Por que, afinal, o Partido dos Trabalhadores (PT) tem verdadeira obsessão pela regulamentação da mídia? Por várias razões. Duas delas, justiça se faça, atendem a imperativos da modernização e aperfeiçoamento do arcabouço legal que regula os meios de comunicação.
A primeira: o
Capítulo V, artigos 220 a 224, da Constituição de 1988, que trata "Da
comunicação social", permanece até hoje desregulamentado.
A segunda: o
Código Brasileiro de Telecomunicações, de 1962, que normatiza também o
rádio e a televisão, é completamente obsoleto. Quando foi promulgado, há
mais de meio século, nem a internet existia.
Esgotam-se aí as boas intenções do PT.
O
que de fato leva o partido a defender o que eufemisticamente chama de
"democratização da mídia" é a intenção de controlar os meios de
comunicação para viabilizar seu projeto de manutenção no poder a
qualquer custo. E essa é a motivação tanto da minoria "ideológica", que
entende que a sociedade precisa ser tutelada, como da maioria
fisiológica, apegada às benesses do poder.
Quando
políticos reverentes ao totalitarismo cubano e simpatizantes das
aventuras bolivarianas e do fundamentalismo islâmico falam em "controle
social da mídia", só é possível concluir que sejam, também, adeptos da mordaça, do cerceamento da liberdade de expressão e de imprensa.
E
essa suspeita se agrava quando se observa a maneira oblíqua, ardilosa,
como o PT coloca a questão da "democratização" dos meios de comunicação.
Obedecendo à nova estratégia, os porta-vozes petistas da tal
"democratização" passaram a distinguir claramente em suas manifestações a
mídia impressa (jornais e revistas) da eletrônica (rádio e televisão)
com a ressalva de que a primeira não carece de "regulação" como a segunda, que é concessão pública. "Regulação de mídia pode ser feita para rádio e televisão, porque são concessões. Mas não se aplica à imprensa escrita e internet", declarou no último dia 4 o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo.
Faz sentido.
Não
fosse por idiossincrasia pessoal, como notoriamente é o caso de Lula,
os petistas não teriam razões para se incomodar com a "má vontade" dos
jornais e das revistas de maior circulação, a chamada Grande Mídia.
Afinal, o hábito de leitura desses periódicos - acreditam os próprios
petistas - é praticamente limitado à "elite" que o PT encarniçadamente
combate e não impediu que Lula & Cia. vencessem três eleições
presidenciais consecutivas.
Já o rádio e a televisão falam às massas.
São,
portanto, potencialmente perigosos, especialmente nas mãos da
"direita". Mas até mesmo na mídia eletrônica o conteúdo não pode ser
regulado, segundo a Constituição, como admitiu ainda Paulo Bernardo.
De
que maneira, então, neutralizar a "influência negativa" da mídia
eletrônica sobre a opinião pública? O próprio Lula já deu a receita, em
recente entrevista a um semanário:
se
o rádio e a televisão se recusam a mostrar tudo de bom que o governo
faz todos os dias, "vai de rede nacional" sempre que for preciso.
Dinheiro para isso não falta.
A
solução ideal, no entanto, é definir normas, "algumas obrigações", nas
palavras do ex-ministro Franklin Martins, para que "o espectro
eletromagnético" informe a população com "equilíbrio e isenção".
Martins
não deixou claro a quem caberia decidir se uma emissora de rádio ou de
televisão está se comportando com equilíbrio e isenção, mas ele próprio
esteve à frente de uma iniciativa que fornece pistas importantes: a Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), realizada em Brasília ao apagar das luzes do governo Lula.
Na
preparação da Confecom, o governo tomou a precaução de definir
previamente, por meio de portarias do Ministério das Comunicações, as
instâncias que teriam direito à representação na comissão organizadora,
os eixos temáticos a serem discutidos e a sistemática de funcionamento
dos grupos de trabalho.
Tudo muito bem "regulado".
As
conclusões da Confecom revelaram-se, para surpresa de ninguém,
perfeitamente afinadas com o pensamento do então ministro Franklin
Martins. Talvez por isso o documento que as consubstancia permaneça até
hoje na gaveta em que a então recém-empossada presidente Dilma Rousseff o
guardou.
O ESTADO DE S.PAULO
20 de junho de 2014
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