As pesquisas eleitorais recentes mostram Dilma Rousseff em
queda. Quando se está caindo, a gente normalmente diz opa!. Não creio, porém,
que Dilma vá dizer opa! e recuperar o equilíbrio. Além dos problemas de seu governo,
ela é mal aconselhada por Lula nos dois temas que polarizam a cena política:
Petrobrás e Copa do Mundo.
São cada vez mais claras as evidências de que se perdeu
muito dinheiro em Pasadena. Lula, no entanto, não acredita nas evidências, mas
nas versões. Se o seu conselho é partir para a ofensiva quando se perdem quase
US$ 2 bilhões, a agressividade será redobrada quando a perda for de US$ 4
bilhões e, se for de US$ 6 bilhões, o mais sábio será chegar caindo de porrada
nos adversários antes que comecem a reclamar.
Partir para a ofensiva na Copa do Mundo? Não é melhor deixar
isso para os atacantes Neymar e Fred? Desde o ano passado ficou claro que
muitas pessoas não compartilham o otimismo do governo nem consideram acertada a
decisão de hospedar a Copa.
O governo acha que sufoca as evidências. O próximo passo
desse voluntarismo é controlar as evidências. O papel do IBGE e do Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), por exemplo, começa a ser deformado pelo
aparelhamento político. Pesquisas que contrariam os números de desemprego são
suspensas. E o Ipea foi trabalhar estatísticas para Nicolás Maduro, que
acredita ver Hugo Chávez transmutado em passarinho e, com essa tendência ao
realismo mágico, deve detestar os números.
Controlar as evidências, determinar as sentenças pela
escolha de ministros simpáticos à causa, tudo isso é a expressão de uma vontade
autoritária que vê a oposição como vê os números desfavoráveis: algo que deva
ser banido do mundo real. A visão de que o País seria melhor sem uma oposição,
formada por inimigos da Petrobrás e por gente que torce contra a Copa,
empobrece e envenena o debate político.
Desde o mensalão até agora o PT decidiu brigar com os fatos,
e isso pode ter tido influência na queda de Dilma nas pesquisas. O partido foi
incapaz, embora figuras como Olívio Dutra o tenham feito, de reconhecer seus
erros. Está sendo incapaz de admitir os prejuízos que sua política de alianças
impôs à Petrobrás ou mesmo que a Copa do Mundo foi pensada num contexto de
crescimento e destinava-se a mostrar nossa exuberância econômica e capacidade
de organização a todo o planeta. Gilberto Carvalho revelou sua perplexidade:
achava que a conquista da Copa seria saudada por todos, mas as pessoas atacaram
o governo por causa dela.
Bom dia, Cinderela. O mundo mudou. Dilma e o PT não
perceberam, no seu sono, que as condições são outras. Brigar com os fatos num
contexto de crescimento econômico deu a Lula a sensação de onipotência, uma
crença do tipo "deixa conosco que a gente resolve na conversa". Hoje,
em vez de contestar fatos, o PT estigmatiza a oposição como força do atraso.
Ele se comporta como se a exclusão dos adversários da cena política e cultural
fosse uma bênção para o Brasil. A concepção de aniquilar o outro não é vivida
com culpa por certa esquerda, porque ela se move num script histórico que prevê
o aniquilamento de uma classe pela outra. O que acabará com os adversários é a
inexorável lei da história, eles apenas dão um empurrão.
Sabemos que a verdade é mais nuançada. O governo mantém
excelentes relações com o empresariado que financia por meio do BNDES e com os
fornecedores de estatais como a Petrobrás. Não se trata de luta de classes, mas
de quem está se dando bem com a situação contra quem está ou protestando ou
pedindo investigações rigorosas contra a roubalheira, na Petrobrás ou na Copa.
A aliança do governo é aberta a todos os que possam ser
controlados, pois o controle é um objetivo permanente. Tudo o que escapa,
evidências, vozes dissonantes, estatísticas indesejáveis, tudo é condenado à
lata de lixo da História. Felizmente, a História não se faz com líderes que
preferem partir para cima a dialogar diante de evidências negativas, tanto na
Petrobrás como na Copa ou no mensalão. Nem com partidos incapazes de rever sua
tática diante de situações econômicas modificadas.
Dilma, com a queda continuada nas pesquisas, sai da área de
conforto e cai no mundo em que os candidatos dependem muito de si próprios e
não contam com vitória antecipada pelo peso da máquina. Será a hora de pôr de
novo em xeque a onipotente tática de eleger um poste. Nem o poste nem seu
inventor hoje conseguem iluminar sequer um pedaço de rua. Estão mergulhados no
escuro e comandarão um exército de blogueiros amestrados para nublar as redes
sociais. Com a máquina do Estado, o prestígio de Lula, muita grana em
propaganda e na própria campanha eleitoral, o governo tem um poderoso aparato
para enfrentar a realidade. Mas essa abundância de recursos não basta. Num
momento como este no País, será preciso horizonte, olhar um pouco adiante das
eleições e estabelecer um debate baseado no respeito às evidências.
Esse é um dos caminhos possíveis para recuperar o interesse
pela política. No momento, a resposta ao cinismo é a indiferença com forte
tendência ao voto em branco ou nulo. Embora a oposição também seja parte do
jogo, a multidão que dá as costas para a escolha de um presidente é uma obra do
PT que subiu ao poder, em 2002, prometendo ampliar o interesse nacional pela
política, mas conseguiu, na verdade, reduzi-lo dramaticamente. Para quem se
importa só com a vitória eleitoral, essa questão da legitimidade não conta. Mas
é o tipo de cegueira que nos mantém no atraso político e na ilusão de que
adversários são inimigos. O PT comanda um estranho caso de governo cujo
discurso nega o próprio slogan: Brasil, um país de todos. De todos os que
concordam com a sua política.
Até nas relações exteriores o viés partidário sufocou o
nacional, atrelando o País aos vizinhos, alguns com sonhos bolivarianos, e
afastando-o dos grandes centros tecnológicos. Contestar esse caminho quase
exclusivo é defender interesses americanos; denunciar corrupção na empresa é
ser contra a Petrobrás; assim como questionar a Copa é torcer contra o Brasil.
Bom dia, Cinderela, acorde. Em 2014 você pode se afogar nos
próprios mitos.
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