sábado, 21 de junho de 2014

PT quer amordaçar sociedade civil







O assunto ainda é o Decreto 8.243, tamanha a importância que ele tem para nosso futuro – se pretendemos preservar a democracia. 


O PT aproveita o clima da Copa para levar adiante um projeto claramente bolivariano, que pretende controlar por meio do estado e seus braços militantes organizados todo o poder político. Foi o tema da ótima coluna de Demétrio Magnoli na Folha hoje:



O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) converteu-se numa linha de montagem de artefatos ideológicos. Entre tantos países, escolheu a Venezuela chavista como sede de sua única filial no exterior. Num relatório produzido pela filial, lê-se o seguinte: 


“O modelo bolivariano afasta-se, sem dúvidas, da democracia representativa despolitizadora que predomina ainda hoje no mundo. Supera o modelo idealizado pelos pais fundadores da república norte-americana”. As duas frases ajudam a decifrar o sentido do decreto presidencial que instaura a “democracia participativa”.


As palavras cruciais são “democracia representativa despolitizadora”. De fato, o princípio da representação sustenta-se sobre o pressuposto de que os cidadãos têm outros afazeres além da política. 


A maioria esmagadora das pessoas consagra o seu tempo ao trabalho produtivo, aos estudos, ao lazer, aos afetos e aos amores. Os militantes políticos, pelo contrário, dedicam-se essencialmente à carreira política, que enxergam como fonte de poder, prestígio, dinheiro ou (raramente) como ferramenta para a “reforma do mundo”. 


O Decreto 8.243, dos “conselhos participativos”, procura reduzir a abrangência da “democracia representativa despolitizadora”. É um golpe dos militantes políticos contra as pessoas comuns, cuja “participação” perde valor nos centros de decisão de políticas públicas.


O sociólogo, que faz parte da tal “lista negra” de “inimigos da pátria” divulgada pelo vice-presidente do PT em site oficial do partido, afirma que o mais chocante nisso tudo é a “ausência de um grito coletivo de indignação da sociedade civil diante dessa suprema arrogância estatal”.


Como sabemos, o estado nasceu antes da nação no Brasil, com a vinda da família real em 1808. Estamos acostumados a delegar ao estado poder demasiado, e desacreditamos no papel da sociedade civil como tal.


Tocqueville chamou atenção em seu clássico sobre a democracia na América para as associações voluntárias, que agiam de forma descentralizada e local nos Estados Unidos. Não temos isso por aqui. No Brasil, subvertemos até mesmo a lógica das ONGs, ignorando a letra N na sigla e mantendo a maioria delas ligada de forma umbilical ao próprio estado.


Os intelectuais que ganham a vida falando sobre a “sociedade civil” receberam calorosamente o Decreto 8.243, como afirma Demétrio. A simbiose é antiga: intelectuais defendem o aumento do papel estatal em nossas vidas, e os governantes financiam esses intelectuais, além de lhes garantir poder e prestígio.


Demétrio vai direto ao ponto: “A finalidade do Decreto 8.243 é moldar uma ‘sociedade civil’ adaptada às estratégias de poder do governo: o ‘povo organizado’, no dialeto dos militantes”. É verdade que nosso Congresso goza de pouco respeito, e é isso que torna o terreno fértil para projetos autoritários como este. O perigo é grande.


Segundo declarações do alto escalão do governo, incluindo o ministro Gilberto Carvalho, o maior interessado no projeto, pois é justamente ele quem controla os tais “movimentos sociais”, a presidente Dilma não vai recuar. Será, nesse caso, uma declaração de guerra à democracia representativa.


Espero que nossas instituições republicanas se mostrem sólidas o suficiente para resistir. É seu maior teste desde que o PT chegou ao poder, com sua mentalidade bolivariana. Se por acaso o PT tiver êxito, então a Venezuela estará logo ali, a poucos passos do nosso destino.

Rodrigo Constantino

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