sábado, 7 de junho de 2014

O Golpe da Reeleição---Uma sociedade que ainda tivesse um pouco de brio e vergonha na cara jamais toleraria humilhações como essas.



Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net 
Por Sérgio Alves de Oliveira

Com boa dose de sabedoria, a constituição de 1988  manteve a vedação prevista nas anteriores do  direito à reeleição do Presidente da República,Governadores e Prefeitos.

Mas, em 1997, Governo FHC (1º mandato), começou o festival de “emendas constitucionais”, que hoje tomou contornos incontroláveis. Qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade pretendida pelos que mandam na política,”eles”conseguem praticar simplesmente alterando a constituição ou a lei de modo a poder ser feito aquilo que não podia.

Esse ardiloso expediente pode ser chamado de GOLPE LEGAL. É muito mais eficiente, inteligente e rápido do que um GOLPE ou CONTRAGOLPE MILITAR, como aquele de 64. É, por assim dizer, a sofisticação do golpe. É o golpe do “canetaço”. Causa muitos estragos na sociedade, mas não derrama uma só gota de sangue (pelo menos aparentemente).

Apesar de paradoxal, o responsável maior pelos 12 (ou possíveis 16) anos do PT no poder é o seu mais forte opositor,o PSDB. Como assim?
O “trator”que também existia no Governo de Fernando Henrique Cardoso,onde foi feito tudo que eles queriam (privatizações quase-doações, com gorjetas para todos os lados, reeleição,etc), chegou à conclusão que o período do mandato de 4 anos seria muito curto para ultimar tudo o que queriam. Haveria que ser, no mínimo, dobrado esse período.

Recorreram, então, a uma “emenda constitucional” permitindo a reeleição para os chefes de poder executivo, inclusive na presidência da república. Assim, a Emenda Constitucional nº 16, de 1997, deu nova redação ao parágrafo 5º do art.14 da Constituição de 1988. FHC foi reeleito para mais um período de quatro anos.

Certamente esse “pessoal”não olhou para o futuro. Esse dispositivo que eles “inventaram” poderia também legitimar por muito tempo o “inimigo” no poder, posteriormente. Foi o que aconteceu. O tiro saiu pela culatra, pouco tempo depois. Como algo “indigesto”, eles estão assistindo 12 anos de PT, e talvez mais 4, no mínimo.

Ocorre que o princípio do direito à reeleição foi consagrado como um DIREITO SUBJETIVO do titular do mandato, só dependendo da sua vontade,em querer,ou não querer. Por conseguinte ele é um “candidato nato”, acima do próprio partido e de qualquer outro poder. Mas considerando as muitas facilidades que o uso (e abuso) da máquina administrativa oferece para uma reeleição,é quase certa que ela ocorrerá.

O “cara” tem que ser muito ruim de voto mesmo para não conseguir se reeleger. Essa “agressão” à democracia ocorre não só em relação ao candidato à reeleição, mas também,apesar de em menor escala,de um outro candidato do mesmo partido. Portanto, o direito a “reeleição”de um partido é por tempo indeterminado. Sendo indeterminado, deixa de ser REPUBLICANO, é óbvio, porquanto a república, por definição, consiste na renovação periódica do poder.

Mas essa “novidade” que criaram em 1997, a reeleição, tem que ser costurada com a organização dos Três Poderes. Aí se aplica, com todas as letras,o brocardo que “o diabo está nos detalhes”.                                                                                                                                   
  

Nessas circunstâncias, o direito à reeleição, tanto do titular do mandato executivo, quanto do seu partido, e na medida da repetição, possibilitará que os Três Poderem se concentrem num só: no poder executivo. Na visão que teve Aristóteles, seria, então, o regime da TIRANIA, forma corrompida, impura, da MONARQUIA, ambos, “governo de um só”.

Explicando: como o poder executivo guarda a chave do cofre público,com facilidade ele compra com favores os parlamentares do legislativo. Com o judiciário a forma de domínio é diferente. Os membros do Supremo Tribunal Federal, instância maior do Judiciário, são nomeados pelo presidente da república, da mesma forma com que o são os titulares dos ministérios do governo. Todos são gente da sua extrema confiança.

Ora, como os ministros do STF são obrigados à aposentadoria quando completam 70 anos,e geralmente não entram no Supremo quando ainda jovens,é claro que ali ficam pouco tempo. Em poucos anos, portanto, TODOS (ou quase) se aposentarão e outros tantos serão nomeados e da confiança do presidente da república ou seu partido. Completa-se, assim, o poder único do Executivo, instalando-se a tirania, com o reforço de uma parcial democracia deturpada, chamada por Políbio de OCLOCRACIA. 

Chegando a esse ponto, como parece que agora já chegou, o governo não precisa mais respeitar a constituição, nem as leis. Os outros Dois Poderes (Legislativo e Judiciário), que deveriam intervir no sistema de freios e contrapesos do poder do Estado, estão inteiramente submissos, pelos mecanismos diferentes antes apontados.

Uma sociedade que ainda tivesse um pouco de brio e vergonha na cara jamais toleraria humilhações como essas.


Sérgio Alves de Oliveira é Sociólogo e Advogado (RS).

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