O problema é tentar impedir o outro de emitir sua
própria opinião, ou, como fizeram nas manifestações, impedir o trabalho
de jornalistas na cobertura dos acontecimentos.
O povo precisa conviver com as
diferenças, respeitar a opinião alheia de forma civilizada, ser mais
tolerante, e participar mais do processo de mudanças. Tanto Tonet como
Barbosa concordaram que essas mudanças em busca de um país melhor e mais
livre devem ocorrer pelas vias institucionais, ou seja, preservando-se a
democracia. Para Tonet, o desenvolvimento que queremos não é apenas
crescimento econômico, e jamais devemos nos mirar no exemplo chinês.
Queremos desenvolvimento econômico e social, preservando as nossas
liberdades.
Marcel, da Google, lembrou que palavras
bonitas em documentos oficiais não garantem a liberdade de fato, e que a
primeira vez em que a expressão “dignidade da pessoa humana” apareceu
no Brasil foi no AI-5 da ditadura. Outro ponto que levantou foi a mania
brasileira de se ofender muito facilmente. Liberdade de expressão é
reconhecer que teremos de conviver com ideias até ofensivas para nós, e à
exceção de coisas realmente abjetas, a liberdade deve prevalecer.
Citou um exemplo sintomático do tipo de
mentalidade que coloca em risco nossa liberdade de expressão: uma mulher
que havia feito comercial para uma empresa no passado, e hoje era
contratada pelo concorrente, e queria retirar da busca do Google toda
referência ao seu passado na outra empresa.
Por fim, defendeu o Marco Civil da
Internet como uma lei importante para preservar certas liberdades de
comunicação, lembrando que as prerrogativas que existem de intervenção
estatal imediata já eram contempladas pelas leis anteriores, e que o
Marco apenas reconheceu isso para as novas plataformas. Mas elogiou
principalmente a noção de que a plataforma não pode se responsabilizar
por todo o conteúdo publicado pelos usuários, o que seria um impeditivo
ao seu funcionamento adequado.
De forma geral, foi um ótimo evento, além
de uma excelente iniciativa do Ibmec e do Instituto Palavra Aberta.
Sabemos como é delicado preservar uma ampla liberdade de expressão e
imprensa, especialmente em um país com pouca tradição e cultura da
liberdade. A máxima atribuída a Voltaire não encontrou muito eco por
aqui ainda: “Não concordo com uma palavra do que dizes, mas defenderei
até a morte seu direito de dizê-las”.
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