Com o desastre
econômico do primeiro trimestre, uma expansão miserável de 0,2%
combinada com inflação alta e enorme rombo comercial, a
presidente-gerente Dilma Rousseff completou três anos e três meses de
fracasso econômico registrado oficialmente. O fracasso continua, como
confirmam vários indicadores parciais, e continuará nos próximos meses,
porque a indústria permanece emperrada e o ambiente econômico é de baixa
produtividade.
Mas o ministro da Fazenda, Guido Mantega, parece
desconhecer a história dos últimos três anos e um quarto. Em criativa
entrevista, ele atribuiu o baixo crescimento brasileiro no primeiro
trimestre a fatores externos e a problemas ocasionais.
A lista inclui a
instabilidade cambial, a recuperação ainda lenta das economias do mundo
rico e a inflação elevada principalmente por causa dos alimentos. Culpa
dos gringos, portanto, e isso vale igualmente para o judeu Simão, também
conhecido como São Pedro, supervisor e distribuidor das chuvas e
trovoadas. No triste cenário das contas nacionais divulgadas nesta
sexta-feira, só se salva a produção agropecuária, com crescimento de
3,6% no trimestre e de 4,8% no acumulado de um ano.
Os detalhes mais
feios são o investimento em queda e o péssimo desempenho da indústria.
Em sua pitoresca entrevista, o ministro da Fazenda atribuiu o baixo
investimento à situação dos estoques e ao leve recuo - queda de 0,1% -
do consumo das famílias, causado em grande parte pela alta do custo da
alimentação.
A explicação pode ser instigante, mas deixa em total
escuridão o fiasco econômico dos últimos anos, quando o consumo, tanto
das famílias quanto do governo, cresceu rapidamente. O investimento em
máquinas, equipamentos, construções civis e obras públicas - a chamada
formação bruta de capital fixo - caiu, como proporção do produto interno
bruto (PIB), durante toda a gestão da presidente Dilma Rousseff.
No
primeiro trimestre de 2011, quando o governo estava recém-instalado,
essa proporção chegou a 19,5%. Caiu seguidamente a partir daí, até 17,7%
nos primeiros três meses de 2014. Durante esse período o consumo das
famílias aumentou velozmente, sustentado pela expansão da renda e do
crédito, mas nem por isso os empresários investiram muito mais. Além
disso, o governo foi incapaz de ir muito além da retórica e das bravatas
quando se tratou de executar as obras do Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC). Nem as obras da Copa avançaram no ritmo necessário,
apesar do risco de um papelão internacional.
A estagnação da indústria
reflete o baixo nível de investimentos, tanto privados quanto públicos, e
a consequente perda de poder de competição. Por três trimestres
consecutivos a produção industrial tem sido menor que nos três meses
anteriores. Encolheu 0,1% no período julho-setembro, diminuiu 0,2% no
trimestre final de 2013 e 0,8% no primeiro deste ano.
Não há como culpar
as potências estrangeiras ou celestiais por esse desempenho. O
conjunto da economia brasileira é cada vez menos produtivo, embora
alguns segmentos, como o agronegócio, e algumas empresas importantes,
como a Embraer, continuem sendo exemplos internacionais de
competitividade.
O baixo crescimento do PIB, apenas 0,2% no trimestre e
2,5% em 12 meses, reflete essa perda de vigor, associada tanto à
insuficiência do investimento em capital fixo quanto à escassez
crescente de pessoal qualificado. Não por acaso, o País apareceu em 54.º
lugar, numa lista de 60 países, na última classificação de
competitividade elaborada pelo International Institute for Management
Development (IMD), da Suíça.
O baixo desempenho da economia,
especialmente da indústria, tem tudo a ver com a piora das contas
externas. O efeito mais evidente é a erosão do saldo comercial. No
primeiro trimestre, período de referência das contas nacionais
atualizadas, o País acumulou um déficit de US$ 6,1 bilhões no comércio
de mercadorias.
O resultado melhorou um pouco desde abril, mas na
penúltima semana de maio o buraco ainda era de US$ 5,9 bilhões. O Banco
Central (BC) continua projetando um saldo de US$ 8 bilhões para o ano,
muito pequeno para as necessidades brasileiras. No mercado, a mediana
das projeções coletadas em 23 de maio na pesquisa semanal do BC indicava
um superávit de apenas US$ 3 bilhões.
Estranhamente, os deuses parecem
ter poupado outros países dos males atribuídos pelo ministro da Fazenda
ao quadro externo. Outras economias continuaram crescendo mais que a
brasileira e com inflação menor, apesar de sujeitas à instabilidade dos
mercados financeiros e a outros problemas internacionais. A inflação no
Brasil tem permanecido muito acima da meta oficial, 4,5%, e a maior
parte das projeções ainda aponta um resultado final em torno de 6% para
2o14.
Até agora, o recuo de alguns preços no atacado pouco afetou o
varejo e os consumidores continuam sujeitos a taxas mensais de inflação
superiores a 0,5%. O ritmo poderá diminuir nos próximos meses, mas, por
enquanto, as estimativas indicam um repique nos quatro ou cinco meses
finais de 2014.
O aperto monetário, interrompido pelo BC na
quarta-feira, pode ter produzido algum efeito, mas o desajuste das
contas do governo ainda alimenta um excesso de demanda. Na quinta-feira o
Tesouro anunciou um superávit primário de R$ 26,7 bilhões nos primeiros
quatro meses. Quase um terço desse total, R$ 9,2 bilhões, ou 31%,
correspondeu a receita de concessões e dividendos.
As concessões
renderam 207,4% mais que no período de janeiro a abril do ano passado.
Os dividendos foram 716,4% maiores que os do primeiro quadrimestre de
2013. Chamar isso de arrecadação normal e recorrente sem ficar corado
vale pelo menos um Oscar de ator coadjuvante. A economia vai mal, mas a
arte cênica brasileira ainda será reconhecida. Há mais valores entre o
céu e a terra do sonham os críticos da política econômica.
Postado por
MURILO às 10:03
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