Rodrigo Rangel, Veja
Na semana passada, VEJA revelou que sete deputados federais foram flagrados pelas câmeras de segurança do prédio onde funcionava o escritório do doleiro Alberto Youssef – preso há dois meses por operar um gigantesco esquema de corrupção e lavagem de dinheiro envolvendo empresas estatais e funcionários públicos de alto escalão. O que uma parte da nobreza do Parlamento fazia num lugar conhecido como centro de captação e distribuição de propina? É fácil deduzir. O problema é que ninguém parece querer saber ao certo.
Os parlamentares fotografados permaneceram em um conveniente silêncio. Seus colegas, inclusive os mais aguerridos, também ficaram à espreita. Não houve uma única manifestação de inconformismo, protesto ou um pedido de investigação. Afinal, nada aparentemente mais natural que deputados visitando em São Paulo o escritório de um conhecido criminoso, em horário de expediente, quando deveriam estar trabalhando em Brasília. A tolerância com malfeitos beira a indiferença e não se limita ao Congresso Nacional.
Na terça-feira, a deputada Aline Corrêa, uma das mais assíduas visitantes de Youssef, participou tranquilamente de um almoço com a presidente Dilma Rousseff, organizado para oficializar o apoio do PP à reeleição da petista.
Dos seis parlamentares flagrados pelas câmeras, cinco são do PP. Sobre as visitas frequentes ao doleiro, Aline Corrêa tinha a resposta na ponta da língua caso algum curioso perguntasse. “Eu conheço o Youssef há tempos. Para mim, ele era só um empresário”, dizia a deputada, filha do mensaleiro Pedro Corrêa, outro que costumava frequentar o bunker até ser recolhido à prisão por ordem do Supremo Tribunal Federal.
Há exemplos de descaso ético ainda piores. Na quarta-feira, o ex-ministro Mário Negromonte (PP), outro freguês do doleiro, foi escolhido como conselheiro do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) da Bahia. Por indicação do governador Jaques Wagner, do PT, Negromonte, acredite, será a partir de agora fiscal da boa aplicação do dinheiro público nas cidades baianas. Nada mais apropriado para um político enredado no maior caso de corrupção do momento.
Outros deputados que mantinham laços com o doleiro – como os paranaenses André Vargas (ex-PT, hoje sem partido) e Nelson Meurer (PP), o baiano Luiz Argôlo (ex-PP, hoje no Solidariedade), o alagoano Arthur Lira (PP) e o catarinense João Pizzolatti (PP) – simplesmente se fingiram de mortos.
A estratégia deles é ficar em silêncio e não chamar atenção até que algum escândalo novo apareça – tática diferente da adotada pelo senador e ex-presidente Fernando Collor (PTB-AL), destinatário de depósitos bancários de 50 000 reais cujos comprovantes foram encontrados pela polícia sobre a mesa de Youssef. Em discurso na tribuna do Senado, Collor chegou a ponto de se apresentar como uma vítima. A lista de partidos na rede de Youssef tem mais um representante famoso. Assessor especial do Ministério do Trabalho, o advogado João Graça era outra presença constante no escritório do doleiro, de acordo com os registros da portaria.
Homem de confiança do ministro Manoel Dias e do presidente do partido, o notório Carlos Lupi, João Graça já teve o nome envolvido em outras histórias desabonadoras. Numa delas, foi acusado de intermediar um pagamento de propina feito dentro do Ministério do Trabalho, nas mãos do PDT desde o governo Lula. A exemplo dos deputados, Graça se absteve de dar explicações sobre sua relação com Youssef.
Procurado, o ministério limitou-se a informar que ele estava de férias e se eximiu de providências adicionais. Na sexta-feira, porém, depois de instado pela reportagem de VEJA a se manifestar, o assessor pediu demissão, mas sem explicar os motivos. A lista de visitantes de Youssef inclui ainda dois denunciados no processo do mensalão: o ex-deputado José Borba e João Cláudio Genu, ex-assessor do PP.
A movimentação no escritório de Youssef era intensa. Pela mesma porta por onde passavam as autoridades de Brasília transitavam outros investigados da Operação Lava-Jato, da Polícia Federal. Compareciam de entregadores de dinheiro que serviam ao doleiro a representantes de empresas que aparecem abastecendo o caixa do esquema operado por ele, sustentado por negócios em diferentes áreas do governo – do Ministério da Saúde a estatais como a Petrobras.
O bunker era o lugar onde se encontravam os diferentes interesses envolvidos: o das empresas que desejavam contratos e o dos políticos que viabilizavam esses contratos. Ao doleiro cabia a tarefa de equilibrar essa equação.
Com reportagem de Adriano Ceolin
INDIFERENÇA – João Graça, do Ministério do
Trabalho, pediu demissão após a descoberta de que ele visitava o
doleiro. Outros envolvidos, nada. Um deles, o deputado Mário Negromonte,
foi até promovido para o TCM da Bahia Sindicato do crime
Na semana passada, VEJA revelou que sete deputados federais foram flagrados pelas câmeras de segurança do prédio onde funcionava o escritório do doleiro Alberto Youssef – preso há dois meses por operar um gigantesco esquema de corrupção e lavagem de dinheiro envolvendo empresas estatais e funcionários públicos de alto escalão. O que uma parte da nobreza do Parlamento fazia num lugar conhecido como centro de captação e distribuição de propina? É fácil deduzir. O problema é que ninguém parece querer saber ao certo.
Os parlamentares fotografados permaneceram em um conveniente silêncio. Seus colegas, inclusive os mais aguerridos, também ficaram à espreita. Não houve uma única manifestação de inconformismo, protesto ou um pedido de investigação. Afinal, nada aparentemente mais natural que deputados visitando em São Paulo o escritório de um conhecido criminoso, em horário de expediente, quando deveriam estar trabalhando em Brasília. A tolerância com malfeitos beira a indiferença e não se limita ao Congresso Nacional.
Na terça-feira, a deputada Aline Corrêa, uma das mais assíduas visitantes de Youssef, participou tranquilamente de um almoço com a presidente Dilma Rousseff, organizado para oficializar o apoio do PP à reeleição da petista.
Dos seis parlamentares flagrados pelas câmeras, cinco são do PP. Sobre as visitas frequentes ao doleiro, Aline Corrêa tinha a resposta na ponta da língua caso algum curioso perguntasse. “Eu conheço o Youssef há tempos. Para mim, ele era só um empresário”, dizia a deputada, filha do mensaleiro Pedro Corrêa, outro que costumava frequentar o bunker até ser recolhido à prisão por ordem do Supremo Tribunal Federal.
Há exemplos de descaso ético ainda piores. Na quarta-feira, o ex-ministro Mário Negromonte (PP), outro freguês do doleiro, foi escolhido como conselheiro do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) da Bahia. Por indicação do governador Jaques Wagner, do PT, Negromonte, acredite, será a partir de agora fiscal da boa aplicação do dinheiro público nas cidades baianas. Nada mais apropriado para um político enredado no maior caso de corrupção do momento.
Outros deputados que mantinham laços com o doleiro – como os paranaenses André Vargas (ex-PT, hoje sem partido) e Nelson Meurer (PP), o baiano Luiz Argôlo (ex-PP, hoje no Solidariedade), o alagoano Arthur Lira (PP) e o catarinense João Pizzolatti (PP) – simplesmente se fingiram de mortos.
A estratégia deles é ficar em silêncio e não chamar atenção até que algum escândalo novo apareça – tática diferente da adotada pelo senador e ex-presidente Fernando Collor (PTB-AL), destinatário de depósitos bancários de 50 000 reais cujos comprovantes foram encontrados pela polícia sobre a mesa de Youssef. Em discurso na tribuna do Senado, Collor chegou a ponto de se apresentar como uma vítima. A lista de partidos na rede de Youssef tem mais um representante famoso. Assessor especial do Ministério do Trabalho, o advogado João Graça era outra presença constante no escritório do doleiro, de acordo com os registros da portaria.
Homem de confiança do ministro Manoel Dias e do presidente do partido, o notório Carlos Lupi, João Graça já teve o nome envolvido em outras histórias desabonadoras. Numa delas, foi acusado de intermediar um pagamento de propina feito dentro do Ministério do Trabalho, nas mãos do PDT desde o governo Lula. A exemplo dos deputados, Graça se absteve de dar explicações sobre sua relação com Youssef.
Procurado, o ministério limitou-se a informar que ele estava de férias e se eximiu de providências adicionais. Na sexta-feira, porém, depois de instado pela reportagem de VEJA a se manifestar, o assessor pediu demissão, mas sem explicar os motivos. A lista de visitantes de Youssef inclui ainda dois denunciados no processo do mensalão: o ex-deputado José Borba e João Cláudio Genu, ex-assessor do PP.
A movimentação no escritório de Youssef era intensa. Pela mesma porta por onde passavam as autoridades de Brasília transitavam outros investigados da Operação Lava-Jato, da Polícia Federal. Compareciam de entregadores de dinheiro que serviam ao doleiro a representantes de empresas que aparecem abastecendo o caixa do esquema operado por ele, sustentado por negócios em diferentes áreas do governo – do Ministério da Saúde a estatais como a Petrobras.
O bunker era o lugar onde se encontravam os diferentes interesses envolvidos: o das empresas que desejavam contratos e o dos políticos que viabilizavam esses contratos. Ao doleiro cabia a tarefa de equilibrar essa equação.
Com reportagem de Adriano Ceolin
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