segunda-feira, 14 de abril de 2014

A LEBRE QUE MIA




Dilma Rousseff foi vendida a seu eleitorado como gestora competente. Mas autorizou a Petrobras a pagar mais de um bilhão de dólares por uma lebre que mia.
 
Todo esse imbróglio serve para mostrar o quanto é maléfica a confusão que fazemos no Brasil entre Estado, governo e administração pública, como se fosse tudo a mesma coisa.
 
 
A compra da refinaria de Pasadena pela Petrobras, tanto na transação em si, quanto no que aconteceu após se tornar de conhecimento público, é dos atos mais constrangedores de nossa história administrativa. Nem encomendando se conseguiria produzir semelhante sucessão de ações e reações que primam pela falta de decoro e pela hipocrisia. Atenção, jornalismo nacional! Hora de acordar, rapaziada! O rolo é conhecido desde 2012! É difícil entender as razões pelas quais a pauta dormiu nas gavetas durante todo o ano de 2013.
 
Seja como for, o melhor ficou para o fim. Aconteceu no Congresso Nacional, com a disputa entre governo e oposição sobre a proposta de criar CPI para investigar a operação. Como a medida se revelou inevitável, o PT partiu para o contra-ataque, e quis investigar, também, o metrô de São Paulo e o porto de Suape em Pernambuco. Foi uma antecipada confissão. Foi reconhecimento pelo réu de que comprometedoras digitais estavam na cena do crime. O que espera a sociedade de um partido político que respeite a própria imagem diante de fato com tal magnitude? Que participe das investigações, que controle o trabalho da oposição, que busque a verdade e, naturalmente, que evite maiores explorações políticas dos fatos apurados. Em vez disso, o PT quis tumultuar, embrulhar e inviabilizar a CPI, acrescentando-lhe outros objetivos que, supostamente, poderiam causar dano ao seus principais opositores na corrida presidencial em curso: PSDB e PSB. Tudo num grande esforço para "blindar a Petrobras". A Petrobras? Me poupem.
 
A Constituição Federal não deixa margem para interpretações quando afirma que as CPIs devem tratar "de fato determinado" e não de fatos indeterminados. Se o PT tem conhecimento de determinados fatos a merecer investigação no metrô de São Paulo e no porto de Suape, envolvendo recursos federais, por que não pediu oportunamente as respectivas CPIs? Por que fazê-lo como contraponto à CPI sobre a refinaria de Pasadena? Ao agirem como estão agindo no caso, o PT e seus associados no Congresso Nacional tornam inequívoco perante a opinião pública que, de fato, houve rolo no negócio. Caso contrário, fosse a operação sábia e proba, economicamente interessante, como chegaram a afirmar alguns agentes partidários na frente de batalha das redes sociais, nada melhor do que uma CPI para comprová-lo e retocar a imagem da presidente. Afinal, ela foi vendida a seu eleitorado como gestora competente. Mas autorizou a Petrobras a pagar mais de um bilhão de dólares por uma lebre que mia.
 
Todo esse imbróglio serve para mostrar o quanto é maléfica a confusão que fazemos no Brasil entre Estado, governo e administração pública, como se fosse tudo a mesma coisa. Não contentes, embrulhamos o pacote para presente e entregamos a um partido político. Só pode dar nisso! Que raios tem um partido político a fazer na Petrobras? E não só aí, mas também no Banco do Brasil, no BNDES, em dezenas de estatais e em todo o aparelho administrativo federal, ocupando dezenas de milhares de postos que deveriam ser providos por servidores de carreira com a formação adequada?
 
 
* * *
Com licença, eu acertei

Nos últimos 25 anos, escrevi mais de uma dúzia de artigos combatendo e, em muitos casos, mostrando que o livro "Veias abertas na América Latina", do escritor uruguaio Eduardo Galeano, é um amontoado de tolices estruturadas sobre raciocínios errados, prosa infantil, repleta de baboseiras. No entanto, desde sua primeira edição, em 1971, foi tomada como bíblia pela esquerda continental e catapultou o autor para os pontos mais nobres dos seus altares e reverências. Quantos professores de história, mestres de araque, envenenaram as mentes de seus alunos com base nesse livro!
 

Pois eis que agora é o próprio Galeano que me dá razão. Homenageado em Brasília pela 2ª Bienal do Livro (e a homenagem, certamente, tem muito a ver com esse mesmo livro), o escritor declarou que "a obra foi o resultado da tentativa de um jovem de 18 anos de escrever sobre economia política sem conhecer devidamente o tema. Eu não tinha a formação necessária. Não estou arrependido de tê-lo escrito, mas foi uma etapa que, para mim, está superada".

A matéria jornalística sobre essa declaração de Galeano está publicada na edição do dia 11 de abril do jornal Correio do Povo.
 
14 de abril de 2014
Percival Puggina

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