quarta-feira, 23 de abril de 2014
Depois de aparelhar o IPEA e censurar o IBGE, o governo Dilma
incentiva técnicos a estudarem fórmulas mágicas, entre as quais tirar os
alimentos do cálculo do índice inflacionário. É maquiagem pesada para
esconder o botox econômico. Na Argentina, a inflação real é de 30%,
enquanto a oficial é dada como 10% ao ano.
Preocupados com o impacto da alta
dos alimentos na inflação, alguns técnicos do governo começaram a defender nos
bastidores mudanças polêmicas na formulação da política econômica. Diante dos
frequentes choques nos preços de produtos in natura por causa de problemas
climáticos, eles acreditam que esses itens deveriam simplesmente ser retirados
do cálculo do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
A ideia não é
novidade e tem a simpatia da equipe econômica, pois tornaria o indicador mais
realista. No entanto, todos os técnicos ouvidos pelo GLOBO são unânimes em
afirmar que isso teria que ser feito com cuidado e num momento de inflação
baixa, para que o governo não seja acusado de mais uma maquiagem.
Economistas do mercado financeiro
estimaram na terça-feira, pela primeira vez, que a inflação vai estourar o teto
da meta do governo em 2014. Analistas ouvidos pela pesquisa Focus, do Banco
Central, pioraram suas estimativas e esperam agora que a inflação oficial
medida pelo IPCA encerre o ano em 6,51% — ante uma projeção de 6,47% na semana
passada. Esta foi a sétima alta consecutiva na previsão para a inflação.
O argumento dos defensores da
mudança na formulação da política econômica é que as altas de alimentos, como o
tomate e o chuchu, por exemplo, não deveriam influenciar o IPCA total, uma vez
que não são produtos insubstituíveis. Os consumidores costumam deixar de
comprá-los quando os preços sobem demais em função do clima. Eles afirmam que
inflação teria de ser medida por itens que não podem ser trocados por outros,
como combustíveis ou alimentação fora de casa.
— Nos Estados Unidos, por
exemplo, não há alimentos no índice oficial de inflação por uma questão
simples: se você vai ao mercado e vê o tomate caro, você pode substituir por
outra coisa. A gente faz isso com morango. Ninguém come morango o tempo inteiro
— argumentou um técnico do governo. — Essa é uma discussão
interessante e oportuna. Será que o IPCA é o melhor índice para o Brasil guiar
a política monetária? — questionou outra fonte da área econômica.
A inflação acumulada em 12 meses
até março está em 6,15%, muito próxima do teto da meta de 6,5% fixada pelo
governo para o ano. Grande parte dessa alta é resultado do aumento dos preços
de alimentos. Só o preço do tomate já subiu 31,72% em 2014. A batata inglesa
teve alta de 17,27% no mesmo período.
Os economistas do mercado
financeiro afirmam que qualquer alteração no índice seria vista com muita
desconfiança. Segundo o ex-diretor do Banco Central Alexandre Schwartsman, não
há nada de honesto no argumento que os alimentos que contaminaram o IPCA e
provocaram a persistência da inflação que, por sua vez, acomodou-se perto do
teto da meta. — (A ideia) tem um alto nível de
cretinice. Acho surpreendente que as pessoas voltem a debater isso neste
momento, porque parece que elas não prestam atenção nos números — disse.
Schwartsman se referia aos dados
do núcleo da inflação, ou seja, o número que despreza a alta dos alimentos e
das tarifas de serviços públicos. Nos últimos 12 meses, esse núcleo está ainda
maior que o IPCA geral: 7,36%. Ou seja, a culpa não está apenas nos alimentos.
A inflação sofre também com outros fatores, como altas nos serviços.
— Seria trocar seis por meia
dúzia e ainda na hora errada. O único resultado seria mais um arranhão na
credibilidade do país. Se olharmos os dados do passado, a inflação brasileira
não tem um histórico de pressão por alimentos — disse o ex-secretário do
Tesouro Nacional Carlos Kawall, economista-chefe do Banco Safra.
Para 2014, o governo espera que
os alimentos deem uma trégua à inflação nos próximos meses. Em apresentação
feita ao ministro da Fazenda, Guido Mantega, o secretário de Política
Econômica, Márcio Holland, informou que o IPCA deve subir menos a partir de
agora, por causa da entrada da safra no mercado.
A meta do governo para o IPCA é
de 4,5% ao ano, com margem de tolerância de dois pontos percentuais. Se não
atingir a meta, o BC precisará explicar, oficialmente, por que não conseguiu,
além de informar as providências que serão tomadas. Para 2015, a estimativa de
inflação no Boletim Focus foi mantida em 6% ao ano. O grupo de economistas que
mais acertam as projeções já havia projetado uma inflação acima do teto da meta
para este ano. A mediana das projeções do chamado “top 5” chegou a 6,57% há
cerca de um mês e, agora, está em 6,59%.
O economista da LCA Consultores
César Esperandio, destacou que o resultado recente do IPCA-15, a prévia da
inflação, ficou abaixo do esperado — com percentual de 6,19% em 12 meses — o
que contribuiria para uma redução na estimativa dos analistas. No entanto,
observou, os reajustes recentes das tarifas de energia elétrica pressionaram as
projeções. Na semana passada, a AES Sul Distribuidora Gaúcha de Energia S/A,
por exemplo, foi autorizada a reajustar em 28,86% a tarifa de consumidores
residenciais.
Alessandra Ribeiro, da Tendências
Consultoria, ressaltou que, embora o IPCA-15 tenha vindo abaixo do esperado
pelo mercado, ele trouxe expectativa de reajuste elevado da alimentação no
domicílio. — Com isso, nós elevamos nossa
expectativa de inflação para abril de 0,70% para 0,77%. Nossa projeção para o
ano, de 6,3%, passa a ter viés de alta — afirmou Alessandra. (O Globo)
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