O
Tribunal de Contas da União determinou a suspensão do negócio que
resultou na compra de um terreno no Setor de Autarquias Norte por R$ 51
milhões. A área do BNDES, no entanto, é avaliada em pelo menos R$ 285
milhões por estar localizada no Plano Piloto.
O BNDES, dono do terreno de 9 mil metros quadrados na área central de
Brasília, informou que suspenderá o negócio até que todos os detalhes da
transação sejam esclarecidos. ...
O Setor de Autarquias Norte é um dos últimos rincões de crescimento
para construções institucionais e empresariais na valorizada região
central de Brasília. Ainda assim, um cobiçado terreno de 9 mil metros
quadrados do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
(BNDES) foi arrematado por R$ 51,5 milhões por uma empresa privada,
preço cinco vezes menor do que o valor de mercado. A licitação,
realizada em abril, é questionada pelo Tribunal de Contas da União
(TCU), que determinou a suspensão da transação até o julgamento do
mérito.
A denúncia chegou à Corte por meio de uma representação do escritório
Jacoby Fernandes & Reolon Advogados Associados. Os advogados
listaram vários indícios de irregularidades na transação. A principal
delas seria a subvalorização do imóvel. A consultoria S4A, contratada
pelo banco, avaliou o imóvel em R$ 45,9 milhões, e a AJS Empreendimentos
e Participações deu lance de R$ 51,5 milhões, superior aos das outras
duas concorrentes no certame.
Mas as aferições anexadas ao processo do TCU estimam que a área,
localizada na Quadra 4, vale entre R$ 285 milhões e R$ 291 milhões. Se
confirmadas as cifras, o prejuízo aos cofres públicos com a finalização
da venda poderia variar entre R$ 234 milhões e R$ 240 milhões, dinheiro
suficiente para construir 23 Unidades de Pronto Atendimentos (UPAs) como
a instalada em Ceilândia, considerada a maior do país.
No despacho que determinou a suspensão da transação, o ministro Augusto
Sherman reproduz diversos detalhamentos técnicos presentes na
representação, que levam a crer que o método e as referências levadas em
conta para determinar o preço do imóvel são inconsistentes e
irregulares, desvalorizando o terreno. “Há indícios de que o laudo de
avaliação elaborado pela empresa S4A Avaliações Patrimoniais foi
elaborado contendo inconsistências que permitiram a subavaliação do
imóvel”, cita o despacho.
Suspeita
O integrante do Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci-DF),
José Geraldo da Silva, explica que, por não existirem imóveis
semelhantes ao terreno do BNDES, a avaliação pode ser um pouco mais
complicada. Ele ressalta que, por se tratar da área central da cidade,
requer muito cuidado. “Há fatores importantes que devemos considerar
nesta avaliação, pois trata-se de área central, das últimas de Brasília,
uma cidade atípica. Avaliar um bem desse porte não é simplesmente dar
uma opinião e pronto, trata-se de um trabalho técnico, exige
conhecimento e, principalmente, imparcialidade”, alerta.
A segunda suspeita diz respeito ao valor pago à consultoria S4A para
aferir o valor do imóvel. De acordo com o TCU, o BNDES contratou o
serviço por R$ 2.420. Mas a tabela definida pelo Conselho Regional de
Corretores de Imóveis da 8ª Região estabelece que o custo dos pareceres
emitidos para comercializar imóveis corresponde a 1% do valor total da
avaliação. Ou seja, nesse caso, a S4A deveria receber R$ 459 mil, uma
vez que orçou o terreno em R$ 45,9 milhões.
Defesa
Por meio de nota, o BNDES informou que “mesmo convicto da lisura do
processo, suspenderá a transação até que todos os pontos sejam
esclarecidos e não pairem dúvida em relação à venda do lote”. A
instituição acrescentou que buscará outras avaliações independentes do
terreno. Quanto às suspeitas relacionadas à S4A, justificou que seguiu a
legislação sobre licitações e que essa empresa foi escolhida por
apresentar o menor preço para a realização do serviço.
Por meio da assessoria de Comunicação, a Jacoby Fernandes & Reolon
Advogados Associados informou que o escritório não representa nenhum
interessado no imóvel e agiu motivado por “informação sobre ato
possivelmente em desconformidade com o direito”, reiterando que “não tem
interesse jurídico ou econômico no caso”.
Por fim, o tribunal terá de apurar informações duvidosas sobre a AJS
Empreendimentos. A empresa, relata o despacho, foi fundada em 2013, não
funciona no endereço indicado no cadastro da licitação e declarou ter um
capital social de apenas R$ 1 mil, incompatível para lastrear a
aquisição de um terreno de alto valor como o ofertado pelo BNDES. O
Correio entrou em contato com a S4A, mas, até o fechamento desta edição,
não havia recebido resposta. Nenhum representante da AJS
Empreendimentos foi localizado para comentar o processo.
Entenda os questionamentos
» O terreno de 9 mil metros quadrados foi avaliado pela S4A em R$ 45,9
milhões e arrematado pela AJS Empreendimentos e Participações por R$
51,5 milhões
» Duas avaliações independentes mostram, no entanto, que o valor de
mercado do imóvel no Setor de Autarquias Norte varia entre R$ 285
milhões e R$ 291 milhões
» Com isso, o negócio representaria, no mínimo, um prejuízo de R$ 234 milhões aos cofres públicos
» Haveria indícios de diversas irregularidades na maneira como a S4A avaliou o terreno e suas potencialidades
» O certame foi realizado três dias antes do feriado de Páscoa, em abril, o que comprometeria a ampla competitividade
» Para fazer a aferição de valor, a consultoria cobrou R$ 2.420, quando
o padrão é que se cobre 1% do valor do imóvel. Ou seja, para um terreno
de R$ 45 milhões, a avaliação custaria quase R$ 460 mil
» A AJS declarou um capital social de apenas R$ 1 mil, incompatível com
a capacidade necessária para adquirir o terreno. Além disso, a empresa
não funcionaria no endereço declarado.
Fonte: Por ARIADNE SAKKIS e ADRIANA BERNARDES - 25/07/2014 - - 07:39:55
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