Artigos - Governo do PT
Em 1º de janeiro de 2003 a inquisição petista deve ter embarcado em Alcântara rumo a algum asteróide distante. O outrora refinado faro não capta mau cheiro sequer quando vem da sola do próprio sapato.
O Partido dos Trabalhadores, há bem mais de uma década, nada de braçada nas águas revoltas da nossa política. Isso não aconteceu por sorte ou acaso. Foi perícia coletiva, dentro de bem traçado planejamento e perfeita execução. De um lado, o partido se constituía na tradição dos partidos de massa, rara entre nós, e aplicava com tenacidade os métodos de infiltração que o fizeram presente e ativo nos corpos sociais e nas instituições do Estado.
De outro, partia para o ataque a seus opositores sem tréguas nem misericórdia. O objetivo era produzir a demolição moral de quem estivesse em seu caminho. Pela cartilha petista, escândalo no território inimigo era e continua sendo coisa que ou existe ou se fabrica. Onde houvesse o mais tênue fio de fumaça da suspeita o partido era o primeiro a chegar, com um tonel de gasolina.
Impoluto,
apontava o dedo acusador para as privatizações, por exemplo, com a
autoridade moral de quem jamais o usou para contar dinheiro mal-havido.
Quando seus líderes clamavam por CPIs para investigar as privatizações e
a base do governo FHC não os apoiava, roíam-me desconfianças e
suspeições. "Ai tem!", pensava eu. Se o nariz petista acusava algo, se
sua alma se ouriçava, se seu fino tato acusava, era certo que algo
havia. Afinal, eles sabiam tudo, mas tudo mesmo, sobre o governo dos
outros.
Foi
assim que o partido, sem muito esforço diga-se, destruiu moralmente os
governos Collor e Sarney. Foi assim que o partido requereu contra o
governo FHC mais de duas dezenas de CPIs. As investidas foram tantas,
tão contínuas e violentas que o prestígio do ex-presidente despencou dos
elevados índices a que chegara nos pleitos que venceu. Quanto de
verdade havia naquelas acusações?
O
PT atribuía a falta de provas cabais ao engavetamento dos processos na
Procuradoria Geral da República e à recusa da base do governo em
conceder à oposição os votos necessários à formação das CPIs.
A
posse de Lula seria, também, a hora da verdade para sua oposição? Eu
pensava que sim. Os petistas não mais dependiam das CPIs para investigar
e exibir as negociatas alheias. Passavam a dispor de todos os meios de
investigação, servidos em bandeja de prata, com guarnição de veludo
azul. Ministério da Justiça, Controladoria-Geral da União, ABIN, Polícia
Federal, Receita Federal, eram apenas alguns dentre os muitos
instrumentos disponíveis. Sem esquecer, ainda, os arquivos de todos os
ministérios, repartições e empresas estatais do país. Vai ter muito
colarinho branco na cadeia, pensava eu.
Surpresa!
Em 1º de janeiro de 2003 a inquisição petista deve ter embarcado em
Alcântara rumo a algum asteróide distante. O outrora refinado faro não
capta mau cheiro sequer quando vem da sola do próprio sapato.
Seus
sherloques, seus produtores de dossiês, que antes sabiam de tudo que
acontecia na República, foram acometidos de um alheamento, de um autismo
em que não apenas ninguém está a par do que acontece na sala ao lado,
mas é a própria mão direita a primeira a desconhecer o que a esquerda
faz. Sobre essa duplicidade de conduta nada se fala, nada se escreve.
Quando
não há explicação moralmente aceitável é preferível deixar o dito pelo
não dito. E Lula maneja com perfeição a prolongada retórica do silêncio
25 de fevereiro de 2014
Percival Puggina BLOG Lorotas políticas e verdades efêmeras
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