Nunca
antes, desde a posse da presidente Dilma Rousseff, o seu patrono Luiz
Inácio Lula da Silva assumiu publicamente, em alto e bom som, a tutela
sobre a apadrinhada como na sua entrevista de anteontem a nove
blogueiros selecionados por sua lealdade, para ter de antemão a garantia
de não ser surpreendido por perguntas incômodas, muito menos ter
contestadas as suas respostas. Essa encenação em que uns se limitam a
levantar a bola para que o outro, livre de marcação, arremate e comemore
foi a forma que Lula escolheu para sair da muda e informar o País do
seguinte:
Se pudesse, registraria em cartório a sua condição de
não candidato ao Planalto este ano, e os jornalistas de sua confiança
deveriam "contribuir para acabar com essa boataria toda"; o governo tem
que "ir para cima" e o PT tem que reagir "com unhas e dentes" à
tentativa da oposição de fazer a CPI da Petrobrás, e se o partido assim
tivesse procedido em relação à CPI dos Correios, em 2005, "possivelmente
a história teria sido outra" (ou seja, o mensalão acabaria abafado); a
economia está aquém do que ele e a presidente gostariam, mas não tanto
como faz crer "a massa feroz de informação deformada", e de todo modo
Dilma precisa explicar na campanha eleitoral o que fará para melhorar a
situação a partir de 2015.
Desde sexta-feira, quando se
encontraram em São Paulo, a criatura sabia que o criador iria ele
próprio "para cima" do desencanto e do pessimismo que não cessam de
ensombrear o governo. O que ele ouve em seu confessionário no bairro
paulistano do Ipiranga, onde funciona o instituto que leva o seu nome,
confere com a sua proverbial intuição para convencê-lo de que o
descrédito de confiança das elites políticas, a começar dos
companheiros, e das lideranças empresariais nas aptidões da presidente
chegou a um nível alarmante. Se o poder fosse uma conta bancária, ela
estaria afundada no cheque especial, beirando a inadimplência.
Isso,
há de raciocinar Lula, ainda não prenuncia o desmanche do projeto da
reeleição, mas deixa antever acidentes de percurso capazes de ameaçar a
travessia com o imponderável. O mais desalentador terá sido descobrir, a
cada conselho dado, mas não atendido, que a pupila ou apenas finge
concordar com ele, por se achar em posse de atributos suficientes para
exercer o mando como lhe pareça melhor, ou por não conseguir segui-los,
porque, em poucas palavras, não é do ramo. Seja como for, Lula deve ter
sido particularmente enfático ao lhe ordenar que proclamasse estar
disposta a investir com unhas e dentes contra a CPI da Petrobrás - o que
ela fez na segunda-feira ao avisar que não recuará um milímetro da
"disputa política" com a oposição.
Decerto Lula também lhe terá
dito que pretendia vir a público para defender o governo. Não se sabe se
acrescentou algo como "ainda que fosse necessário cobrar da governante
promessas de dias melhores para a economia". Seria uma contraofensiva ao
seu estilo, a que não poderiam faltar as habituais caneladas na
imprensa. "Temos que retomar com muita força essa questão da regulação
dos meios de comunicação do País", aos quais acusa de tratar Dilma com
"falta de respeito e de compromisso com a verdade". (Isso não o impediu
de propor a Dilma "uma política agressiva de comunicação".) A sucessora
não só enfiou a obsessão de Lula no fundo da gaveta, como disse logo
depois da posse que "devemos preferir o som das vozes críticas da
imprensa livre ao silêncio das ditaduras".
Se tiver apenas metade
da inteligência de que há de se achar dotada, Dilma deve ter passado
pelo desconforto de atinar com o que Lula efetivamente pretendia ao
chamar os holofotes para si - mostrar a tutti quanti que resolveu
exercer, agora à plenitude, a função de fiador da presidente. Ou seja,
ele não precisa "voltar" para acalmar a legião de queixosos da conduta
da afilhada. E ele estará por perto até o fim de seu mandato para
prevenir ou, em último caso, remediar, a tempo e a hora, derrapadas da
mandatária. Por sinal, como quem não quer nada, mas querendo, Lula disse
aos seus blogueiros que tem recebido mais políticos, ativistas e
empresários do que no seu tempo de presidente.
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